domingo, 10 de dezembro de 2017

Dez Grandes Filmes com Personagens Desfigurados


Adaptação da popular obra de R.J Palacio, Extraordinário (leia a nossa crítica aqui) se insurge conta o bullying ao narrar a jornada de um garotinho desfigurado obrigado a encarar a face mais vil do universo escolar. Sob a batuta de Stephen Chbosky, o longa estrelado por Jacob Tremblay cativa ao mostrar as desventuras de um garotinho portador de uma rara doença genética, uma criança comum obrigada a enfrentar o desprezo e a ignorância na luta para se enturmar neste novo ambiente. Mesmo embaixo de uma pesada e verossímil maquiagem, a estrela de O Quarto de Jack encanta ao traduzir os dilemas emocionais desta criança, enchendo a tela de sentimento ao capturar a essência da obra original. No Cinema, aliás, alguns grandes filmes souberam explorar os dilemas destas pessoas marcadas por problemas faciais, figuras que tiveram a sua vida modificada por doenças, experiências mal sucedidas e até mesmo acidentes. Aproveitando o frisson em torno da estreia de Extraordinário, no Cinemaniac resolvi listar outros dez grandes filmes com personagens desfigurados. 

- V de Vingança (2005)


Adaptação da Graphic Novel de David Lloyd, V de Vingança ganhou um merecido status cult ao narrar a história de vingança do misterioso V, um homem que teve a sua identidade transformada por um governo ditatorial após uma série de nefastos experimentos. Desfigurado, ele passou a utilizar a máscara de Guy Fawkes, se insurgindo de maneira anárquica contra o Estado na luta para que a verdade viesse a tona. Sem um pingo de vaidade, o versátil Hugo Weaving mostrou o seu reconhecido talento ao criar um anti-herói carismático e erudito, um tipo inteligente que se transformou no principal trunfo do empolgante longa do diretor James McTiegue.

- O Corcunda de Notre Dame (1939\1996)



Um dos mais populares contos do escritor francês Vitor Hugo, Notre-Dame de Paris já ganhou uma série de adaptações cinematográficas. Duas delas, porém, se tornaram as mais memoráveis. Lançado em 1939, O Corcunda de Notre Dame ajudou a consagrar a figura do desfigurado Quasimodo, um sineiro deformado que, após um gesto de carinho num momento de dor, decide proteger uma cigana acusada de assassinato. Com Charles Laughton no papel do corcunda e Maureen O'Hara como a bela Esmeralda, o longa dirigido pelo alemão William Dieterle soube realçar o subtexto envolvendo o preconceito presente na trama, presenteando o público com uma adaptação imponente e contundente. Já em 1996, quase seis décadas depois, a Disney tirou do papel uma comovente versão animada de O Corcunda de Notre Dame. Embora mais infantilizada, a produção dirigida por Gary Trousdale e Kirk Wise conseguiu resgatar a atemporalidade da obra original ao pintar uma singela e empolgante mensagem de respeito às diferenças.

- Cruzada (2005)



Um filme épico à moda antiga, o subestimado Cruzada virou sinônimo de grandiosidade ao narrar a conhecida batalha entre as tropas as tropas do reino Balduíno IV e o exército sultão Salazar. Embora peque por alguns erros históricos, o longa dirigido por Ridley Scott segue a linha Ben-Hur ao usar fatos reais como pano de fundo para uma trama, digamos, mais dramatizada. Por mais que o foco esteja na figura de Bailan (Orlando Bloom), um ferreiro atormentado que parte para Jerusalém para assumir as terras do seu pai, o grande destaque do longa ficou para o marcante rei Balduíno IV. Portador de lepra, o fragilizado rei interpretado por Edward Norton fascina ao se revelar um tipo sábio e destemido. Usando uma máscara para impedir que os outros enxergassem o seu acelerado processo de deterioração, o personagem cresce em cena de maneira singular, muito em função do esmero de Scott ao traduzir a sua "relação" com Salazar. Sem querer revelar muito, a sequência em que nos deparamos com a face do Balduíno IV é de tocar o coração, um momento sutil que revela a resiliência deste homem. Num todo, aliás, Scott investe pesado na maquiagem e na caracterização dos personagens, o que faz de Cruzada um épico positivamente sujo.

