quinta-feira, 25 de junho de 2020

Crítica | 7500

O (anti) herói

Um piloto americano se torna a última linha de defesa do seu avião quando um grupo de terroristas invade um voo internacional. Você provavelmente já viu esse plot em alguma outra produção. Nunca desta forma. Uma experiência sensorial única, 7500 trata a realidade como o seu grande objetivo. Esqueça o clichê do herói ‘yankee’ que salva o dia no melhor estilo John McClane. O diretor Patrick Vollrath renega qualquer flerte com o escapismo ao fazer do naturalismo o grande diferencial. Aqui, assim como o protagonista, nós somos reféns da realidade. 

Deixemos os predicados técnicos de lado neste primeiro momento. Poucos filmes de sequestro prezaram tanto pela verossimilhança quanto 7500. Tudo é assustadoramente real. A tensão nasce do choque, da impotência, da necessidade de se fazer escolhas difíceis. Embora ambientado praticamente todo num mesmo cenário, o longa é categórico ao tratar todas as nuances de um sequestro com propriedade e pulso narrativo. O roteiro assinado pelo próprio diretor, ao lado de Senad Halilbasic, devota tanto a construção desta dilacerante experiência que chega a sacrificar a construção fílmica. Estamos diante de uma obra que não se prende a estrutura de atos. Na vida real não existe espaço para um clímax tradicional. As coisas simplesmente acontecem. Um segundo é tempo o bastante para decidir quem vive e quem morre.

Consciente disso, Patrick Vollrath é inteligente ao extrair o drama das reações dos personagens e, a partir delas, desenvolver a trama. Enquanto foca nas desventuras do piloto, o intenso Tobias, o cineasta é cuidadoso ao criar um literal (anti) herói. Seus atos são pragmáticos. Seu método de agir totalmente condizente com as normas de conduta de um comandante diante desta situação. Numa performance robusta, Joseph Gordon-Levitt assombra ao deixar se levar pela tensão\pavor naturalmente. Por mais que o roteiro aposte numa clara facilitação narrativa afim de potencializar o seu drama, ela se torna irrelevante perante da entrega do ator. Mais do que se sentir empatia é possível experimentar a sua dor, a sua raiva, a sua fragilidade. Ele torna todo o processo genuinamente excruciante. Um olhar humano que, para a minha surpresa, se reflete também na perspectiva dos terroristas. O caos e o horror do sequestro não impedem que Patrick Vollrath rompa com outro clichê clássico do gênero: o dos terroristas unidimensionais. O realizador testa as expectativas do público ao realçar o desespero também dos algozes. A confusão. A alienação. O fanatismo em sua mais pura essência. 7500 trata o terrorismo como uma ameaça real e nada estereotipada. Nem as conveniências narrativas quanto a ação deles dentro da aeronave diminui o impacto da obra.

Uma construção dramática forte potencializada pelo triunfo técnico do longa. Impressiona o repertório do diretor Patrick Vollrath num cenário tão pequeno e escuro. O realizador constrói um ‘mise en scene’ sofisticado, capaz de extrair a tensão com um misto de simplicidade e virtuosismo. A iluminação incidental através de elementos como um monitor realça os sentimentos impressos nas feições dos personagens. Mesmo quando assume o caos, o cineasta o faz com um senso de compreensão muito claro. O melhor de 7500, no entanto, está no soberbo design de som. A construção da tensão parte muito do que o espectador ouve. A falta de fôlego, as batidas nas portas, os gritos, o barulho da chuva, os alertas do rádio. O som é opressor. O som nos suga para o cockpit. O som não só redimensiona a experiência sensorial, como também ajuda a tornar tudo mais claustrofóbico, imersivo e angustiante. O melhor filme de sequestro desde Capitão Philips (2013), 7500 causa uma aflição impar ao entender que não existe nada mais desesperador que a realidade.

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