segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

O Destino de Júpiter

Bebendo da fonte de alguns populares Sci-Fi, longa promove uma exótica crítica ao consumismo

Desde o estrondoso sucesso do cultuado Matrix (1999), um longa que foi bem além do seu pioneirismo visual ao levantar questões filosóficas sobre o então crescente mundo virtual, os irmãos Andy e Lana Wachovski ficaram reconhecidos por entregarem projetos que não se revelam apenas uma simples fonte de diversão. Buscando ir além das sequências explosivas, das cidades futuristas, dos efeitos especiais espetaculares e das aceleradas cenas de ação, a dupla de realizadores parece não se contentar com personagens lineares em missões vazias, procurando promover em seus trabalhos algum tipo de reflexão sobre o mundo moderno e a nossa realidade. Foi assim no desfecho da trilogia estrelada por Keanu Reeves, no psicodélico Speed Racer (2008), no subestimado A Viagem (2012) e agora no exótico O Destino de Júpiter. Flertando diretamente com as mais populares fórmulas dos blockbusters, no melhor e no pior sentido, os Wachovski constroem através de uma trama simples, do esforço da dupla Channing Tatum e Mila Kunis e do visual (no mínimo) excêntrico uma bem vinda crítica ao consumismo desenfreado da nossa sociedade.


"O tempo é o nosso bem mais precioso". A partir desta frase dita por uma das líderes de uma nobre família alienígena, o argumento assinado por Andy e Lana é eficiente ao questionar a nossa postura egoísta diante da saúde do planeta Terra. Abrindo mão dos discursos piegas ou dos clichês eco ambientais, o argumento é inesperadamente perspicaz ao inverter as situações, mostrando a insensatez das nossas atitudes ao nos colocar como um produto, uma espécie de petróleo para os alienígenas. Explorando estes questionamentos através de uma trama universal, o longa acompanha a rotina de Júpiter (Kunis), uma jovem faxineira que dia após dia admite odiar a sua rotina. Sem qualquer tipo de luxo, ela vê a sua vida virar de cabeça para baixo quando descobre fazer parte de uma linhagem real extraterrestre e que o planeta Terra é seu por direito. Perseguida pelo tirano príncipe Balem (Eddie Redmayne), que deseja a sua morte para ter livre acesso ao nosso planeta, Júpiter encontra no misterioso caçador de recompensas Caine (Tatum) a única ajuda para evitar que os terráqueos sejam dizimados.


Por mais que o roteiro se mostre realmente genérico, recheado de clichês, de diálogos oscilantes e de personagens rasos, é na reflexão proposta pelos irmãos Wachovski que o longa ganha contornos mais interessantes. Em meio ao maquiavelismo barato da trama central, o roteiro foge do lugar comum ao desenvolver esta crítica sobre o consumismo desenfreado, levantando questões que vão do esgotamento das fontes de energia natural até os perigos envolvendo a artificialização da vida. Além disso, num momento em que muito se discute sobre o estudo dos genes, o argumento utiliza esta premissa como base da trama, associando temas como a reencarnação à questões genéticas. Apesar da seriedade em torno destas discussões, no entanto, aqui os Wachovski abrem espaço para uma surpreendente dose de humor. Ainda que a estética excêntrica do longa indicasse algo mais escrachado, o herói do filme anda com uma espécie de patins espacial, a pegada cômica do longa é pontual, porém eficiente. Com destaque para a hilária cena em que os irmãos mostram que a burocracia - literalmente - é um problema universal. Por outro lado, o argumento falha ao desenvolver pontos básicos do arco central, pecando não só ao apostar num descartável interesse romântico, mas também ao não se aprofundar nos mistérios em torno do passado de Caine ou nas verdadeiras intenções dos caricatos antagonistas.


Sobre a questão estética, Andy e Lana não pecam pela omissão. Convidando o espectador para um passeio numa montanha russa visual, os irmãos usam e abusam das frenéticas sequências de ação, dos exóticos cenários e das inusitadas criaturas espaciais. Fazendo nítidas referências a longas como Guerra nas Estrelas, Jornadas nas Estrelas, O Quinto Elemento e Gravidade, os realizadores apostam numa improvável mistura de cores, efeitos digitais e de maquiagem para construir um versão "ostentadora" do universo. Em meio a naves espaciais douradas, planetas multicoloridos e roupas de couro - sim, elas voltaram - os Wachovski mostram a sua reconhecida perícia nas empolgantes cenas de ação, promovendo uma série de explosivos takes aéreos. Já com relação ao elenco, Channing Tatum e Mila Kunis demonstram uma interessante química, se esforçando para dar alguma dinâmica aos seus simplórios personagens. Ainda que a relação dos dois beire o previsível, eles funcionam principalmente nas cenas mais físicas e nos momentos mais bem humorados. O grande destaque do elenco, no entanto, fica pelo antagonista criado por Eddie Redmayne. À vontade na pele de um afetado tirano, o ator indicado ao Oscar por A Teoria de Tudo entrega a grandiloquência que o seu personagem pedia, deixando a impressão que o seu Balem merecia ter mais espaço na trama.


Contando ainda com espetacular presença do cultuado Terry Gillian (Os Doze Macacos), que, numa participação especial, protagoniza uma das sequências mais hilárias do longa, O Destino de Júpiter se apoia em fórmulas do cinema pipoca para promover algumas interessantes reflexões sobre a nossa existência enquanto sociedade. Apesar dos altos e baixos do roteiro e do visual ora espetacular, ora espalhafatoso, os irmãos(as) Wachovski ao menos fazem deste oscilante épico espacial um pertinente alerta envolvendo o perigo de tratarmos os recursos naturais como um mero produto.


2 comentários:

Anônimo disse...

Eu estava bastante esperançoso com este filme, mas depois das péssimas críticas que ando lendo, vou deixar este para o blu-ray mesmo.

http://filme-do-dia.blogspot.com.br/

thicarvalho disse...

Eu dei uma chance para os Wachovski, e até me surpreendi. Esperava que o longa fosse pior. Abs Kahlil.