quinta-feira, 15 de agosto de 2019

Com Era uma Vez em Hollywood e Ad Astra, Brad Pitt está de volta, revigorado e preparado para brilhar


O ponto final no midiático casamento com a estrelar atriz Angelina Jolie foi um divisor de águas na vida de Brad Pitt. Vulnerável diante de acusações que nunca se comprovaram e do sensacionalismo dos tabloides, o astro decidiu se abrir, decidiu expor o homem escondido no seu ‘star power’. Pitt redefiniu as suas expectativas. Assumiu que o alcoolismo era um grande problema. Que o seu estilo de vida tinha um alto custo. Em meio à turbulência da separação em 2016 optou por priorizar a sua família, o bem-estar dos seus seis filhos. Procurou terapia. O apoio dos amigos. “Eu fui criado com aquela mentalidade de que o pai tem que ser o todo-poderoso, o super-forte em vez de realmente conhecer suas próprias dúvidas e lutas. O divórcio me mostrou que eu preciso ser mais, que eu tenho que ser mais para eles. E eu não estava sendo bom nisso”, admitiu o ator em entrevista a GQ Style em 2017. Uma das maiores estrelas de Hollywood decidiu se afastar. Recalcular as suas prioridades. A atuação ficou em segundo plano. E motivos não faltaram para ele optar por esse caminho. 


Ao longo de duas décadas Brad Pitt foi um dos mais celebrados\cultuados\explorados rostos de uma indústria sedenta pelo sucesso. Profissional e também pessoal. Com charme de galã e muita intensidade em cena, ele trilhou uma trajetória de ascensão praticamente sem precedentes. Em 1988, após alguns pequenos papéis na TV e no Cinema, Pitt chamou a atenção no minúsculo drama O Príncipe das Sombras (foto acima). Uma coprodução EUA-Iugoslávia sobre um jovem à procura de um tratamento para a sua rara doença na pele. Pouco tempo depois, em 1991, o então promissor ator foi alçado a posição de símbolo sexual com a sua objetificada performance no clássico norte-americano Thelma e Louise. Se existiu um sinônimo de beleza masculina neste período, este foi Brad Pitt. A sua aptidão para tipos mais desafiadores, porém, não demoraria a ser reconhecida. Em 1993, Pitt colecionou elogios da crítica por seu papel como um assassino em série no thriller Kalifórnia. “Pitt e (Julliete) Lewis dão duas das interpretações mais angustiantes e convincentes que eu já vi”, sintetizou o aclamado crítico Roger Ebbert em sua análise sobre a obra de Dominic Sena. A consagração, no entanto, veio nos seus dois próximos projetos. Com o aclamado Entrevista com Vampiro (1994), Brad Pitt viu o seu rótulo estrelar finalmente radiar num romance gótico que atraiu a atenção de todos ao reunir frente a frente dois dos grandes símbolos de Hollywood nos anos 1990. O outro, claro, era Tom Cruise. O filme fez um estrondoso sucesso junto ao público, fortaleceu a sua imagem de galã e deu a ele uma legião de fãs ao redor do mundo. A sua metamorfose dentro da indústria, entretanto, alcançaria o seu ápice com o thriller Seven (1995). Sob a batuta de um já cultuado David Fincher, Pitt (foto abaixo) embarcou numa obra pesada, diferente de tudo o que já havia feito na sua carreira. Um suspense sujo e urbano que deu ao astro a chance de mostrar a sua face mais madura. O resultado foi um triunfo de público e crítica. O passo que ele precisava para se colocar entre os gigantes de Hollywood.


