Um dos pilares da retomada dos filmes de super-herói, a 20th Century Fox
volta a atestar a sua veia vanguardista com o magnífico Logan. Embora a
dobradinha Marvel\Disney "domine" o gênero com produções rentáveis,
qualificadas e um universo engenhosamente arquitetado, a o estúdio segue se
mantendo a frente da concorrência quando o assunto é a ousadia. Enquanto a
poderosa parceria Warner\DC segue patinando na tentativa de reencontrar a sua
voz própria, a Fox parece ter aprendido com os seus erros recentes, entenda
Quarteto Fantástico (2015), e tem se livrado cada vez mais das amarras
criativas. Por mais que o universo regular dos X-Men siga enfrentando os seus
altos e baixos, o fato é que a Fox voltou a se tornar relevante com os
arriscados Deadpool (2016) e Logan (2017), duas obras autorais que resgataram a
vocação pioneira do estúdio.
Na verdade, se hoje temos uma vasta gama de produções inspiradas em
histórias em quadrinhos, isso se deve basicamente ao vanguardismo da Fox.
Embora a Warner\DC tenha enxergado o potencial por trás do até então
subaproveitado segmento com títulos do quilate de Superman (1978), Superman II
(1981), Batman (1989) e Batman: O Retorno (1992), a "casa" do
Universo Mutante da Marvel nos cinemas foi a única que soube tirar o gênero do
fundo do poço após o questionável Batman Eternamente (1994) e o desastroso
Batman e Robin (1997). Num cenário em que o subestimado Blade (1998) surgia
como a única fonte de dignidade quando o assunto eram as adaptações das HQ'S,
os produtores Lauren Shuler Donner, Ralph Winter e Avi Arad resolveram resgatar
a credibilidade do gênero com o realista X-Men (2000). Indo de encontro ao tom
cartunesco das últimas produções da Warner, a Fox resolveu apostar numa
refrescante veia realística, respeitando a essência questionadora da obra da
dupla Stan Lee e Jack Kirby ao dialogar com temas como o preconceito, a crise
de identidade e o respeito às diferenças. Com Hugh Jackman como Wolverine, uniformes discretos e personagens habilmente adaptados, X-Men
conquistou rapidamente o coração dos carentes fãs do gênero, se
tornando um indiscutível sucesso de público e crítica. Impulsionado pelos US$
296 milhões faturados ao redor do mundo, o longa dirigido por Bryan Singer
rendeu duas continuações e se tornou a mola mestra para a reafirmação do
segmento. Tanto que, paralelamente ao lançamento do excelente X-Men 2 (2003) e
do exagerado X-Men: O Confronto Final (2005), surgiram outros importantes
representantes do gênero, entre eles os elogiados Homem-Aranha (2002),
Homem-Aranha 2 (2004), Batman Begins (2005) e Homem de Ferro (2008).
Os anos se passaram e, numa realidade diferente, a Fox se viu obrigada a
renovar. Após o genérico Quarteto Fantástico (2005), o "apenas"
eficiente Quarteto Fantástico e O Surfista Prateado (2007) e o injustificável
X-Men: Origens - Wolverine (2009), os executivos do estúdio tiveram que repensar a sua estratégia. Pressionada pelo retumbante sucesso de Batman: O
Cavaleiro das Trevas (2008) e pela crescente presença da então Marvel Studios,
a Fox resolveu "resetar" a sua própria franquia com o enigmático
X-Men: Primeira Classe (2011). Um fato novo dentro do gênero, o processo de
produção do longa foi cercado de perguntas. Enquanto a maioria dos fãs do
segmento parecia ter as atenções voltadas para os aguardados Batman: O Cavaleiro
das Trevas Ressurge (2012) e Os Vingadores (2012), os produtores Bryan Singer,
Lauren Shuler Donner, Simon Kinberg e Gregory Goodman tiravam do papel um
projeto igualmente ousado. Inicialmente, porém, o filme se viu esquecido em
meio ao hype em torno dos dois blockbusters citados cima. Os primeiros trailers
não empolgaram, a campanha de marketing foi questionada e o reboot não parecia
fazer muito sentido para os fãs da trilogia original. Que engano! Sob a batuta
do criativo Mathew Vaughn, Primeira Classe causou uma enorme surpresa ao se revelar o melhor filme do Universo Mutante da Marvel nos Cinemas. Com um
poderoso elenco, empolgantes sequências de ação e um inédito tom
contextualizado, o filme estrelado por Michael Fassbender, Jennifer Lawrence e
James McAvoy dialogou com importantes questões históricas ao revelar o inicio
deste popular supergrupo. O resultado, obviamente, não poderia ser outro. Embora não tenha alcançado o sucesso comercial dos seus concorrentes, a
produção foi recebida com entusiasmo pela crítica, rendeu duas empolgantes
continuações (X-Men: Dias de um Futuro Esquecido e X-Men: Apocalipse) e
comprovou que a Fox tinha a ousadia necessária para se reinventar. Fica a lição
Warner.
