O ponto final no midiático casamento com a estrelar atriz Angelina Jolie foi um divisor de águas na vida de Brad Pitt. Vulnerável diante de acusações que nunca se comprovaram e do sensacionalismo dos tabloides, o astro decidiu se abrir, decidiu expor o homem escondido no seu ‘star power’. Pitt redefiniu as suas expectativas. Assumiu que o alcoolismo era um grande problema. Que o seu estilo de vida tinha um alto custo. Em meio à turbulência da separação em 2016 optou por priorizar a sua família, o bem-estar dos seus seis filhos. Procurou terapia. O apoio dos amigos. “Eu fui criado com aquela mentalidade de que o pai tem que ser o todo-poderoso, o super-forte em vez de realmente conhecer suas próprias dúvidas e lutas. O divórcio me mostrou que eu preciso ser mais, que eu tenho que ser mais para eles. E eu não estava sendo bom nisso”, admitiu o ator em entrevista a GQ Style em 2017. Uma das maiores estrelas de Hollywood decidiu se afastar. Recalcular as suas prioridades. A atuação ficou em segundo plano. E motivos não faltaram para ele optar por esse caminho.
Ao longo de duas décadas Brad
Pitt foi um dos mais celebrados\cultuados\explorados rostos de uma indústria
sedenta pelo sucesso. Profissional e também pessoal. Com charme de galã e muita
intensidade em cena, ele trilhou uma trajetória de ascensão praticamente sem
precedentes. Em 1988, após alguns pequenos papéis na TV e no Cinema, Pitt
chamou a atenção no minúsculo drama O Príncipe das Sombras (foto acima). Uma coprodução
EUA-Iugoslávia sobre um jovem à procura de um tratamento para a sua rara doença
na pele. Pouco tempo depois, em 1991, o então promissor ator foi alçado a
posição de símbolo sexual com a sua objetificada performance no clássico
norte-americano Thelma e Louise. Se existiu um sinônimo de beleza masculina
neste período, este foi Brad Pitt. A sua aptidão para tipos mais desafiadores,
porém, não demoraria a ser reconhecida. Em 1993, Pitt colecionou elogios da
crítica por seu papel como um assassino em série no thriller Kalifórnia. “Pitt
e (Julliete) Lewis dão duas das interpretações mais angustiantes e convincentes
que eu já vi”, sintetizou o aclamado crítico Roger Ebbert em sua análise sobre
a obra de Dominic Sena. A consagração, no entanto, veio nos seus dois próximos
projetos. Com o aclamado Entrevista com Vampiro (1994), Brad Pitt viu o seu
rótulo estrelar finalmente radiar num romance gótico que atraiu a atenção de
todos ao reunir frente a frente dois dos grandes símbolos de Hollywood nos anos
1990. O outro, claro, era Tom Cruise. O filme fez um estrondoso sucesso junto
ao público, fortaleceu a sua imagem de galã e deu a ele uma legião de fãs ao
redor do mundo. A sua metamorfose dentro da indústria, entretanto, alcançaria o
seu ápice com o thriller Seven (1995). Sob a batuta de um já cultuado David
Fincher, Pitt (foto abaixo) embarcou numa obra pesada, diferente de tudo o que já havia feito
na sua carreira. Um suspense sujo e urbano que deu ao astro a chance de mostrar
a sua face mais madura. O resultado foi um triunfo de público e crítica. O
passo que ele precisava para se colocar entre os gigantes de Hollywood.
