Ainda menos polêmica, continuação se garante no talento de MacFarlane para as boas piadas
Recheado de referências à cultura pop e as celebridades norte-americanas, Ted 2 abre mão das polêmicas ao apostar num humor nonsense, mas nitidamente mais acessível. Ousando muito pouco em relação ao rentável original, a comédia novamente dirigida e roteirizada por Seth MacFarlane (Uma Família da Pesada) abraça com convicção as fórmulas que consagraram a primeira aventura dos "amigos do trovão", se garantindo bem mais nas ácidas e eficientes piadas, do que propriamente no frágil e requentado argumento. Colocando o ursinho Ted agora como o pivô de uma inusitada batalha judicial, o longa verdadeiramente surpreende através da hilária performance de Mark Wahlberg, que, mesmo sem grande função na trama, arranca inúmeras gargalhadas ao viver o maconheiro e perdedor braço direito do irreverente bichinho de pelúcia.
Reconhecido pelas politicamente incorretas séries animadas Uma Família da Pesada e American Dad, MacFarlane praticamente não se arrisca nesta continuação. Ainda que flerte com algumas tiradas mais espinhosas ao longo da trama, associando sem qualquer tipo de pretensão a briga de Ted a causa homossexual e a luta pela igualdade racial nos EUA, o realizador prefere voltar a sua ácida mira a temas e situações mais amenas, rindo em geral da própria indústria do entretenimento. Repetindo a estrutura narrativa que o levou ao estrelato em Hollywood, se prepare então para as piadas recorrentes e para as repentinas gags que surgem isoladamente em cena, o longa acompanha a nova rotina de Ted (voz de MacFarlane), o desbocado urso que parece não conseguir fazer o seu casamento com Tamy-Lynn (Jessica Barth) dar certo. Entre brigas e desilusões, ele resolve tentar uma última cartada para salvar a sua relação, acreditando que só mesmo um filho poderia os reaproximar. Percebendo o entusiasmo dela, Ted logo parte atrás de um doador de esperma, mas um problema acaba o demovendo desta ideia. Enxergando na adoção a última possibilidade para ter o seu próprio filho, o ursinho descobre então que não é reconhecido como uma pessoa, e que por isso não poderia trabalhar, se casar e - logicamente - ter um herdeiro. Com a ajuda do desiludido John (Wahlberg), solitário após o término do seu casamento, Ted resolve ir para os tribunais para garantir os seus direitos como cidadão, encontrando na jovem advogada Samantha Jackson (Amanda Seyfried) a responsável por fazer a sua defesa.
Inspirado ao explorar o aspecto nonsense desta situação, Seth MacFarlane deixa uma ótima impressão ao longo do primeiro ato. Com piadas espertas e levemente escatológicas, o realizador faz desta busca pelo "esperma perfeito" um dos pontos altos do longa, rendendo sequências genuinamente hilárias. Apostando na capacidade de Mark Wahlberg em rir de si mesmo, a história é ágil ao contextualizar a situação dos dois protagonistas, os inserindo em situações divertidamente bizarras. Na melhor delas, após ver o seu herói de infância recusar a ideia de ser o doador, John e Ted vão atrás de um popular jogador de futebol americano para "colherem" o material para a inseminação artificial. Apesar da relação entre os "amigos do trovão" ser novamente o motor do longa, permanecendo agradável do início ao fim, pouco a pouco o argumento se rende as soluções genéricas e perde fôlego. Ainda que as equilibradas gags mantenham o humor dentro do limite do aceitável, a película sofre uma evidente queda de ritmo a partir do segundo ato, principalmente quando o roteiro parece não se contentar em explorar os dilemas em torno da batalha judicial liderada por Ted. Apelando para insossas subtramas, incluindo a forçada volta do estranho antagonista interpretado por Giovani Ribisi (60 Segundos), MacFarlane parece se contentar em reciclar as fórmulas do original, esvaziando as despretensiosas cenas forenses e as questões sociais por trás da premissa. Um grande desperdício, até porque é quando brinca com o universo dos filmes de tribunal que o argumento assume a sua veia mais politicamente incorreta. Pra piorar, em meio as perspicazes referências à clássicos pop como Clube dos Cinco, Star Wars, Pulp Fiction e O Senhor dos Anéis, o diretor falha justamente ao utilizar a Comic Con dentro do clímax, promovendo uma espécie de bullying gratuito ao pintar os "nerds" de maneira completamente caricata.
Por outro lado, apesar do problemático argumento, Seth MacFarlane garante a diversão com a sua ácida veia cômica. Mesmo se esquivando do humor mais polêmico e menos abrangente, o que de certa forma já havia acontecido também no primeiro Ted, o realizador comprova o seu talento ao criar sequências geralmente inspiradas, explorando a impecável química entre os dois protagonistas. Com um Mark Wahlberg extremamente à vontade em cena, MacFarlane faz do ator uma espécie de escada para o seu Ted, um simples ombro amigo, desviando os holofotes desta continuação para o escrachado, expressivo e visualmente irretocável ursinho de pelúcia. Sem qualquer tipo de vaidade, Wahlberg encara esta opção com um nítido entusiasmo e se torna o pivô de alguns dos momentos mais impagáveis do longa. Equilibrando habilmente as piadas ao longo das excessivas duas horas de projeção, MacFarlane impressiona ao tornar natural esta improvável parceria regada a maconha, ironia e muita zoação. Voltando a sua mira para as celebridades norte-americanas, algumas inclusive entram na brincadeira e aparecem em divertidas pontas, o diretor não poupa nomes como os de Steven Tyler, Jay Leno e Justin Bieber. No momento mais genial do longa, inclusive, ele se volta até mesmo contra a sua própria classe, criticando de maneira absolutamente primorosa a invasão do politicamente correto na pauta dos humoristas. Vale lembrar, aliás, que o próprio comediante sentiu na pele a fúria deste conservadorismo, sendo alvejado de críticas ao optar por uma pegada mais ironicamente agressiva durante a sua contestada apresentação no Oscar 2013.
Trazendo ainda a presença da competente Amanda Seyfried (Os Miseráveis), completamente descontraída ao substituir a carismática Mila Kunis como o terceiro elemento desta "brisada" amizade, Ted 2 supera os altos e baixos ao se revelar um entretenimento altamente debochado e despretensioso. Mesmo subaproveitando alguns dos personagens, Morgan Freeman pouco acrescenta ao surgir em cena como o porta voz de um esquecível discurso, esta simpática comédia se agarra na elogiável veia cômica de Seth MacFarlane ao dar liga a um preguiçoso argumento. Contando com uma dose a mais de liberdade criativa, vide a adição dos seus populares números musicais, o versátil realizador é espirituoso ao reproduzir o aspecto mais nonsense consagrado pelo primeiro longa, oferecendo uma película que se não atinge o nível criativo do original, ao menos oferece aquilo que os fãs dos "amigos do trovão" esperavam assistir.
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