segunda-feira, 6 de janeiro de 2020

Com surpresas (algumas anticlimáticas) Globo de Ouro 2020 consagra Era Uma Vez em Hollywood e 1917


Seguindo a sua cartilha, o Globo de Ouro 2020 fugiu mais uma vez do lugar comum. Se por um lado Era Uma Vez em Hollywood fez jus ao (merecido) favoritismo ao fechar a noite com três estatuetas, entre elas as de Melhor Filme Comédia ou Musical e Melhor Roteiro, o drama de guerra 1917 surpreendeu a todos ao levar o prêmio de Melhor Filme Dramático e Melhor Diretor. Uma decisão no mínimo anticlimática. Além de não ter sido lançado comercialmente em parte do mundo, o ambicioso longa comandado por Sam Mendes triunfou numa disputa que parecia polarizada entre os comentados Coringa e O Irlandês. A imponente produção original Netflix, aliás, deixou o Globo de Ouro de mãos abanando, algo até então impensável num filme comandado por Martin Scorsese e estrelado por legendas como Robert De Niro, Al Pacino e Joe Pesci. Após as pesadas críticas envolvendo as escolhas da última edição do evento, a impressão que ficou é que a Associação de Correspondentes Estrangeiros de Hollywood se viu obrigada a arriscar, mas acabou ousando onde não precisava e sendo previsível onde havia brechas para romper com as suas tradicionais predileções. Pior para a Netflix que, nas categorias relacionadas ao cinema, viu O Irlandês, Histórias de Um Casamento, Dois Papas e Meu Nome é Dolemite fecharem a noite com apenas uma conquista.



Como de costume nos últimos anos, o Globo de Ouro 2020 começou com o humor ferino do apresentador Ricky Gervais. Em poucos minutos ele chamou o Joe Pesci de Baby Yoda, falou que a atriz Felicty Huffman, condenada por fraude, fez a placa da limousine que o trouxe, brincou com o fato de as namoradas de Leonardo DiCaprio serem jovens, disse que iria cortar o ‘In Memorian’ por falta de diversidade e encerrou atacando companhias como a Amazon, a Apple e a Disney. Nada mal. O primeiro grande prêmio da noite nas categorias relacionadas ao cinema, como esperado, foi para o sul-coreano Parasita. Vencedor do Globo de Ouro de Melhor Filme Estrangeiro, o diretor Boon Joon-Ho (foto acima) subiu ao palco e, discursando em coreano, arrancou calorosos aplausos ao defender que os americanos precisam descobrir o cinema estrangeiro. “Quando você superar a barreira de centímetros das legendas, você será apresentado a tantos outros filmes incríveis!", defendeu o cineasta. Uma manifestação ainda hoje urgente nos EUA. 


A primeira grande surpresa da noite aconteceu na categoria Melhor Animação. Num ano bem irregular para o segmento, o ‘stop-motion’ O Elo Perdido conquistou a estatueta, destronando marcas do peso de Toy Story 4, O Rei Leão e Como Treinar o Seu Dragão 3. Justo. Outra boa novidade foi o triunfo da talentosíssima Laura Dern na categoria Melhor Atriz Coadjuvante. Embora Jennifer Lopez fosse apontada por muitos como a favorita por As Golpistas, a experiente atriz levou a melhor pelo seu papel como uma raivosa advogada em Histórias de Um Casamento. Por falar em veteranos, Tom Hanks arrancou risadas e lágrimas ao receber o prêmio honorário Cecil B. Demile. Num discurso emotivo, além de ficar com a voz embargada ao reverenciar a sua família, ele fez questão de falar menos de si e mais do todo, daqueles que ajudam a fazer um filme. Uma verdadeira ‘masterclass’ sobre a Sétima Arte. De volta as grandes surpresas, num ano em que Martin Scorsese e Quentin Tarantino pareciam polarizar a disputa, Sam Mendes faturou o prêmio de Melhor Direção pelo drama de guerra 1917. Ainda inédito no Brasil, o longa foi pensado\rodado como um único plano sequência, o que é sempre um desafio muito complexo para qualquer cineasta. Até aqui tudo bem.