Em menos de seis anos, o então
desconhecido rosto jovem de O Príncipe das Trevas (1988) se transformou na
estrela madura de Seven (1995). Um status que viria a se manter inalterado nos
anos seguintes. Embora frequentemente associado ao seu charme e beleza, Brad
Pitt nunca ficou preso ao rótulo de galã. Muito pelo contrário. Nos anos
seguintes trabalhou com os melhores cineastas em títulos ecléticos como o
insano Sci-Fi Os 12 Macacos (1995), filme que garantiu a sua primeira indicação
ao Oscar, o drama de época Sleepers (1996), o popular Inimigo Íntimo (1997), o
elegante drama biográfico Sete Anos no Tibet (1997), o anárquico suspense Clube
da Luta (1999), o descolado thriller de ação Snatch (2000), o charmoso 11
Homens e Um Segredo (2001), o épico Tróia (2004), o frenético Srº e Srª Smith
(2005), o intenso Babel (2006), o transloucado Queime Depois de Ler (2008), o
romance fantástico O Curioso Caso de Benjamin Button (2008), o afiado Bastardos
Inglórios (2009), o transcendental A Árvore da Vida (2010), o independente O
Homem que Mudou o Jogo (2011). Pitt experimentou de tudo. Dos diretores mais
autorais (Terry Gillian, David Fincher, Irmãos Coen) aos mais populares
(Wolfgang Petersen, Guy Ritchie, Doug Liman). Das gigantescas produções de
Hollywood aos projetos mais independentes. Longe das telas, no entanto, o seu
‘star power’ seguia inalterado. E a sua vida pessoal cada vez mais atribulada. Pitt
se tornou um realizador com intimidade exposta. Algo potencializado pelo
‘status’ das parceiras. Após dividir a tela com Juliette Lewis em Kalifónia,
ele emendou um curto relacionamento com ela. Pouco tempo depois, Pitt namorou e
chegou a ficar noivo da também colega de set de Seven (1995), Gwyneth Paltrow, entre 1994 e 1997. Neste período, em entrevista a Rolling Stones em 1994, Pitt
confessou que não gostaria que o público conhecesse a sua intimidade. “Não sei
nada dos meus atores favoritos, de outro modo virariam celebridades”.
Comenta-se que nesta fase Pitt tinha um comportamento até recluso, gostava de
ficar em casa, fumando maconha e curtindo uma espécie de paz que o “mundo lá
fora” não permitia a uma estrela do seu escopo. O que aconteceu, porém, foi
justamente o contrário. Após o repentino rompimento com Paltrow, ele começou a
relação que se tornaria um dos assuntos mais comentados nos tabloides. Em 1998,
Pitt conheceu num encontro às cegas a então estrela da série Friends Jennifer
Anniston e juntos se transformaram no casal “queridinho” da América. Após o
casamento nos 2000, os dois pareciam viver um verdadeiro conto de fadas, uma
ilusão obviamente alimentada pela mídia. O casal rendia muito.
A verdade, no entanto, era
totalmente distinta. Enquanto profissionalmente a carreira dos dois seguia numa
constante curva ascendente, a vida pessoal estava de mal a pior. Em entrevista
ao site da CNN Entertainment, em 2011, Brad Pitt não escondeu de ninguém a sua
frustração quanto a este período da sua intimidade. “Eu passei os anos 90
tentando me esconder, tentando esconder a cacofonia das celebridades. Eu
comecei a ficar enjoado de mim mesmo sentado em um sofá, segurando um baseado,
me escondendo. Comecei a me se sentir patético. Ficou muito claro para mim que
eu estava tentando encontrar um filme sobre uma vida interessante, mas eu mesmo
não estava vivendo uma vida interessante. (...) Eu acho que meu casamento (com
Aniston) teve algo a ver com isso. Tentei fingir que o casamento era algo que
não era”, concluiu Pitt. Embora, pouco tempo depois, o ator tenha até pedido
desculpa a sua ex-companheira por essa entrevista, o fato é que Pitt vivia o
sonho de outros. Imagine, portanto, o choque quando começaram a surgir as
primeiras notícias de que ele estava tendo um “affair” com a sua parceira de
Srº e Srª Smith (2005) Angelina Jolie. Os tabloides entraram em ebulição. Os
fãs se dividiram entra a revolta e o frisson. Por mais que os dois negassem o
caso, o fato é que em outubro de 2005 Brad Pitt e Jennifer Aniston assinaram o
divórcio. E que pouco tempo depois, um mês mais precisamente, Pitt e Jolie
foram flagrados juntos numa viagem em solo africano. Iniciava assim mais um
furacão na vida pessoal do astro. O casal Brangelina se tornou o prato
preferido da mídia. Primeiro veio a enxurrada de críticas ao papel de Jolie no
divórcio, nada mais comum na sociedade machista em que vivemos. Ela era a
culpada para muitos. Aos poucos, entretanto, Pitt e Jolie se tornaram um casal
modelo. Excêntrico, mas funcional. Juntos, eles passaram a ter uma postura mais
engajada. Viajavam o mundo atraindo a atenção para verdadeiras crises
humanitárias. Foram para o Haiti em 2006, doaram US$ 1 milhão para ONG’s
voltadas as crianças do Sudão em 2007.
