quinta-feira, 3 de novembro de 2016

Versátil e audaciosa, Tilda Swinton mostra mais uma das suas facetas em Doutor Estranho


Ela já foi um homem, um anjo, uma feiticeira e agora será um ancião. Uma das estrelas do mais novo lançamento da Marvel, o lisérgico Doutor Estranho (leia a nossa opinião aqui), a talentosa Tilda Swinton escreveu o seu nome em Hollywood com uma filmografia eclética, sólida e absolutamente singular. Reconhecida por sua aparência andrógina, a expressiva atriz inglesa parece se reinventar a cada lançamento e consegue transitar entre os mais variados gêneros sem nunca perder o frescor. Dona de uma perceptível inquietude criativa, Swinton merece ser considerada uma espécie de camaleoa do cinema atual, uma interprete capaz de elevar o nível dos seus projetos independente do nível de excentricidade dos seus personagens. Aproveitando a estreia de Doutor Estranho, a mais nova aposta da Marvel Studios, conheça um pouco mais sobre a carreira desta fascinante atriz britânica.

Tilda Swinton em Eduardo II (1991) e Orlando: A Mulher Imortal (1993)
Nascida em Londres, em 1960, Tilda Swinton estreou nos cinemas aos 26 anos no drama Caravaggio (1986), uma cinebiografia sobre o célebre pintor italiano Michelangelo Merisi. Sob a batuta de Derek Jarman, que viria a se tornar um dos seus maiores parceiros profissionais, a atriz ganhou um papel de destaque ao interpretar Lena, a namorada do artista. Juntos, Jarman e Swinton lançaram nos anos seguintes os independentes Crepúsculo do Caos (1987) e O Jardim (1990), além da versão moderna do drama histórico Eduardo II (1991). Neste último, aliás, ela interpretou a Rainha Isabel da França, dando a personagem uma aura excêntrica e completamente atual. Já reconhecida dentro do circuito de arte inglês, Tilda Swinton cruzou o caminho das grandes premiações ao protagonizar o drama Orlando: A Mulher Imortal (1993). Indicada ao Bafta, o Oscar do Cinema Britânico, a atriz mostrou a sua capacidade de "sumir" dentro dos seus personagens ao interpretar um nobre amaldiçoado obrigado a permanecer para sempre jovem. Dirigido por Sally Potter, o longa deu a Swinton a possibilidade de explorar as suas múltiplas facetas, principalmente por abordar a questão da transexualidade sob um autoral ponto de vista.

Swinton como o anjo Gabriel em Constantine (2005)
Após uma fase mais experimental, a atriz voltou aos holofotes no lisérgico A Praia (2000). Num coprodução USA\UK, o longa dirigido por Danny Boyle (Extermínio) deu a Tilda Swinton a possibilidade de dividir a tela com o ascendente Leonardo DiCaprio e a colocou de vez no radar de Hollywood. Na trama, ela ficou com a missão de interpretar a enigmática Sal, a líder de um grupo de hippies que vivia à margem da sociedade numa isolada e paradisíaca ilha tailandesa. Um ano depois, já nos EUA, Swinton conquistou a sua primeira indicação ao Globo de Ouro no drama Até o Fim (2001), onde deu vida a uma mãe atormentada por um crime envolvendo o namorado do seu filho. Bem recebida pela indústria norte-americana, a atriz emplacou uma série de exitosos trabalhos no cenário 'indie' norte-americano, conquistando um merecido destaque no curioso Vanila Sky (2001), no aclamado Adaptação (2002) e no esnobado Impulsividade (2005). Sem medo de se reinventar, Tilda Swinton decidiu "passear" pelo fantástico mundo dos blockbusters ao interpretar o andrógino anjo Gabriel no subestimado Constantine (2005). No seu primeiro papel direcionado ao grande público, a atriz roubou a cena ao criar um(a) antagonista imponente e repleto de personalidade, se tornando um dos acertos do divertido trabalho do diretor Francis Lawrence.

Swinton alcança a popularidade com a Feiticeira em As Crônicas de Nárnia (2005)
Ainda em 2005, Tilda Swinton alcançou o status mais popular de sua carreira em As Crônicas de Nárnia: O Leão, A Feiticeira e O Guarda-Roupa. Novamente com um tipo exótico em mãos, uma figura fria de aparência gélida, a atriz inglesa se tornou um dos pilares desta elogiada adaptação, garantindo um lugar de destaque no universo da fantasia num momento em que as atenções pareciam completamente voltadas para o fenômeno Harry Potter. O auge da sua carreira, porém, chegaria dois anos mais tarde. Após receber elogios da crítica por seu trabalho no denso Despertar de Um Crime (2006), Tilda Swinton conquistou a Academia de Artes e Ciências Cinematográfica ao levar o Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante por seu incrível trabalho em Conduta de Risco (2007). De cara completamente limpa, a atriz inglesa mostrou a sua reconhecida intensidade ao interpretar uma obstinada conselheira disposta a tudo para defender os escusos interesses da empresa para qual trabalha. Após levar o Oscar, Swinton decidiu seguir transitando entre os gêneros, independente do tamanho dos seus personagens e do alcance dos seus filmes. A atriz voltou ao mágico mundo de Nárnia em O Príncipe Caspian (2008), estrelou o independente Julia (2008), esteve entre os coadjuvantes dos elogiados Queime Depois de Ler (2008) e O Curioso Caso de Benjamin Button (2008) e protagonizou o drama italiano Um Sonho de Amor (2009).

