Um pequeno “respiro” na carreira
de Josh Brolin, um ator versátil que, após “roer o osso” por décadas, emplacou
em 2018 títulos do porte de Vingadores: Guerra Infinita, Deadpool 2 e Sicario:
Dia do Soldado, Minha Primeira Caçada ri das raízes bélicas norte-americanas
numa debochada sátira familiar. Sem se levar a sério por um segundo sequer, o
longa dirigido por Jody Hill (O Policial Fora de Controle) cativa ao questionar
a precocidade infantil, invadindo o terreno dos ‘coming of age movie’ ao se
concentrar na disfuncional relação entre um popular caçador de veados brancos e
o seu cosmopolita filho. Uma obra simples e genuinamente engraçada que, embora
flerte com o sentimentalismo em alguns momentos, consegue contornar os seus
problemas graças a capacidade de Josh Brolin, Danny McBride e do surpreendente
Montana Jordan em ri de si mesmo.
Com roteiro assinado pelo trio John Carcieri, Danny McBride e pelo próprio Jody Hill, Minha Primeira Caçada é feroz ao debochar do popular arquétipo do ‘redneck’. O homem branco de origem humilde\interiorana e tradicionalista que valoriza a sua “liberdade”, o apreço pelas raízes e a importância dos ritos de passagens. Neste sentido, Buck Ferguson (Josh Brolin) surge como o símbolo desta “classe”. Protagonista de um singular reality show de caça, o rústico homem resolve se reconectar com o seu filho, o comunicativo Jaden (Montana Jordan), o levando para a sua primeira caçada. Entusiasmado com a oportunidade de reestabelecer este elo após o divórcio, Buck é pego de surpresa ao ter que lidar com a precocidade urbana do seu filho, convivendo com a sua rebeldia, a sua falta de tino como caçador e a influência do descolado padrasto (Scoot McNairy) enquanto tenta gravar um novo episódio para a sua série de TV.
Sem medo de apontar a sua mira
para as raízes da América, Jody Hill é astuto ao encontrar o humor por trás do
‘modus operandi’ do caçador sem o diminuir perante o público. Embora a sua debochada
crítica a prática da caça e a cultura das armas de fogo nos EUA seja cristalina,
o realizador consegue fazer do incoerente Buck um tipo gentil e cativante, um
homem bem-intencionado que, no seu habitat predileto, decide criar algum tipo
de paralelo com o seu filho. No embalo da impagável performance de Josh Brolin,
a vontade como um durão vulnerável à procura de admiração, Hill diverte ao
explorar o distorcido sendo de maravilhamento do caçador, realçando o fator
mais inusitado do seu “ganha-pão” com uma inspirada dose de ironia. A íntima
relação entre Buck e o seu câmera, o falastrão Don (Danny McBride), aliás, está
entre os pontos altos da trama, principalmente pela forma com que o argumento
explora o senso de camaradagem dos dois após anos dedicados às solitárias
caçadas.
Na transição para a segunda
metade da película, porém, ficou claro que Minha Primeira Caçada não se
sustentaria somente no “carão” de Brolin e no universo da caça. Ciente disso,
Jody Hill mostra habilidade ao ampliar o escopo da sua sátira, rindo, também,
da crescente precocidade juvenil ao mirar no pequeno Jaden e na disfuncional
relação entre pai e filho. De longe o personagem mais engraçado da película, o
adolescente com problemas amorosos é o porta-voz dos momentos mais inteligentes
do texto, principalmente quando Hill coloca expressões tipicamente adultas na
boca do arredio moleque. Entre o intransigente e o infantil, o promissor ator rouba
a cena com o seu estilo verborrágico, o seu carregado sotaque e o seu maduro
senso de humor, se tornando o contraponto perfeito para a figura de Buck.
Centrado nas rixas e nas diferenças entre os dois, o realizador é criativo ao
extrair o humor tanto da improvável interação entre pai e filho, quanto das
inesperadas reações do caçador diante do espevitado Jaden, rindo deste choque
de cultura\gerações enquanto reestabelece o sincero elo entre os dois. Quando
necessário, entretanto, é legal ver a delicadeza de Hill em abrir pequenas
brechas para o drama paternal, esbanjando franqueza ao colocar na mesa os motivos
por trás do distanciamento. Numa cena em especial, o diretor dá a Brolin a
oportunidade de expor a face mais humana do seu Buck, um momento de
vulnerabilidade encarado com peso por este eclético ator. Uma cena de
indiscutível beleza, inclusive esteticamente, que mostra o potencial
inexplorado do longa. Isso porque, na transição para o escapista desfecho, Hill
e os roteiristas se contentam em entregar um clímax aventureiro, abraçando o
descompromisso num último ato que, ao menos, segue sem se levar a sério.
Buscando referência em títulos
como o clássico Férias Frustradas (1983), Minha Primeira Caçada ri da
disfuncionalidade familiar norte-americana ao propor um divertido choque de
identidades entre um ‘redneck’ de bom coração e um millenial sedento pela maturidade.
Embora subaproveite parte do honesto pano de fundo dramático no terço final,
Jody Hill é cuidadoso ao não “caçar” risadas a qualquer custo, valorizando o
talento\veia cômica do trio de protagonistas em terreno selvagem enquanto
constrói uma simpática história de reconexão entre pai e filho.
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