Nesse meio tempo, eles criaram a fundação Jolie-Pitt de caridade, doando
milhões de dólares para organizações como o Médico Sem Fronteiras. Em 2006,
Pitt decidiu olhar também para os EUA e liderar um projeto de construção de 150
casas para as vítimas do furacão Catrina em Nova Orleans. Os dois se tornaram
verdadeiros cidadãos do mundo.
Em 2011, ao CNN Entertainment,
Brad Pitt afirmou que “uma família é um empreendimento arriscado, porque quanto
maior o amor, maior a perda. Essa é a aposta. Mas eu vou ganhar”. E ele estava
disposto a seguir à risca este projeto. Numa das grandes fases da sua carreira,
o astro passou a dedicar maior tempo a produção dos seus projetos. Os grandes e
desgastantes blockbusters passaram a ficar em segundo plano. Títulos como
Guerra Mundial Z (2013) foram a exceção neste período. Mesmo nesta fase mais
“discreta”, entretanto, Pitt seguia no olho do furacão midiático. Com direito a
casos extremos, como quando, durante o parto dos seus filhos gêmeos, paparazzos
chegaram ao cúmulo de alugar um andar próximo ao hospital na tentativa de
registrar o aguardado parto. A abordagem sensacionalista de parte da imprensa
era um problema que Brad Pitt tentava não dar atenção. “Eu não leio sobre Angie
ou eu na imprensa. Eu não vejo nada. Eu realmente não quero saber. Eu estou
falando sobre a imprensa do tabloide. Nos anos 90, isso realmente me abalou. Eu
não podia acreditar que as pessoas inventariam histórias. Eu nunca pensaria em
fazer isso. Quero dizer, eu fui para a escola de jornalismo. E há um código de
ética para o jornalismo. É sobre ser imparcial e não sensacionalista e especulativo.
Agora há um culto à especulação.”, sintetizou Pitt em 2011 ao CNN
Entertainment. Só em Agosto de 2014, quase dez anos depois do início da
relação, Brad Pitt e Angelina Jolie se casaram. Já com seis filhos, um
histórico de perseguição\glamourização por parte da imprensa, algumas
polêmicas, muita filantropia, muitas viagens em família, grandes filmes (de
ambas as partes) e um ‘star power’ quase que inigualável. Eles pareciam reagir
bem aos inúmeros boatos que ora e vez cercavam a sua relação. Se mantinha
juntos, unidos. Desde a época de Ouro, Hollywood não tinha um casal tão
poderoso e influente dentro da indústria.
