sábado, 7 de setembro de 2019

Festival de Veneza consagra Coringa e mostra que qualidade não escolhe gênero


Aclamado em sua sessão de estreia, o aguardado Coringa já fez história antes mesmo de chegar aos cinemas. Vencedor do Leão de Ouro de Melhor Filme no Festival de Veneza, o longa dirigido por Todd Phillips (Se Beber Não Case) e estrelado por Joaquin Phoenix surge como uma bem-vinda quebra de paradigmas. Embora, obviamente, Joker (no original) esteja longe de ser o primeiro filme de super-herói (ou super-vilão) com uma roupagem "artística", Batman: O Cavaleiro das Trevas e Capitão América: O Soldado Invernal não me deixam mentir, o triunfo do longa num festival deste porte mostra uma validação até então poucas vezes vistas dentro do universo blockbuster. Não que fosse preciso. De maneira alguma. Mas o elitismo que cerca o pretensioso circuito de arte sempre impediu que títulos como esse ganhassem o reconhecimento nas grandes premiações, nos grandes festivais. Só em 2017, por exemplo, o Festival de Veneza veio a premiar uma obra de alcance popular com o Leão de Ouro, no caso o triunfante A Forma da Água. Isso em 54 edições. A meu ver, uma tentativa tola de diminuir este "tipo" de produção. The Dark Knight, por exemplo, foi ótimo o bastante para triunfar no Oscar de Melhor Ator Coadjuvante com o saudoso Heath Ledger, mas não influente o bastante para conseguir uma indicação ao prêmio de Melhor Filme. Recentemente, Mad Max: Estrada da Fúria foi espetacular o bastante para "passar o rodo" nas categorias técnicas, mas não qualificado o bastante para bater títulos como o protocolar Spotlight 


O triunfo de obras como Coringa em Veneza, porém, só comprova que este cenário está mudando. A empáfia vem pouco a pouco sendo substituída pela busca por relevância fora de um nicho cada vez mais reduzida. O circuito artístico se vê cada vez mais pressionado. Num momento em que o negócio cinema anda tão em cheque, tão renovado pelo 'boom' dos serviços de streaming e pelo efeito dominante dos grandes blockbusters, não dá mais para fechar os olhos para o popular. Óbvio que a qualidade importa. E deve importar sempre. Mas títulos como Coringa trazem também o 'hype', trazem dinheiro, trazem repercussão. Ajudam a alimentar uma engrenagem que nunca esteve tão fragilizada. Neste aspecto, a edição 2019 do Festival de Veneza teve a coragem de fazer algo que outros grandes festivais relutam insistentemente: reconhecer a qualidade de um filme genuinamente "pipoca". Algo que, para os fãs de um bom blockbuster, tem sido muito recorrente nos últimos anos. Resta saber agora qual o efeito que esta retumbante conquista terá na trajetória da ousada nova aposta da dobradinha DC\Warner na temporada de premiações. Por mais que seja cedo demais para traçar qualquer prognóstico, nos últimos dois anos os vencedores do Leão de Ouro (A Forma da Água e Roma) conquistaram uma indicação ao Oscar de Melhor Filme. Algo que diz muito. Neste momento, porém, o frisson em torno da performance de Joaquin Phoenix (vide a montagem acima) me parece bem mais forte, o que o credencia a uma indicação entre os atores. Vamos aguardar. Numa fase tão nebulosa para o cinema nacional, aliás, a diretora Bárbara Paz viu o seu documentário Babenco: Alguém tem que ouvir o coração e dizer: parou conquistar o Prêmio da Crítica Independente no festival. 

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