sábado, 28 de setembro de 2013

Festival do Rio (Questão de Tempo)



Richard Curtis promove uma abordagem sensível sobre a viagem no tempo num dos melhores 'feel-good movies'* dos últimos anos


Então como roteirista, Richard Curtis conquistou o seu espaço no cinema mundial graças as "cultuadas" comédias românticas Quatro Casamentos e um Funeral, Um Lugar Chamado Nothing Hill e O Diário de Bridget Jones. Profundo conhecedor do tema, Curtis acabou subindo de patamar e assumindo também a direção dos elogiados Simplesmente Amor e Piratas do Rock. No entanto, quando a sinopse do seu novo filme Questão de Tempo foi divulgada, logo foi criada uma grande expectativa. Afinal, Curtis seguiria no terreno que conhece bem, a comédia romântica, mas adicionando pitadas sci-fi, com direito a viagens no tempo e todas as complicações que o tema proporciona dentro de um roteiro. Expectativas essas que são logo saciadas nos primeiros minutos do longa, já que o diretor mostra mais uma vez o seu talento ao dar uma cara original e tocante a um tema que vem se tornando recorrente dento do cinema mundial. Até mesmo no Brasil - diga-se de passagem - que recentemente lançou os ótimos A Máquina (2005) e O Homem do Futuro (2011).

Na verdade, desde o clássico De Volta para o Futuro o tema viagem no tempo passou a ser amplamente utilizado em Hollywood. Muitas abordagens foram criadas e aos poucos o tema já começa a ficar desgastado. Até mesmo na comédia romântica a temática já foi utilizada, vide o ótimo Meia Noite em Paris, um dos grandes sucessos de 2012. No entanto, Curtis, que também é roteirista do longa, parece ter a fórmula do sucesso do gênero em mãos e, sem se aprofundar na temática Sci-fi, usa a viagem no tempo com sensibilidade e humor. Sem querer revelar muito da trama, em Questão de Tempo essa viagem é limitada, exclusivamente, aos acontecimentos já vividos pela própria pessoa. Nesse caso, o jovem Tim (Domhnall Gleeson), um desajeitado rapaz de 21 anos que ao saber de seu pai (Bill Nighy) que todos os homens da família podem viajar no tempo passa a ter um único objetivo: conquistar uma namorada. Nada de riqueza, fama, ou êxito profissional, apenas um amor para a sua vida. É, eu sei, a premissa pode até soar melodramática num primeiro momento. Mas não se engane pelas aparências, já que a trama privilegia o bom humor dos personagens, evitando buscar apoio nos melodramas. Com isso, Richard Curtis não subestima o espectador e torna o longa verdadeiramente engraçado e criativo.


Com uma intimista narração em primeira pessoa e diálogos cheios de sarcasmo, repletos da típica ironia inglesa, Tim vai revelando como foi lidar com esse dom e como o utilizou para conquistar o seu objetivo. Sabendo explorar bem todas as consequências de uma viagem no tempo, sem explicações científicas baratas, Richard Curtis cria uma trama que soa natural, apesar da temática espetacular. Principalmente por apresentar personagens extremamente peculiares, mas humanos. A começar pela própria figura paterna, vivida por Bill Nighy, uma espécie de mentor que resolveu usar o seu dom para poder ler o maior número de livros possíveis. Se o pai é sensível e atencioso, a mãe vivida por Lindsey Duncan é a figura de força na família, a responsável pelo trabalho braçal que quase sempre não demonstra os seus sentimentos. Somado aos dois, somos apresentados a espevitada irmã Kit-Kat, interpretada com vivacidade por Vanessa Kirby, e ao adorável tio D (Richard Cordery), um idoso solitário e desligado que se torna parte integrante da família. Apostando nesta esfera familiar pouco convencional, a comédia-romântica se torna altamente atraente para o espectador, conseguindo trazer primeiramente uma interessante solidez à trama, para só ai passar a explorar melhor as artimanhas de Tim para conquistar Mary (Rachel McAdams). Narrando com sensibilidade o desenvolvimento dos personagens, Curtis consegue encontrar um equilíbrio na transição dos gêneros, utilizando a comédia, o drama e também o romance de forma impar. Pra ser sincero, ele cria uma fórmula irresistível.


E toda essa atmosfera se deve, principalmente, a grande escolha do elenco. Apostando em caras menos conhecidas do grande público, com exceção da sempre elogiada Rachel McAdams, Curtis tem o seu trabalho facilitado pela qualidade do time de atores. Como de costume, o diretor consegue tirar bons desempenhos dos seus comandados e o seu trabalho com Domhnall Gleeson é extremamente satisfatório. Gleeson mostra um ótimo tempo para o humor e uma química invejável com Rachel McAdams, uma das atrizes mais talentosas de sua geração. No entanto, o grande destaque do filme é Bill Nighy. Em uma interpretação repleta de sentimento, o experiente ator inglês tem um dos melhores desempenhos de sua carreira. Atuação digna de grandes prêmios, daquelas que ao mesmo tempo divertem e emocionam o espectador. Além deles, vale destacar também o desempenho excelente de Tom Hollander, que vive Harry, um mal-humorado diretor de teatro que acaba abrigando Tim em Londres. O seu personagem rende as melhores piadas do filme e também tem uma atuação digna dos melhores elogios.


No projeto mais ousado da carreira de Richard Curtis, que, além de dirigir e roteirizar também produziu o longa, Questão de Tempo é um dos grandes acertos na sua curta filmografia como diretor. Compondo um belo cenário através da exuberante fotografia de John Guleserian e da cativante trilha sonora de Nick Laird-Clowes, o realizador britânico encanta através de uma obra completa, divertida, tocante e tecnicamente bem construída. Um filme que se torna fantástico não pela exploração da encantadora possibilidade da viagem no tempo, mas sim pela originalidade em destacar como a vida pode ser, por si só, tão mágica.


*Filmes feitos para o espectador se sentir bem !!!!!!!!!! 

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