Dirigido pelo experiente Jonathan Damme, do aclamado O Silêncio dos Inocentes, e roteirizado pela criativa Diablo Cody, do cultuado Juno, Ricki and The Flash - De Volta para Casa definitivamente não está à altura dos melhores trabalhos desta dupla de realizadores. Se escorando em rasos e previsíveis melodramas familiares, daqueles que ora e vez brotam nas salas de cinema, o longa é nitidamente "salvo" pela multipremiada Meryl Streep, que esbanja o seu reconhecido talento ao humanizar a popular figura do 'rockstar'. Recheado de vibrantes números musicais, brilhantemente interpretados pela protagonista, o drama musical encontra o seu rumo ao explorar os dilemas pessoais da decadente cantora, uma mulher que não conseguiu conciliar o sonho de ser mãe com o de se tornar uma roqueira de sucesso.
Trazendo no currículo musicais como A Última Noite (2006), Mamma Mia! (2008) e o recente Caminhos da Floresta (2014), Meryl Streep impressiona por sua enorme desenvoltura ao dar voz a alguns novos e velhos hits da música norte-americana. Indo da clássica 'American Girl', de Tom Petty and the Heartbreakers, à recente 'Bad Romance', da cantora pop Lady Gaga, a consagrada atriz desfila a sua versatilidade em cena, oferecendo uma dose a mais de energia e intensidade a um argumento repleto de altos e baixos. Fazendo o possível para dar contornos mais comoventes a dilemas superficiais e inicialmente vazios, Streep interpreta Ricki Rendazzo, uma roqueira talentosa que não viu a sua carreira decolar. Vivendo de shows em um pequeno bar, ela tem a sua rotina alterada quando o seu ex-marido Pete (Kevin Kline) resolve ligar e revelar que a sua filha Julie (Mamie Gummer) tentou o suicídio após uma separação mal resolvida. Devastada com a notícia, a ausente mãe decide retornar ao seu antigo lar, tentando ser o ombro amigo que a sua caçula tanto precisava. Ao chegar lá, no entanto, Ricki percebe que o impacto da sua ausência era bem maior do que o esperado, principalmente na relação com os seus dois outros (estereotipados) filhos: o homossexual assumido Adam (Nick Westrate) e o hipster distante Josh (Sebastian Stan).
Seguindo a cartilha das recorrentes 'dramédias' familiares, o roteiro assinado por Diablo Cody é quase decepcionante. Repleto de rasos e agridoces melodramas, o argumento falha ao explorar os dilemas dos protagonistas, que ganham corpo de maneira apressada e pouco inspirada. Ainda que no primeiro ato a relação entre a mãe roqueira e a sua desequilibrada herdeira seja interessante, principalmente pelo ótimo desempenho de Mamie Gummer, filha de Meryl Streep na vida real, aos poucos esta "volta para casa" vai se revelando inesperadamente morna, rendendo poucas sequências genuinamente comoventes. Na melhor delas, após fumarem um baseado, Streep solta a voz à capela interpretando a balada original 'Cold One'. Pecando pela falta de contundência, a trama é também desnecessariamente breve ao abordar as questões envolvendo o passado dos protagonistas. Esvaziando temas como o fim do casamento entre Pete e Ricki e os motivos que a afastaram dos seus próprios filhos, a relação entre mãe, filhos e ex-marido definitivamente não embala, esbarrando em soluções forçadas e na falta de aprofundamento. Nem a divertida sequência da lavagem de roupa suja no restaurante, de longe um dos pontos altos do longa, é capaz de expor com o devido capricho os problemas em torno desta contrastante família. Uma pena, já que Kevin Kline se mostra impecável como o sensível ex-marido.
Por outro lado, à medida que o foco da trama se volta para a roqueira decadente, Ricki and The Flash parece ganhar um novo ritmo. Certeiro ao humanizar a personalidade da rockstar, que mesmo abalada em nenhum momento abre mão das suas convicções, Jonathan Damme é bem mais inspirado ao se aprofundar na crise desta ausente mãe. Contando com a reconhecida veia dramática de Streep, o longa cresce durante a segunda metade da projeção, principalmente quando resolve adotar uma abordagem mais objetiva ao evidenciar os reflexos da incessante busca pelo estrelato na rotina da protagonista. Abrindo espaço para a singela relação entre Ricki e o guitarrista Greg (Rick Springfield), o argumento adquire certo frescor ao discutir o papel da mulher dentro deste cenário musical, evidenciando habilmente as dificuldades em se conciliar a vida profissional com a pessoal. Somado a isso, Damme é igualmente cuidadoso ao reproduzir os animados números musicais, que são rodados com o intimismo que talvez tenha faltado para boa parte das sequências familiares. Valorizando o bom e velho 'rock and roll', Streep e os integrantes da banda demonstram enorme química em cena, entregando uma performance extremamente digna. A atriz, aliás, não só emprestou a sua própria voz às canções, mas também aprendeu a tocar guitarra para dar mais veracidade aos shows.
Se agarrando no talentoso elenco e nas magnéticas apresentações musicais, Ricki and the Flash - De Volta para Casa desafina ao explorar de maneira superficial os dilemas da família Blummer. Esbarrando num previsível argumento, Jonathan Damme se mostra mais à vontade ao explorar a crise materna da sua indomável protagonista, fazendo do inegável brilho de Meryl Streep o principal diferencial desta bem intencionada 'dramédia' musical. Dos males o menor, já que ela se revela a grande voz dentro de um oscilante show.
Nenhum comentário:
Postar um comentário