Em menos de seis anos, o então desconhecido rosto jovem de O Príncipe das Trevas (1988) se transformou na estrela madura de Seven (1995). Um status que viria a se manter inalterado nos anos seguintes. Embora frequentemente associado ao seu charme e beleza, Brad Pitt nunca ficou preso ao rótulo de galã. Muito pelo contrário. Nos anos seguintes trabalhou com os melhores cineastas em títulos ecléticos como o insano Sci-Fi Os 12 Macacos (1995), filme que garantiu a sua primeira indicação ao Oscar, o drama de época Sleepers (1996), o popular Inimigo Íntimo (1997), o elegante drama biográfico Sete Anos no Tibet (1997), o anárquico suspense Clube da Luta (1999), o descolado thriller de ação Snatch (2000), o charmoso 11 Homens e Um Segredo (2001), o épico Tróia (2004), o frenético Srº e Srª Smith (2005), o intenso Babel (2006), o transloucado Queime Depois de Ler (2008), o romance fantástico O Curioso Caso de Benjamin Button (2008), o afiado Bastardos Inglórios (2009), o transcendental A Árvore da Vida (2010), o independente O Homem que Mudou o Jogo (2011). Pitt experimentou de tudo. Dos diretores mais autorais (Terry Gillian, David Fincher, Irmãos Coen) aos mais populares (Wolfgang Petersen, Guy Ritchie, Doug Liman). Das gigantescas produções de Hollywood aos projetos mais independentes. Longe das telas, no entanto, o seu ‘star power’ seguia inalterado. E a sua vida pessoal cada vez mais atribulada. Pitt se tornou um realizador com intimidade exposta. Algo potencializado pelo ‘status’ das parceiras. Após dividir a tela com Juliette Lewis em Kalifónia, ele emendou um curto relacionamento com ela. Pouco tempo depois, Pitt namorou e chegou a ficar noivo da também colega de set de Seven (1995), Gwyneth Paltrow, entre 1994 e 1997. Neste período, em entrevista a Rolling Stones em 1994, Pitt confessou que não gostaria que o público conhecesse a sua intimidade. “Não sei nada dos meus atores favoritos, de outro modo virariam celebridades”. Comenta-se que nesta fase Pitt tinha um comportamento até recluso, gostava de ficar em casa, fumando maconha e curtindo uma espécie de paz que o “mundo lá fora” não permitia a uma estrela do seu escopo. O que aconteceu, porém, foi justamente o contrário. Após o repentino rompimento com Paltrow, ele começou a relação que se tornaria um dos assuntos mais comentados nos tabloides. Em 1998, Pitt conheceu num encontro às cegas a então estrela da série Friends Jennifer Anniston e juntos se transformaram no casal “queridinho” da América. Após o casamento nos 2000, os dois pareciam viver um verdadeiro conto de fadas, uma ilusão obviamente alimentada pela mídia. O casal rendia muito.


A verdade, no entanto, era totalmente distinta. Enquanto profissionalmente a carreira dos dois seguia numa constante curva ascendente, a vida pessoal estava de mal a pior. Em entrevista ao site da CNN Entertainment, em 2011, Brad Pitt não escondeu de ninguém a sua frustração quanto a este período da sua intimidade. “Eu passei os anos 90 tentando me esconder, tentando esconder a cacofonia das celebridades. Eu comecei a ficar enjoado de mim mesmo sentado em um sofá, segurando um baseado, me escondendo. Comecei a me se sentir patético. Ficou muito claro para mim que eu estava tentando encontrar um filme sobre uma vida interessante, mas eu mesmo não estava vivendo uma vida interessante. (...) Eu acho que meu casamento (com Aniston) teve algo a ver com isso. Tentei fingir que o casamento era algo que não era”, concluiu Pitt. Embora, pouco tempo depois, o ator tenha até pedido desculpa a sua ex-companheira por essa entrevista, o fato é que Pitt vivia o sonho de outros. Imagine, portanto, o choque quando começaram a surgir as primeiras notícias de que ele estava tendo um “affair” com a sua parceira de Srº e Srª Smith (2005) Angelina Jolie. Os tabloides entraram em ebulição. Os fãs se dividiram entra a revolta e o frisson. Por mais que os dois negassem o caso, o fato é que em outubro de 2005 Brad Pitt e Jennifer Aniston assinaram o divórcio. E que pouco tempo depois, um mês mais precisamente, Pitt e Jolie foram flagrados juntos numa viagem em solo africano. Iniciava assim mais um furacão na vida pessoal do astro. O casal Brangelina se tornou o prato preferido da mídia. Primeiro veio a enxurrada de críticas ao papel de Jolie no divórcio, nada mais comum na sociedade machista em que vivemos. Ela era a culpada para muitos. Aos poucos, entretanto, Pitt e Jolie se tornaram um casal modelo. Excêntrico, mas funcional. Juntos, eles passaram a ter uma postura mais engajada. Viajavam o mundo atraindo a atenção para verdadeiras crises humanitárias. Foram para o Haiti em 2006, doaram US$ 1 milhão para ONG’s voltadas as crianças do Sudão em 2007.  Nesse meio tempo, eles criaram a fundação Jolie-Pitt de caridade, doando milhões de dólares para organizações como o Médico Sem Fronteiras. Em 2006, Pitt decidiu olhar também para os EUA e liderar um projeto de construção de 150 casas para as vítimas do furacão Catrina em Nova Orleans. Os dois se tornaram verdadeiros cidadãos do mundo.