Mais uma vez, no entanto, as coisas começaram a se deteriorar. E, desta vez, os motivos não são claros. Talvez para proteger os seus herdeiros, tanto Jolie quanto Pitt não se manifestam abertamente sobre os fatos que colocaram um ponto final numa relação de dez anos. Na verdade, uma discussão entre o ator e o seu filho Maddox (na época com 15 anos) teria sido a gota d’água para o fim do matrimônio, em 2016. Pitt chegou a ser investigado por suposto “abuso infantil”, mas nada foi provado contra ele. Curiosamente, a relação que havia começado com o encontro no set do quente Srº e Srª Smith (2005) chegava ao fim uma década depois com um reencontro no set do frio À Beira-Mar (2015). Escrito e dirigido por Angelina Jolie, o longa narrava as desventuras sentimentais de um casal em crise conjugal obrigado a enfrentar o passado num resort paradisíaco. Na época do lançamento, By The Sea (no original) passou em branco pelo público e foi recebido com pouco entusiasmo pela crítica. Com o anúncio do divórcio, porém, ficou impossível não associar o teor da película ao estado de espírito do casal, principalmente quando Brad Pitt, em uma corajosa entrevista, admitiu conviver, tal qual o seu personagem, com os problemas com a bebida. “Não me lembro de um dia, desde que saí da faculdade, em que não tenha bebido ou tenha fumado um baseado ou algo assim. E me dou conta de que são pacificadores, que estou fugindo dos meus sentimentos. Larguei tudo quando comecei minha família, menos a bebida, mas no último ano estava bebendo muito. Isso se tornou um problema”, revelou o ator à GQ Style. O estrago estava feito. Do alto dos seus 52 anos na época, Brad Pitt seguia popular, sua carreira (ao contrário do que acontece com a grande maioria vítima de dependência química) seguia sem um arranhão, mas agora ele estava sozinho. Sem sua família. Engolido por um delicado processo de divórcio. Desta vez ele perdeu. E muito.
Brad Pitt ao lado do diretor Steve Mcqueen celebram o Oscar de Melhor Filme por 12 Anos de Escravidão |
O ano de 2019, porém, promete ser
diferente para Brad Pitt. Após quase uma década com poucos projetos no universo
‘mainstream’, os trailers de Ad Astra e Era uma Vez em Hollywood mostraram um
astro aparentemente revigorado e preparado para brilhar. É o que esperamos. Com
a vida pessoal nos trilhos e muito a oferecer à Sétima Arte, Pitt pode até
achar que a indústria é pensada para os jovens, mas são poucos os atores na
atualidade capazes de atrair para os seus projetos um status como o seu.
Lançado no Festival de Cannes cercado de expectativas, Era Uma Vez em Hollywood
chega aos cinemas como o projeto mais imponente da sua filmografia desde Guerra
Mundial Z (2013). Com um alcance de blockbuster, direção de Quentin Tarantino e
um elenco que parece reunir o melhor que Hollywood nos ofereceu nas últimas
cinco décadas, o longa traz de volta o “velho novo” Brad Pitt, uma estrela
capaz de liderar grandes produções. Do alto dos seus 55 anos, o ator, segundo o
próprio Tarantino, deu ao projeto tudo que ele precisava para triunfar. “Eu
pensei que ele (Brad Pitt) seria ótimo nesse personagem porque eu precisava não
só de um ator fantástico, mas também de uma estrela de cinema e particularmente
de uma estrela de cinema como o Sr. Pitt, uma estrela de cinema que eu acho que
o público gosta de assistir. Como um Steve McQueen ou alguém – que você gosta
de vê-lo. Você gosta de ver o jeito que ele se move, você gosta de ver o jeito
que ele dirige. Essa qualidade legal e masculina que uma estrela de cinema pode
ter - ele tem”, confessou Tarantino. E ele não deixa de ter razão. Mesmo
exposto, julgado, admirado e\ou questionado, Brad Pitt segue sendo Brad Pitt.
Magnético, talentoso, versátil, falho. Um homem que, por trás da sua indiscutível
beleza, esconde uma aura reconhecível. E após tanto tempo vivendo dentro de uma
casca, a do símbolo sexual, a do marido perfeito, a do astro bem-sucedido, ele
parece finalmente disposto a expor a verdade, a desmistificar as coisas, a se
tornar o astro que sempre sonhou ser. Uma estrela talvez mais discreta, mas não
menos radiante.
2 comentários:
Ótimo artigo!
Valeu Priscila, obrigado pela visita e pelo elogio.
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