quinta-feira, 30 de setembro de 2021

Crítica | "Idealizado" por uma mente delirante, "O Menino que Matou meus Pais" é cinema construído na base da omissão e da apatia


O que esperar de uma obra que, à rigor, foi idealizada por Suzane von Richthofen? O Menino que Matou Meus Pais é um filme covarde. É pura esquizofrenia cinematográfica sustentada por uma versão delirante abordada com desconfiança. Nada justifica tamanho desdém narrativo, dramático e estético. É constrangedor ver a incapacidade do longa dirigido por Maurício Eça em desenvolver algo próximo de um filme aqui. O que nós vemos é uma transcrição imageticamente apática de um depoimento. Os roteiristas não parecem sequer preocupados em arquitetar uma trama em torno da visão de Suzane sobre os fatos. Alguns personagens surgem aleatoriamente. Outros mudam de atitude de uma cena para outra. Os diálogos são "reinterpretados" com descuido. 


Eça sacrifica elementos básicos na construção fílmica numa engessada tentativa de refutar a versão de Daniel. Ao contrário de A Menina que Matou os Pais (uma produção coesa dentro da sua questionável proposta), a 'Suzane cut' não insinua nada, não desenvolve nada, não oferece nada que já não estivesse no perfil da Wikipédia. É só vocês irem lá conferir… No maniqueísta mundo colorido apresentado, a assassina era a jovem perfeita, filha da família perfeita, tentada pelo namorado a matar os pais. Mesmo diante da escassez de material, Eça, outra vez, se recusa a pensar o caso. O diretor julga a versão dela. Só isso explica o desdém narrativo. 


O Menino que Matou Meus Pais se sustenta em escolhas ofensivas. A forma moralista com que o filme explora o uso das drogas é vergonhosa. O que falar então da maneira contraditória com que o longa aborda o abuso sexual e as sequelas de um relacionamento tóxico? Eça é incapaz de tratar com seriedade os desdobramentos de uma gráfica cena de estupro. Poucos minutos depois ele está lá "explorando" as curvas de uma desinibida Suzane com fins meramente fetichistas. Pobre Carla Diaz… O show de overaction no fim só não é mais inacreditável do que a tentativa do cineasta em estilizar aquela que deveria ser a passagem mais pesada da obra. O Menino que Matou Meus Pais é uma "sabotagem fílmica". Uma obra que não funciona como peça de ficção, nem como documento da realidade, muito menos como o tenso retrato de uma mente perturbada. Um filme que não se valida por um segundo sequer.

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