O milagre da ressocialização
O Estado que crê em Deus, porém, não crê (de verdade) no homem. O milagre da ressocialização é uma farsa. O perdão, aqui, é tratado sob múltiplos significados. Disposto a fugir do passado que tanto o limitava, Daniel resolve assumir outra identidade. Resolve abraçar a sua vocação. Resolve, tal qual a sua maior inspiração, pregar, assumir as suas falhas, se sacrificar em prol de algo que realmente acreditava. Após um primeiro ato já impactante, Corpus Christi cresce ao focar na intimidade do personagem e no impacto que ele exerce nesta nova comunidade marcada por um trauma. O roteiro assinado por Mateusz Pacewicz fala sempre nas entrelinhas. A partir da intensa jornada do protagonista, Tomasz Komasa discorre sobre fé, ganância, formação, injustiça.
O diretor coloca o dedo na ferida ao, a partir de uma figura tão jovem e ao mesmo tempo tão castigada, expor a verdade que todos ali não queriam ver. Algo que só quem sentiu na pele poderia conseguir. A escola da vida, aos olhos do diretor polonês, é mais didática que a formação religiosa. Com uma condução intimista, Komasa usa a expressiva fotografia e a preciosa iluminação das cenas para traduzir o estado de espírito de Daniel. A palheta fria inicial logo é tomada por luz e cores. Uma coloração discreta, é verdade, mas radiante. Geralmente em tons esverdeados. Ora calorosos, ora melancólicos. Isso reflete a posição do personagem. O misto de força e fraqueza. Fé e frustração. Angústia e esperança. A sequência da extrema unção é de uma sensibilidade indescritível. Embora se sustente em algumas óbvias conveniências narrativas, Corpus Christi promove uma reflexão ao questionar àqueles que não põem em prática aquilo que acreditam e o estrago causado por eles. O perdão é transformador. A desigualdade também.
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