Numa época em que filmes como O Artista (2011), Birdman (2014), Acima das Nuvens (2014) e O Último Ato (2015) se destacaram ao apresentar os bastidores da indústria do entretenimento, o clássico A Malvada (1950) é um daqueles preciosos trabalhos que merecem estar sob os holofotes. Contando com as espetaculares presenças de Bette Davis (A Rainha Tirana) e Anne Baxter (Os Dez Mandamentos), o drama vencedor de seis Oscar impressiona ao narrar o envolvente jogo de interesses entre uma grande dama do teatro e uma misteriosa e devotada fã. Mostrando os perigos em torno do egocentrismo e da ambição, o diretor Joseph L. Mankiewicz (Cleópatra) promove um relato cínico e extremamente atual sobre as questões morais envolvendo a incansável busca e manutenção do estrelato.
Indicado a notáveis 14 Oscar, recorde absoluto dividido até hoje com o grandioso Titanic (1997), A Malvada se comprova a cada cena como uma das mais perspicazes e intimistas resenhas sobre as idas e vindas em torno de uma vaidosa atriz. Desde a irônica primeira cena, quando assistimos a luxuosa entrega de um prêmio teatral, percebemos a refinada acidez do argumento escrito pelo próprio Mankiewicz. Na trama, recheada de complexos personagens, conhecemos Margo (Miller), uma experiente e laureada atriz que seguia colhendo os frutos de uma carreira brilhantemente construída. Mesmo não se rendendo ao cinema, ela seguia conquistando o público, tirando um belo proveito das peças escritas por Lloyd Richards (Hugh Marlowe). Após a realização de uma delas, no entanto, a gentil esposa do roteirista (Celeste Holm) resolve levar uma fã para conhecer Margo no camarim. Se apresentando como Eve (Baxter), a jovem logo demonstra a sua completa devoção pela atriz, chamando a atenção por sua triste história de vida. Comovida com a situação, Margo a convida para ser a sua assistente. O que inicialmente parece um grande acerto, principalmente pela completa dedicação da jovem, logo se transforma num problema para Margo quando Eve resolve apresentar a sua verdadeira personalidade.
Empurrado pelas espetaculares atuações de Bette Davis, impecável como a egocêntrica Margo, e Anne Baxter, brilhante ao dar vida a ardilosa Eve, o diretor e roteirista Joseph L. Mankiewicz constrói uma trama repleta de ritmo e ironia. Procurando sempre alimentar o clima de tensão em torno da instigante jovem, o argumento é brilhante ao mostrar as consequências de uma vida guiada pelo ego. Promovendo uma crítica voraz e atualizada aos bastidores de Hollywood, o realizador encontra na relação entre Margo e Eve as ferramentas necessárias para pintar este contundente retrato. Através de diálogos expressivos, o realizador é impecável ao desvendar as intenções das duas protagonistas, apresentando habilmente os seus medos, inseguranças e a ambição que acaba movendo este bem humorado drama. Indo além das suas expressivas protagonistas, A Malvada abre um generoso espaço para os fantásticos coadjuvantes. A começar pela inocente Karen, uma personagem que cria um contraste natural com Margo e Eve. Única a tolerar o estrelismo da atriz, chama a atenção a forma como ela vai sendo explorada ao longa da trama, ganhando espaço e protagonismo à medida que a jovem assistente vai evidenciando as suas verdadeiras intenções. Quem rouba a cena, no entanto, é o ganhador do Oscar George Sanders. Dando vida ao ácido crítico teatral Addison De Witt, o ator impressiona ao compor um personagem repleto de camadas.
Trazendo ainda a jovial presença de Marilyn Monroe, num dos seus primeiros papéis mais significantes, A Malvada merecidamente é considerado um dos principais clássicos do cinema em preto e branco. Empurrado pelas primorosas atuações de todo o elenco, com destaque máximo para a performance de Bette Davis, Joseph L. Mankiewicz questiona o círculo vicioso em torno do culto à celebridade. Um filme que, tal qual uma verdadeira estrela do Cinema ou do Teatro, sobreviveu ao tempo e segue como um dos relatos mais particulares sobre os bastidores da indústria do entretenimento.
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