Em 2011, ao CNN Entertainment, Brad Pitt afirmou que “uma família é um empreendimento arriscado, porque quanto maior o amor, maior a perda. Essa é a aposta. Mas eu vou ganhar”. E ele estava disposto a seguir à risca este projeto. Numa das grandes fases da sua carreira, o astro passou a dedicar maior tempo a produção dos seus projetos. Os grandes e desgastantes blockbusters passaram a ficar em segundo plano. Títulos como Guerra Mundial Z (2013) foram a exceção neste período. Mesmo nesta fase mais “discreta”, entretanto, Pitt seguia no olho do furacão midiático. Com direito a casos extremos, como quando, durante o parto dos seus filhos gêmeos, paparazzos chegaram ao cúmulo de alugar um andar próximo ao hospital na tentativa de registrar o aguardado parto. A abordagem sensacionalista de parte da imprensa era um problema que Brad Pitt tentava não dar atenção. “Eu não leio sobre Angie ou eu na imprensa. Eu não vejo nada. Eu realmente não quero saber. Eu estou falando sobre a imprensa do tabloide. Nos anos 90, isso realmente me abalou. Eu não podia acreditar que as pessoas inventariam histórias. Eu nunca pensaria em fazer isso. Quero dizer, eu fui para a escola de jornalismo. E há um código de ética para o jornalismo. É sobre ser imparcial e não sensacionalista e especulativo. Agora há um culto à especulação.”, sintetizou Pitt em 2011 ao CNN Entertainment. Só em Agosto de 2014, quase dez anos depois do início da relação, Brad Pitt e Angelina Jolie se casaram. Já com seis filhos, um histórico de perseguição\glamourização por parte da imprensa, algumas polêmicas, muita filantropia, muitas viagens em família, grandes filmes (de ambas as partes) e um ‘star power’ quase que inigualável. Eles pareciam reagir bem aos inúmeros boatos que ora e vez cercavam a sua relação. Se mantinha juntos, unidos. Desde a época de Ouro, Hollywood não tinha um casal tão poderoso e influente dentro da indústria.


Mais uma vez, no entanto, as coisas começaram a se deteriorar. E, desta vez, os motivos não são claros. Talvez para proteger os seus herdeiros, tanto Jolie quanto Pitt não se manifestam abertamente sobre os fatos que colocaram um ponto final numa relação de dez anos. Na verdade, uma discussão entre o ator e o seu filho Maddox (na época com 15 anos) teria sido a gota d’água para o fim do matrimônio, em 2016. Pitt chegou a ser investigado por suposto “abuso infantil”, mas nada foi provado contra ele. Curiosamente, a relação que havia começado com o encontro no set do quente Srº e Srª Smith (2005) chegava ao fim uma década depois com um reencontro no set do frio À Beira-Mar (2015). Escrito e dirigido por Angelina Jolie, o longa narrava as desventuras sentimentais de um casal em crise conjugal obrigado a enfrentar o passado num resort paradisíaco. Na época do lançamento, By The Sea (no original) passou em branco pelo público e foi recebido com pouco entusiasmo pela crítica. Com o anúncio do divórcio, porém, ficou impossível não associar o teor da película ao estado de espírito do casal, principalmente quando Brad Pitt, em uma corajosa entrevista, admitiu conviver, tal qual o seu personagem, com os problemas com a bebida. “Não me lembro de um dia, desde que saí da faculdade, em que não tenha bebido ou tenha fumado um baseado ou algo assim. E me dou conta de que são pacificadores, que estou fugindo dos meus sentimentos. Larguei tudo quando comecei minha família, menos a bebida, mas no último ano estava bebendo muito. Isso se tornou um problema”, revelou o ator à GQ Style. O estrago estava feito. Do alto dos seus 52 anos na época, Brad Pitt seguia popular, sua carreira (ao contrário do que acontece com a grande maioria vítima de dependência química) seguia sem um arranhão, mas agora ele estava sozinho. Sem sua família. Engolido por um delicado processo de divórcio. Desta vez ele perdeu. E muito.