A vocação vanguardista da Fox, entretanto, seria novamente atestada no
arriscadíssimo Deadpool. No projeto "da vida" do astro Ryan Reynolds,
o mercenário desbocado surgiu num momento (novamente) complicado para o
estúdio. Uma das principais apostas da Fox, o reboot de O Quarteto Fantástico
foi um fracasso retumbante, muito em função da pesada influência dos executivos
sobre o trabalho do diretor Josh Trank. Detonado por público e crítica, o longa
ligou o sinal de alerta e tornou a missão de Reynolds bem mais difícil. Disposto a apagar da nossa memória a imagem do personagem no bombardeado
X-Men: Origens (2009), o ator\produtor peitou os executivos da companhia, lutou
pela liberdade criativa e ousou ao exigir classificação etária elevada. Envolvidos na confusa pós-produção do novo quarteto, os executivos deram o
aval, mas com restrições orçamentárias. Com um orçamento modesto para as
produções do gênero, cerca de US$ 58 milhões, Reynolds tirou do papel então o
cínico Deadpool, uma comédia violenta sobre a jornada de vingança de um verborrágico
anti-herói. Por mais que o uso de humor no segmento não fosse uma novidade, vide
Guardiões da Galáxia (2014), o longa dirigido por Tim Miller subverteu a
estrutura do gênero ao investir numa narrativa não linear, num sagaz senso
cômico e em brutais sequências de ação. Além da constante quebra da quarta
parede, Reynolds apontou a sua mira para o universo super-heróico, rindo das
suas próprias falhas ao zoar, dentre outras coisas, a sua primeira aparição
como o mercenário tagarela e o desastroso Lanterna Verde (2011). Impulsionado
por uma inventiva campanha de marketing, Deadpool se tornou a maior bilheteria
da história do Universo Mutante da Marvel, comprovando que as produções com
classificação etária elevada poderiam fazer sucesso dentro do
segmento.
Após resgatar o status do gênero em X-Men (2000), se reinventar em
X-Men: Primeira Classe (2011) e apostar alto no cômico Deadpool (2016), a Fox
elevou o patamar dos filmes de super-heróis com o intimista Logan. Mais do que
investir num filme de ação voltado para o público adulto, o diretor James
Mangold finalmente deu a Hugh Jackman o filme que ele e o anti-herói Wolverine
mereciam. Numa proposta completamente inédita dentro do gênero, os produtores
Hutch Parker, Lauren Schuler Donner e Simon Kinberg investiram num produto
novo, uma releitura pessoal e corajosa. Um dos principais pilares do Universo
Mutante da Fox, o astro australiano surgiu frágil e desgastado, uma sombra do
herói construído ao longo da franquia. Com uma pegada faroeste, Mangold extraiu
a realidade por trás dos episódios apresentados na saga, as consequências de
uma vida devotada aos superpoderes, se encantando pelo homem escondido no mito.
Além de apostar num cenário desesperançoso, o realizador investiu numa
linha narrativa mais particular, quase 'indie', equilibrando drama, violência e humor ao traduzir a deterioração física do mutante e a sua profunda relação
com a feroz X-23. Com a força necessária para transpor as barreiras deste
escapista gênero, Logan comprovou que é possível construir uma obra densa sem
abdicar do potencial do entretenimento. Prova disso é que, em apenas dez dias,
o filme já faturou mais de US$ 438 milhões ao redor do mundo, números
expressivos para uma produção "direcionada" para um público
específico. Dito isso, embora a dobradinha Marvel\Disney, atualmente, dite as
"regras do jogo" com o seu rico e bem sucedido universo
cinematográfico, a Fox segue dando a sua decisiva colaboração quanto aos filmes
de super-heróis, se consolidando como o estúdio que, nos momentos de maior
adversidade, foge da mesmice e continua arriscando dentro deste concorrido segmento.
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