- Os Goonies (1985)



Um dos maiores clássicos da década de 1980, Os Goonies fez jus ao "quem vê cara, não vê coração" ao dar vida ao gigante Sloth. Pintado inicialmente como um dos antagonistas, principalmente em função da sua aparência deformada e da péssima influência familiar, o personagem se revela uma das figuras mais cativantes da película. Com o seu bordão "quero chocolate", o coadjuvante grandalhão interpretado por John Matuszak conquistou uma geração de fãs ao "virar a casaca" e criar um inusitado elo com o carismático Gordo (Jeff Cohen). Uma aventura inesquecível.

- Deadpool (2015)



Um dos maiores sucessos de público e crítica do gênero, o desbocado Deadpool (leia a nossa crítica completa) atestou o vanguardismo da Fox ao se revelar um filme de super-herói adulto e violento. Após fracassar com o personagem no terrível X-Men Origem: Wolverine, Ryan Reynolds lutou para conseguir uma nova chance, exigiu do estúdio liberdade criativa e classificação etária elevada. Um esforço recompensado. Na pele de um mercenário que, após passar por um tratamento experimental, ganhou superforça e um rosto completamente desfigurado, o ator canadense finalmente encontrou o sucesso dentro do gênero. Numa impagável história de vingança, Deadpool resolve ir atrás do homem por trás deste bizarro experimento, sem saber que durante o processo iria cruzar o caminho de outros dois X-Men. Assim como a maioria dos protagonistas desta lista, Reynolds abdicou da sua vaidade ao passar a maior parte do filme sob a máscara, um trabalho expressivo valorizado pelo virtuoso trabalho da equipe de CGI.

- O Homem que Ri (1928)



Uma preciosa pérola do Cinema Mudo, O Homem que Ri encanta e angustia ao narrar as desventuras de um homem marcado pelo seu sorriso. Com uma assinatura ousada para época, vide os engenhosos movimentos de câmera, a utilização de vanguardistas efeitos sonoros e uma sensual cena de nudez, o longa dirigido pelo expressionista Paul Leni revigorou a melodramática obra do escritor Vitor Hugo, flertando com o suspense e o horror ao caprichar na primorosa maquiagem, na atmosfera sombria e na desconfortável montagem acelerada. Impulsionado pela soberba performance de Conrad Veidt, o Cesare do clássico O Gabinete do Drº Caligari, Leni enche a tela de tensão e ritmo ao contar a história de Gwynplaine, o filho de um lorde inglês que, por vingança, tem o seu rosto desfigurado cirurgicamente ainda criança. Com um sorriso fixo no seu rosto, o jovem é adotado por um filósofo e com passar dos anos se torna um popular palhaço. De volta à Inglaterra após uma longa excursão, Gwynplaine entra na mira do responsável por tamanha que crueldade, já que agora ele se tornou o único herdeiro na linha de sucessão ao trono. Impecável ao interiorizar sentimentos tão contrastantes, Veidt comove ao traduzir o desespero do seu personagem, exprimindo tristeza, dor, raiva e amor sem nunca abdicar do seu sorriso. O resultado é sublimemente bizarro, uma composição única capturada com brilhantismo pelas expressivas lentes de Leni. Além disso, qualquer semelhança com o vilanesco Coringa, definitivamente, não é mera coincidência, já que O Homem que Ri se tornou uma das principais referências na composição do clássico antagonista das histórias em quadrinhos.

- Marcas do Destino (1985)



Sob a batuta do renomado Peter Bogdanovich, Marcas do Destino conquistou o público e a crítica ao narrar a história real de Rocky Dennis, um jovem com deformidade facial que precisou superar o preconceito para inspirar a todos que o cercavam. Lançado no respeitado Festival de Cannes, o longa estrelado por Cher e Eric Stoltz se tornou referência quando o assunto é o amor materno, principalmente por se concentrar na estreita relação entre Rocky e a sua mãe, a dedicada Rusty. No centro da trama, Cher, inclusive, foi eleita a Melhor Atriz em Cannes e conquistou uma indicação ao Globo de Ouro de Melhor Atriz Dramática. Além disso, Marcas do Destino investiu pesado na composição estética do protagonista, um trabalho marcante que justamente foi premiado com o Oscar de Melhor Maquiagem. Mesmo limitado pela prótese, aliás, Erick Stoltz fascina ao absorver os conflitos de Rocky, o turbilhão de emoções que o cerca, o que lhe rendeu uma indicação ao Globo de Ouro de Melhor Ator Coadjuvante.

