terça-feira, 16 de novembro de 2021

Crítica | Com Tom Hanks inspirado, "Finch" contorna a previsibilidade ao usar um coming of age robótico para expor as falhas de programação da raça humana


Alguns filmes precisam de horas para desenvolver um personagem. A maioria sequer consegue. Finch, produção AppleTV estrelada por Tom Hanks, precisa de cinco minutos para conseguir isso. Com um olhar atento para a situação do personagem título dentro do cenário proposto, um mundo pós-apocalíptico em que a camada de ozônio ruiu e a temperatura chega na casa dos 100 °C, o longa dirigido por Michael Sapochnick enxerga além do reconhecido senso de humanidade do astro norte-americano para estabelecer a natureza deste protagonista.

Ver o sobrevivente lutando para trazer o seu cão robô para dentro da casa durante uma tempestade é o bastante para criarmos um elo de empatia com ele. Um vínculo forte alimentado por uma trama que, embora familiar, foge do lugar comum ao usar um coming of age robótico para estudar as falhas de programação da raça humana. O grande mérito de Finch está na maneira com que Sapochnick contorna a previsível estrutura narrativa buscando no cenário os ingredientes para tornar o desespero do protagonista convincente aos olhos do público. Finch está doente. O mundo está contaminado. O armário de comida vazio diz tudo. O road movie, aqui, conduz ao apocalipse humano. O que torna tudo mais denso. O humor logo é abreviado pelo drama. As lições lúdicas logo ganham um caráter urgente. Os erros logo geram consequências.

Disposto a proteger o futuro do seu grande amigo, o leal cão Goodyear, Finch cria um robô humanóide, o proativo Jeff (voz de Caleb Landry Jones, hilário), para evitar que o animal ficasse desamparado com a sua morte. Uma abordagem até certo ponto previsível elevada por uma direção cuidadosa ao estudar as emoções em torno desta curiosa passagem de bastão. Em Finch, a estrada é curta para tantos ensinamentos. Consciente disso, Miguel Sapochnick recorre à potência dramática de Tom Hanks para maximizar tanto as passagens mais leves, quanto as mais intensas. A ideia de usar a jornada de amadurecimento de um robô como lupa para os nossos desvios conduz a trama para uma zona cinza que torna tudo mais complexo.

Jeff precisa aprender a ser humano com um personagem que renegou a sua humanidade. O longa flerta com questões sombrias ao estabelecer a natureza individualista do protagonista. Finch não busca sobreviventes. Ele os teme. A aversão dele ganha ares esclarecedores à medida que enxergamos a responsabilidade humana naquele contexto. "A fome transformou pessoas em assassinos, mas fez de mim um covarde", diz o protagonista ao lembrar de uma passagem trágica da sua experiência. O homem que ensina o que é confiança perdeu a capacidade de confiar. Uma contradição que, por sinal, merecia um desenvolvimento mais aprofundado. Uma opção limitante que enfraquece o estudo sobre o meio.

Por outro lado, Finch comove ao buscar na estrada as lições que norteiam o processo de humanização de Jeff. Nos momentos em que tira o pé do acelerador (as sequências externas são enervantes), Sapochnik extrai a verdade (algumas até indigestas) do amargor do errático mentor. O vazio, aqui, tem peso. Os ensinamentos carregam consigo uma dose de desilusão. A existência humana é associada à toxicidade. O carismático robô traz consigo uma pureza expressiva que contrasta com o meio. Finch ensina na busca por uma esperança. Uma lição sólida, por vezes divertida, por vezes previsível, mas nunca desconectada da realidade.

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