Swinton brilha em Amantes Eternos (2013) e O Expresso do Amanhã (2013)
Um dos papéis mais espinhosos da sua carreira, no entanto, surgiria no chocante Precisamos Falar sobre Kevin (2010). Numa das atuações mais corajosas de sua carreira, Swinton adiciona humanidade à trama ao acompanhar a desafortunada jornada de uma mãe obrigada a enfrentar a problemática personalidade do seu filho. Recebido de maneira positiva pela crítica, o drama dirigido por Lynne Ramsay deu a atriz a sua segunda indicação ao Globo de Ouro. Após interpretar uma excêntrica assistente social no adorável Moonrise Kingdoom (2012), Swinton decidiu abraçar de vez as suas inúmeras facetas. Ao lado de Jim Jamursch, a atriz voltou a viver uma figura mais sombria no cult Amantes Eternos (2013). Dividindo a tela com o talentoso Tom Hiddleston, ela arrancou elogios eufóricos da crítica ao interpretar uma nostálgica vampira que decide voltar para casa ao perceber a derrocada do seu melancólico parceiro. Neste mesmo ano, Swinton roubaria também a cena ao interpretar uma espécie distorcida de Margaret Tatcher no excelente Expresso do Amanhã. Dirigido pelo criativo Joon-ho Bong (O Hospedeiro), o longa acompanha a jornada de um grupo de sobreviventes do apocalipse glacial que encontrou refúgio numa sociedade desigual estabelecida dentro de um trem. Envelhecida e performática, Tilda Swinton deu um verdadeiro show ao interpretar uma nefasta "primeira ministra", a mulher responsável por manter a ordem entre as castas dentro deste cenário distópico.
Swinton surge envelhecida em O Grande Hotel Budapeste e radiante em Descompensada
Com uma carreira totalmente estabelecida em Hollywood, Tilda Swinton seguiu surpreendendo o público. Após fazer uma impagável aparição no instigante O Teorema Zero (2013), um dos pirados trabalhos do inventivo Terry Gillian (Os Doze Macacos), ela surgiu completamente envelhecida no fascinante O Grande Hotel Budapeste (2014), do igualmente criativo Wes Anderson. Dando sequência a sua eclética filmografia, a atriz apareceu loira e afetada no divertido Descompensada (2015), voltou ao cinema 'indie' em A Piscina (2015) e fez parte do requintado elenco da comédia Ave, César! (2016). Neste meio tempo, porém, Swinton surpreendeu o público ao anunciar que iria voltar ao cinema pipoca e interpretar o mentor de Stephen Strange (Benedict Cumberbatch) em Doutor Estranho. Como de costume, os fãs mais intransigentes questionaram a mudança no gênero do Ancião, originalmente um homem, e a aparência nada oriental da personagem. No centro das polêmicas, Swinton diz enxergar neste projeto a possibilidade de levantar uma bandeira em prol da diversidade étnica e também de gênero dentro de Hollywood.

Tilda Swinton volta ao cinema pipoca em Doutor Estranho
"O filme da Marvel se desvia do material de origem de várias maneiras. E, como uma artista que trabalhou desde o início dentro de uma estética não convencional, sei como é sempre bem vinda a urgência de representatividade. (...) A escolha deles (produtores) foi positivamente diversa: O Ancião deste filme nunca foi visto como um velho tibetano como nos quadrinhos. O Barão Mordo, um cara caucasiano e vindo da Transilvânia, é interpretado por Chiwetel Ejiofor. Benedict Wong tem um papel significante como Wong, que é um personagem bem menor nos quadrinhos", frisou Swinton. Além disso, a atriz parece torcer para que títulos como este modifiquem o modo de pensar desta camada mais resistente do público. "Existem algumas pessoas que não gostaram dessas mudanças, mas eu tenho esperança de que quando assistirem ao filme, elas vão entender como esses detalhes equilibram tudo. Enquanto isso, vamos lutar pela maior variedade no cinema e na vida. Estamos ansiosos para ver o primeiro herói gay da Marvel nos cinemas. Tomara que isso seja apenas uma questão de tempo", disse a atriz em entrevista à Out Magazine. O fato é que graças à audácia e ao experimentalismo de nomes como os de Tilda Swinton, essas barreiras parecem cada vez mais transponíveis. 

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