- O Homem Elefante (1980)


Inspirado numa incrível história real, O Homem Elefante emociona ao revelar a resiliência de um homem transformado por uma doença. Conduzido com peso e sensibilidade pelo cultuado David Lynch, o longa não poupa o espectador ao revelar o sofrimento imposto pela insensatez e pela covardia humana. Um entusiasta do excêntrico/bizarro, o realizador pregou o realismo sóbrio ao desvendar a jornada de John Merrick, um portador de elefantíase que era tratado como um animal num 'freak show'. Descoberto por um médico, ele recebe abrigo e uma chance de voltar à sociedade, expondo o melhor e o pior entre àqueles que o cercavam. Com sobriedade e uma impactante fotografia em preto e branco, Lynch enche a tela de sentimento tanto nas devastadoras sequências de agressão, quanto nas reconfortantes cenas de companheirismo, nos brindando com uma sucessão de momentos memoráveis. Como não citar, por exemplo, a cena em que John se emociona diante de um simples sorriso feminino, ou então o grito de desespero de um homem fragilizado acuado por uma multidão. Embora o astro Anthony Hopkins brilhe como um médico com sede de reconhecimento indeciso quanto a moralidade dos seus atos, O Homem Elefante encanta graças a estupenda performance do saudoso John Hurt. Mesmo embaixo de uma pesada e realística maquiagem, o ator impressiona ao extrair o máximo de emoção do seu personagem. Com um olhar humano, uma fala gentil e um trabalho físico impressionante, Hurt cria uma figura doce e otimista, transitando primorosamente entre a dor e a alegria, entre o sofrimento e a esperança. Uma atuação completa num filme extraordinário.

- Phoenix (2014)



Tal qual a ave mitológica que dá titulo a este belíssimo exemplar do cinema alemão, Phoenix (leia a nossa crítica) impressiona ao narrar de maneira elegante a jornada de uma mulher que renasce das cinzas após sobreviver a brutalidade do holocausto. Impulsionado pela soberba atuação de Nina Hoss (O Homem mais Procurado), brilhante ao explorar as nuances de uma cantora desfigurada pelos nazistas, este intenso drama sobre o pós-Segunda Guerra encanta pela inesperada sutileza com que acompanha a corajosa busca desta emblemática personagem por sua identidade perdida no conflito. Dirigido com rara inspiração por Christian Petzold (Barbara), o longa se distancia por completo da previsibilidade ao se aprofundar nas consequências deste tenebroso período, construindo com assombrosa frieza uma dolorosa história de amor e descobertas. Diferente da maioria dos filmes da lista, porém, Phoenix não se concentra propriamente no processo de socialização de uma pessoa desfigurada, mas na retomada de uma mulher atormentada disposta a encontrar o responsável por tamanho sofrimento. Um suspense denso e intimista que, dentre os seus inúmeros predicados, presenteia o espectador com uma magnífica sequência final.

- O Fantasma da Ópera (1925)


Por fim talvez o grande clássico desta lista. Esqueça o musical romantizado de Joel Schumacher estrelado por Gerard Butler e Amy Rossum. Numa visão bem mais sombria e corajosa, O Fantasma da Ópera (1925) trouxe a versão mais popular deste icônico personagem. Com o "homem das mil faces" Lon Chaney (O Corcunda de Notre Dame, O Monstro do Circo) na pele do temido Fantasma, um homem desformado que, após anos vivendo nas sombras de um teatro, decide expor os seus "estranhos" sentimentos pela cantora Christine (Mary Philbin), o longa dirigido por Rupert Julian esbanja tensão ao acompanhar as consequências desta abusiva relação. Sem um pingo de condescendência, o realizador extrai o terror da obra de Gaston Leroux, entregando um dos antagonistas mais memoráveis da Era de Ouro do cinema. Com uma maquiagem ainda hoje pavorosa, Chaney incomoda ao traduzir os distorcidos sentimentos do seu personagem, criando uma figura imponente e naturalmente assustadora. Somado a isso, Julian é cuidadoso ao criar o suspense em torno do vilão, nos brindando com uma das sequências de revelação mais icônicas (e espantosas) da história da Sétima Arte.

E aproveitando o tema confira o nosso artigo sobre os atores que brilharam mesmo "escondidos" pela maquiagem, máscaras e\ou pelo CGI.

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