Vocês não sabem como eu respeito
títulos como Predadores Assassinos. Eu cresci assistindo isso. Filmes que ao
longo de 80\90 minutos se esforçam para angustiar o espectador. Não é fácil
tirar este tipo de obra do papel. É preciso ter pulso narrativo. Ideias
originais. Personagens cativantes. Senso de imersão. Soluções
narrativas\visuais criativas. Um pacote de predicados que, indiscutivelmente,
estão presentes na mais nova produção de Sam Raimi (Evil Dead). Sob a batuta do
competente diretor Alexander Aja, o longa estrelado pela versátil Kaya
Scodelario causa um frisson natural ao narrar a jornada de sobrevivência de pai
e filha contra uma horda de famintos crocodilos. E isso em meio de uma
impiedosa tempestade. Ou você achou que seria fácil?
No papel, filmes como Predadores
Assassinos tendem a parecer simples. Um fiapo de trama já é o bastante para nos
colocar na posição dos identificáveis personagens. Consciente disso, o esperto
argumento assinado por Michael e Shawn Rasmussen é sucinto ao não perder tempo
demais quanto a construção da trama. Um furacão muda de direção e coloca em
ameaça uma região específica. Uma nadadora obstinada (Scodelario) é avisada
pela irmã que o pai das duas (Barry Pepper) estava incomunicável. Preocupada, a
jovem decide contrariar as interdições em busca do paradeiro dele. Ao chegar em
casa, ela é pega de surpresa ao descobrir o motivo do seu desaparecimento. Uma
construção de ‘plot’ rápida e rasteira, como um dos inúmeros letais crocodilos
que não demoram muito para tomar conta da história. Por mais que, a partir do
segundo ato, o argumento até tente preencher as brechas narrativas com um genérico
drama familiar, Alexandre Aja sabe o que o público quer ver. Ele sabe que a
jornada pela sobrevivência é a alma do negócio aqui. E é justamente isso o que
Predadores Assassinos tem de melhor a oferecer.
Até porque a simplicidade para no
roteiro. Antes mesmo da ação falar mais alto, o cineasta francês mostra
originalidade ao se apropriar de elementos clássicos dos filmes de Horror na
construção do imersivo primeiro ato. A simples busca da protagonista, a
resiliente Haley, já é suficientemente instigante. Digo mais, em menos de vinte
minutos Aja realça o valor de produção do longa. O cenário central, a degradada
casa em que pai e filha cresceram, se revela quase que instantaneamente um
daqueles ‘set pieces’ engenhosos. Um ambiente sujo, vazio e naturalmente
sinistro. A ameaça é da natureza, mas poderia facilmente ser uma assombração.
Um predicado valorizado pela direção “invasiva” de Aja. Ele nos coloca
realmente dentro de cenário. Seus sorrateiros planos\enquadramentos não só nos
coloca na perspectiva dos protagonistas, mas nos faz sentir o misto de
asco\dor\desespero deles. O que só fica mais claro quando o caos toma conta da
trama. Sem nunca se repetir, o realizador transforma limitação em clausura.
Cada espaço daquela casa é explorado. Como se não bastasse a ferocidade dos
crocodilos e o efeito devastador da tempestade, pai e filha a todo momento precisam
encontrar novas saídas, precisam tornar o impossível provável. O que poderia
ser um problema, porém, se torna uma virtude graças a criatividade de Aja em
explorar os clichês do subgênero.
Não se engane, Predadores
Assassinos segue uma cartilha bem reconhecível ao usar e abusar das
conveniências narrativas. É a fratura exposta que miraculosamente é esquecida.
É o corte que para de sangrar. É a mordida que destroça aqui, mas apenas
arranha acolá. Temos até a porta de box mais resistente da história do cinema.
Tudo isso, no entanto, se torna menor graças a inventiva direção de Alexandre
Aja e a tensão provocada por cada um destes momentos. Na sequência do banheiro,
por exemplo, o cineasta filma tudo do alto, de cima para baixo, tornando os
gestos de fugas da protagonista absolutamente imagéticos. Num todo, aliás, Aja
é astuto ao explorar a habilidade da nadadora Kayla em várias fases da
película. Com direito a pelo menos dois belos takes subaquáticos e a uma
empolgante “corrida” contra dois destes monstros subaquáticos. Nos momentos em
que decide traduzir a brutalidade dos animais, porém, o diretor faz jus ao seu
passado ao “abraçar” o gore sem medo de ser feliz. Eles são violentos, são
letais, são insaciáveis. No tabuleiro de Aja, os peões surgem para realçar o
tamanho do obstáculo que pai e filha precisarão enfrentar. O que só torna tudo
mais angustiante. Por outro lado, diante de tantos predicados, o grande
problema de Predadores Assassinos está no CGI das criaturas. Enquanto os
efeitos práticos são impressionantes, as sequências de enchente, por sinal, são
genuinamente sufocantes, o visual dos crocodilos por vezes deixa a desejar. Nas
sequências em que usa a câmera submersa, o acabamento dos “antagonistas” é bem
digno. Já nas passagens mais caóticas, por sua vez, as criaturas perdem peso. A
falta de dinheiro é óbvia. Aja, nitidamente, faz o possível para escondê-los sempre
possível. Ao menos o virtuoso uso da câmera subjetiva e o expressivo design de
som atenua estes deslizes.
Valorizando ao máximo a performance
física de Kaya Scodelario, que, mais uma vez, mostra que merece receber papéis
maiores em Hollywood, Predadores Assassinos é um filme de sobrevivência à moda
antiga. Sem piadinhas fora de hora, sem grandes momentos de alívio. Os
crocodilos são perigosos fora d’água e praticamente implacáveis dentro dela. Resta
aos personagens correr, lutar e juntar os pedaços. As vezes literalmente.
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