quarta-feira, 6 de janeiro de 2021

Crítica | Tenet

Pense menos, se divirta mais

Tenet é uma ideia. Um conceito intrigante sustentado num roteiro cafona e sentimentalista cujo elemento mais plausível é a fantasiosa "reversão temporal". O diretor Christopher Nolan "sequestra" a atenção do espectador com um plot raso e cheio de furos incapaz de desenvolver minimamente os seus protagonistas. É inaceitável ver como o longa sacrifica tudo em prol de uma mera trucagem visual. Não existe espaço para a construção de personagem aqui. Nem tão pouco para a preparação de um arco dramático. Os protagonistas são rasos. As suas motivações tolas. A ação é construída na base da força. Faltam ideias convincentes para abastecer a trama. Nolan arquiteta a sua pretensamente genial ideia subestimando a inteligência do espectador a todo momento. Antes o problema fosse o didatismo. Um desvio narrativo que indica alguma lógica. Tenet não consegue explicar o inexplicável. Vários porquês ficam sem respostas. Qual a justificativa, por exemplo, para um agente da CIA colocar em risco uma missão que evitaria o fim do mundo para salvar uma mulher que ele conheceu há poucos dias? A explicação é até óbvia. O filme precisava acontecer! 

O roteiro não se preocupa nem em desenvolver algum traço de personalidade que justifique esse tipo de ato por parte do personagem. Tanto o Protagonista (John David Washington), quanto Neil (Robert Pattinson) não possuem identidade. São tipos ocos. Em A Origem, um thriller igualmente engenhoso (e sentimentalista), o personagem de Leonardo DiCaprio possui um denso background dramático. Você se importa por ele. Você torce por ele. Em Tenet é impossível criar qualquer elo com os personagens. O que não seria um problema se Christopher Nolan dedicasse tudo a ação. Mas não. A cansativa primeira metade de Tenet se escora basicamente na relação de desconfiança entre os agentes, um caricato traficante de armas ucraniano (sério?) e a sua sofrida esposa. Um plot digno dos filmes B de ação dos anos 80\90. Daqueles estrelados por Chucky Norris e Steven Seagal. Nem o talentoso elenco consegue elevar o nível do paupérrimo texto. A exceção fica para Robert Pattinson que, ao menos, confere um charme inconsequente ao seu Neil. Isso até o cineasta tentar explicar o motivo dele agir assim...

Nada faz muito sentido aqui. Quanto mais você se esforça para entender Tenet, menos a experiência fica divertida. O que impede o thriller Sci-Fi de ser um desastre, ne verdade, é o virtuosismo técnico do cultuado diretor. Tudo o que falta ao script, sobra ao mise en scene. Embora, no fim, o plot se resuma a viagem no tempo do tipo convencional, o inventivo conceito de reversão traz algo minimamente novo ao gênero. É possível até relevar a falta de lógica narrativa quando Tenet pisa no acelerador e entrega cenas realmente empolgantes. A segunda sequência envolvendo a explosão do avião, em especial, é magnífica. Aqui as poucas peças que se encaixam revelam o potencial subaproveitado da obra. Uma virtude que precisa ser dividida. 

A engenhosidade de Christopher Nolan na direção é incrementada pelos contrastes visuais criados pela elegante fotografia de Hoyte Van Hoytema, pelo minucioso design de som e principalmente pela pulsante trilha sonora industrial de Ludwig Göransson. É impressionante ver como ele alia ruídos pesados aos riffs sintetizados para criar uma composição enervante. O único elemento inquestionável da produção. Equivocado em diversos aspectos, vide a esquizofrênica montagem, Tenet é um blockbuster descerebrado disposto a conquistar o público com estímulos visuais vazios e muita pirotecnia. Acostumado a "brincar" com a estrutura narrativa\temporal das suas obras, Nolan derrapa nas suas pretensões ao tentar extrair o realismo de uma premissa escrachadamente fantasiosa. Um thriller confuso e dispersivo com um frustrante (eu diria frustrado) quê revolucionário.

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