Quem também destronou favoritos foi Brad Pitt. No ano em que Joe Pesci e Al Pacino impressionaram em O Irlandês, o astro de 56 anos levou o prêmio de Melhor Ator Coadjuvante por Era Uma Vez em Hollywood. Nenhum exagero, por sinal, já que Pitt está simplesmente sensacional na pele de um dublê muito 'bad-ass'. A mesma sorte, porém, não teve o seu companheiro de set Leonardo DiCaprio. Cotado como um dos favoritos, o ator viu o talentoso Taron Egerton ganhar o Globo de Ouro de Melhor Ator Coadjuvante por Rocketman. Embora o versátil ator britânico tenha soltado a voz com naturalidade e emocionado, o que torna a sua indicação inquestionável, a Associação de Correspondentes Estrangeiros seguiu o caminho mais fácil ao premiar (mais uma vez) a cinebiografia em detrimento de performances mais “autorais”. Em contrapartida, na categoria Melhor Atriz de Comédia e\ou Musical, o Globo de Ouro premiou a diversidade com a vitória da carismática Awkwafina por The Farewell. Uma pena que, até agora, o filme não tenha sido lançado (legalmente) no Brasil. Num dos pontos mais altos da cerimônia, Joaquin Phoenix (foto acima) foi ovacionado ao levar o Globo de Ouro de Melhor Ator por seu arrebatador papel como o palhaço do crime em Coringa. Na categoria mais acirrada da noite, o eclético realizador triunfou diante de nomes de peso como Adam Driver, Christian Bale, Jonathan Pryce e Antonio Banderas. Uma vitória da ousadia. No seu discurso, inclusive, Phoenix agradeceu dentre várias pessoas ao diretor Todd Phillips pela paciência e admitiu ser “um pé no saco” nas filmagens. Coringa, aliás, faturou também o prêmio de Melhor Trilha Sonora. Já na categoria Melhor Atriz dramática, seguindo uma tradicional (e envelhecida) predileção do Globo de Ouro, deu Renée Zewellger pelo seu (elogiado, é verdade) trabalho na cinebiografia Judy. Uma escolha segura.

Foto: Paul Drinkwater
Foi no prêmio mais importante da noite, porém, que o Globo de Ouro resolveu ousar de verdade. No ano em que Coringa causou um frisson ao redor do mundo, em que O Irlandês levou as pessoas a discutirem a forma de se consumir cinema, em que História de um Casamento discutiu o divórcio sob uma perspectiva tão reconhecível, a Associação de Correspondentes Estrangeiros de Hollywood decidiu consagrar o título menos cotado da lista. Enquanto o triunfo de Sam Mendes, pelos motivos citados acima, surgia como algo natural, a vitória de 1917 gerou um tipo de reação anticlimática que diz muito sobre o ‘timing’ da escolha. No palco subiu Mendes, com um time de atores jovens e um filme que, apesar do claro virtuosismo estético, não causou grande burburinho até aqui. Se no ano passado o Globo de Ouro optou pela ode ao popularesco, em 2020 a premiação se dividiu e a sua balança nem sempre pesou para o lado mais genuíno. Outra vez. No fim, Sam Mendes terminou clamando para que o público fosse ver o seu filme. Talvez nem o próprio estivesse esperando tamanha consagração. Confira a lista completa de vencedores nas categorias relacionadas ao cinema. 

Melhor Filme Comédia ou Musical

Era Uma Vez em Hollywood
Jojo Rabbit
Entre Facas e Segredos
Rocketman
Meu Nome é Dolemite

Melhor Filme Drama

“1917”
“O Irlandês”
“Coringa”
“História de Um Casamento”
“Dois Papas”

Melhor Diretor

Martin Scorsese – O Irlandês
Quentin Tarantino – Era Uma Vez em Hollywood
Bong Joon Ho - Parasita
Sam Mendes - 1917
Todd Phillips – Coringa

Melhor Ator Comédia ou Musical

Daniel Craig - Entre Facas e Segredos
Roman Griffin Davis - Jojo Rabbit
Leonardo DiCaprio - Era uma Vez em Hollywood...
Taron Egerton - Rocketman
Eddie Murphy - Meu Nome é Dolemite

Melhor Atriz Comédia ou Musical

Ana de Armas – Entre Facas e Segredos
Awkwafina - The Farewell
Cate Blanchett – Onde Você Está Bernadette
Beanie Feldstein – Fora de Série
Emma Thompson – Late Night

Melhor Ator Drama

Christian Bale – Ford Vs Ferrari
Antonio Banderas – Dor e Glória
Adam Driver – Histórias de Um Casamento
Joaquin Phoenix – Coringa
Jonathan Pryce – Dois Papas

Melhor Atriz Drama

Renée Zellweger - Judy
Cynthia Erivo - Harriet
Scarlett Johansson – História de Um Casamento
Saoirse Ronan - Little Women
Charlize Theron – O Escândalo

Melhor Ator Coadjuvante

Tom Hanks - A Beautiful Day in the Neighborhood
Al Pacino – O Irlandês
Joe Pesci – O Irlandês
Brad Pitt – Era uma Vez em Hollywood
Anthony Hopkins – Dois Papas

Melhor Atriz Coadjuvante

Kathy Bates – Richard Jewell
Annette Bening – O Relatório
Laura Dern – História de um Casamento
Jennifer Lopez – As Golpistas
Margot Robbie – O Escândalo

Melhor Animação

“Frozen II”
“Como Treinar o Seu Dragão 3”
“O Rei Leão”
“Missing Link”
“Toy Story 4”

Melhor Filme Estrangeiro

The Farewell
Les Miserables
Pain and Glory
Parasita
Portrait of a Lady on Fire

Melhor Roteiro

História de um Casamento
Parasita
Dois Papas
Era Uma Vez em Hollywood
O Irlandês

Melhor Canção Original

Cats
Frozen 2
Harriet
The Lion King
Rocketman

Melhor Trilha Sonora

Motherless Brooklyn
Little Women
Coringa
1917
História do Casamento

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