quarta-feira, 6 de fevereiro de 2019

Crítica | A Pequena Casa Rosa

Uma mulher contra o Sistema

Com base numa comovente história de luta e injustiça, A Pequena Casa Rosa (Little Pink House, no original) é uma daquelas produções minúsculas que não deveriam passar despercebidas. Inspirado em indignantes fatos reais, o longa dirigido e roteirizado por Courtney Balaker dá uma importante voz aos reprimidos ao recriar a dolorosa luta de uma mulher comum pelo direito de manter a posse sobre a sua querida casa. Mais do que simplesmente expor a face mais vil e predadora do sistema capitalista, o drama estrelado pela talentosa Catherine Keener cativa ao se encantar pelo elemento humano por trás da batalha de um brioso grupo de moradores de uma pequena cidade operária contra o poder devastador da iniciativa privada.

Embora flerte com o teor caricatural no que diz respeito aos personagens "opressores", vide a afetada antagonista interpretada por Jeanne Tripplehorn, Courtney Balaker compensa ao tornar tudo o mais verdadeiro possível quando o assunto é o drama dos moradores diante da iminência do despejo sumário. Através do olhar simples da valente Susette (Keener), uma paramédica que encontrou na sua pequena casa rosa a paz para superar um divórcio, a realizadora é cuidadosa ao investigar o impacto da injustiça em uma comunidade até então esquecida pelo poder público. Sem grandes firulas estética e\ou narrativas, ela investe numa abordagem sem filtros, por vezes nua e crua, expondo os danos morais\pessoais\emocionais na rotina de indivíduos que viu o seu lar ruir de uma hora para outra.


Por mais que Catherine Keener desfile a sua reconhecida sensibilidade na construção de uma mulher independente capaz de desafiar o sistema na luta pelo que é seu, o grande mérito de Courtney Balaker está no cuidado com que ela usa a sua obra para ouvir o cidadão comum. Para expor com sutileza o impacto da desapropriação sob a perspectiva de idosos, de pessoas que na fase mais vulnerável da sua existência viram o esforço de uma vida ser tomado pelo Estado sem grandes justificativas. O resultado são sequências desconcertantes capturadas com um forte senso de nobreza pelas lentes de Balaker. Vida a realística cena da demolição e a maneira com que a diretora traduz a força dos personagens mesmo em meio a uma situação dilacerante. Além disso, por mais que o já citado viés maniqueísta salte aos olhos quando o assunto fica pela construção dos personagens relacionados ao Estado, o argumento compensa ao revelar o jogo sujo dos bastidores, ao investigar a verdade por trás das promessas vazias de cunho social, culminando num desfecho duro capaz de se entristecer pela situação enfrentada pelos moradores sem deixar de reverenciar os frutos conseguidos por eles após uma árdua batalha judicial.


Enfim, com personagens humanos, uma premissa naturalmente empática e uma visão realística sobre a desprotegida posição do indivíduo perante as grandes corporações, A Pequena Casa Rosa encanta ao valorizar o poder da comunidade, ao defender sem um pingo de pieguice a tese do "juntos somos mais fortes". Uma mensagem singela e edificante que surge como um sopro de esperança num momento em que o individualismo parece sempre falar mais alto. 

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