Brad Pitt ao lado do diretor Steve Mcqueen celebram o Oscar de Melhor Filme por 12 Anos de Escravidão
O resultado não podia ser outro. Veio o isolamento. Uma forçada mudança de hábitos. Brad Pitt buscou refúgio primeiro com os amigos. Segundo consta, o diretor David Fincher (Seven, Clube da Luta) foi um dos que o ajudaram bastante no processo. Mesmo assim, já numa fase de recuperação física\emocional, Brad Pitt chegou a afirmar que “não se enxergava mais como um ator”. Segundo ele, em entrevista a GQ Style em 2017, trabalhar em um filme (naquele momento) “era como uma fuga barata, uma maneira de superar esses sentimentos difíceis. Isso não funciona mais, especialmente agora como pai”. Um distanciamento que se refletiu na sua carreira. Embora nesse meio tempo Pitt tenha se mantido em atividade, estrelando títulos como o subestimado thriller dramático Aliados (2016) e a frouxa sátira política Máquina de Guerra (2017), algo havia se perdido. Pitt talvez pela primeira vez resolveu se “proteger”. Fugir do turbilhão que o cercava. Ele parecia tentar se readaptar ao jogo sem abdicar do seu ‘star power’. Em entrevista recente à GQ Austrália, ele confessou enxergar uma espécie de renovação predatória dentro da indústria. “Eu realmente acredito que, no geral, é um jogo de jovens — não que não haja papéis bons para pessoas mais velhas — eu apenas sinto que o próprio jogo avança naturalmente. Há uma seleção natural. (...) Eu posso ser um dinossauro e não fazer ideia, cara. E o cometa pode estar a caminho”, confessou em um tom (sejamos francos) incompatível com o seu status. É fato, no entanto, que antes mesmo deste processo de “distanciamento” ele decidiu assumir as rédeas das suas produções. Se tornar menos dependente de uma indústria com apetite pelo novo. Se antecipar a esta eventual “extinção”. Vieram então títulos como 12 Anos de Escravidão (2013), Selma (2014), A Grande Aposta (2015), Moonlight (2016), Z: A Cidade Perdida (2016), Se a Rua Beale Falasse (2018), Vice (2018). Todos pilotados pela sua produtora, a Plan B Entertainment. Obras que, com a participação ativa de Pitt, entraram no radar das grandes premiações e deram a ele o seu primeiro Oscar (como produtor de 12 anos de Escravidão). Em outras palavras, mesmo em uma das fases mais complicadas de sua vida pessoal, Pitt seguiu produtivo, emprestando o seu prestígio para alguns dos melhores filmes lançados nos últimos anos.


O ano de 2019, porém, promete ser diferente para Brad Pitt. Após quase uma década com poucos projetos no universo ‘mainstream’, os trailers de Ad Astra e Era uma Vez em Hollywood mostraram um astro aparentemente revigorado e preparado para brilhar. É o que esperamos. Com a vida pessoal nos trilhos e muito a oferecer à Sétima Arte, Pitt pode até achar que a indústria é pensada para os jovens, mas são poucos os atores na atualidade capazes de atrair para os seus projetos um status como o seu. Lançado no Festival de Cannes cercado de expectativas, Era Uma Vez em Hollywood chega aos cinemas como o projeto mais imponente da sua filmografia desde Guerra Mundial Z (2013). Com um alcance de blockbuster, direção de Quentin Tarantino e um elenco que parece reunir o melhor que Hollywood nos ofereceu nas últimas cinco décadas, o longa traz de volta o “velho novo” Brad Pitt, uma estrela capaz de liderar grandes produções. Do alto dos seus 55 anos, o ator, segundo o próprio Tarantino, deu ao projeto tudo que ele precisava para triunfar. “Eu pensei que ele (Brad Pitt) seria ótimo nesse personagem porque eu precisava não só de um ator fantástico, mas também de uma estrela de cinema e particularmente de uma estrela de cinema como o Sr. Pitt, uma estrela de cinema que eu acho que o público gosta de assistir. Como um Steve McQueen ou alguém – que você gosta de vê-lo. Você gosta de ver o jeito que ele se move, você gosta de ver o jeito que ele dirige. Essa qualidade legal e masculina que uma estrela de cinema pode ter - ele tem”, confessou Tarantino. E ele não deixa de ter razão. Mesmo exposto, julgado, admirado e\ou questionado, Brad Pitt segue sendo Brad Pitt. Magnético, talentoso, versátil, falho. Um homem que, por trás da sua indiscutível beleza, esconde uma aura reconhecível. E após tanto tempo vivendo dentro de uma casca, a do símbolo sexual, a do marido perfeito, a do astro bem-sucedido, ele parece finalmente disposto a expor a verdade, a desmistificar as coisas, a se tornar o astro que sempre sonhou ser. Uma estrela talvez mais discreta, mas não menos radiante.

2 comentários:

Priscila disse...

Ótimo artigo!

thicarvalho disse...

Valeu Priscila, obrigado pela visita e pelo elogio.