Com surpresas, escolhas ousadas, outras muito previsíveis e um desfecho (para dizer o mínimo) anti-climático, o Oscar 2019 não deu espaço para o marasmo. Sem um apresentador fixo, a premiação ganhou em dinamismo e espontaneidade, algo que se refletiu nas criativas apresentações dos prêmios. A pulverização das estatuetas, aliás, permitiu alguns feitos históricos, como o triunfo de Spike Lee na categoria Melhor Roteiro Adaptado, que, após três décadas de serviços prestados ao cinema, ganhou o seu primeiro Oscar. No momento em que a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas poderia realmente mudar o 'status quo' do evento, entretanto, o tradicionalismo venceu. O triunfo de títulos como o mediano Bohemian Rhapsody e o polêmico Green Book (leia mais aqui) surgiu como um balde de água fria, principalmente junto àqueles que defendem a representatividade, a diversidade e o respeito às diferentes vozes. Não foi desta vez que o Oscar de Melhor filme ficou em boas mãos. Enfim, para àqueles que por algum motivo não conseguiram assistir a cerimônia na íntegra, neste artigo uma lista com doze dos momentos que fizeram da edição 2019 uma das mais divisivas da história recente do evento.
- Performance do Queen
Esqueça os arranjos de orquestra, os solos de violino, as grandes trilhas sonoras. O Oscar 2019 começou ao som de Queen e do hit Will Will Rock You. Surfando na onda do 'hype' criado por Bohemian Rhapsody, a equipe de organização trocou os geralmente cômicos discursos de abertura por uma empolgante apresentação de rock, o que, por si só, já validou a presença do longa dirigido por Bryan Singer na premiação.
- Tina Fey, Maya Rudolph e Amy Poehler roubam a cena
Mesmo reduzido, o cômico discurso de abertura se revelou um dos 'highlights' da noite. Com Tina Fey, Maya Rudolph e Amy Poehler, a Academia encontrou a espontaneidade necessária para arrancar risadas escandalosas do público presente, comprovando que as três merecem estar a frente da cerimônia num futuro próximo. Isso que eu chamo de deboche.
- Regina King leva o Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante
Até aqui só boas novas. Embora fosse a favorita, a vitória de Regina King nos presenteou com um dos momentos mais sinceramente comoventes do Oscar 2019. Com a sua mãe na plateia, ela quase tropeçou no vestido, subiu ao palco com a ajuda de Chris "Capitão América" Evans, agradeceu pela oportunidade, lembrou da sua longa jornada até Se a Rua Beale Falasse e (claro!) homenageou a sua simpática figura materna.
- Melissa McCarthy no melhor estilo Melissa McCarthy
Indicada ao Oscar de Melhor Atriz por um papel mais sério, a escritora Lee Israel no cativante Poderia Me Perdoar?, Melissa McCarthy não titubeou em aprontar das suas. Num dos momentos mais engraçados da história recente da premiação, a atriz desfilou o seu inacreditável tempo de comédia ao apresentar a categoria de Melhor Figurino. Trajada como uma rainha, com um coelho de fantoche na mão, numa clara alusão ao cínico A Favorita, McCarthy, ao lado do ator Brian Tyree Henry, nos presentou com um verdadeiro número de comédia.
- Duas realizadoras negras, pela primeira vez, levam o Oscar nas categorias Melhor Figurino e Melhor Direção de Arte
Que história bonita escrevia o Oscar 2019 até aqui. Por Pantera Negra, Ruth E. Carter (na primeira imagem na foto acima) e Hannah Beachler (na segunda imagem na foto acima) levaram, respectivamente, a estatueta nas categorias Melhor Figurino e Melhor Direção de Arte. Pela primeira vez, a Academia premiava mulheres negras nestes dois quesitos. A felicidade das duas era contagiante. Como não defender a representatividade.
- O triunfo de Alfonso Cuarón
Num momento particularmente complicado para o imigrante latino em solo norte-americano, o triunfo de Alfonso Cuarón e do seu Roma deixou mais uma vez uma bem-vinda mensagem integradora. Vencedor do Oscar de Melhor Fotografia, Filme Estrangeiro e Direção, o realizador se tornou o quinto mexicano a levar a estatueta dourada na categoria melhor direção nos últimos seis anos. Um domínio que tem muito a dizer.
- O furacão Shallow
A performance da canção Shallow, do hit pop Nasce Uma Estrela, estava entre os momentos mais aguardados da noite. E a dupla Lady Gaga e Bradley Cooper fez jus as expectativas ao entregar uma performance memorável. Por cerca de dois minutos, o silêncio tomou conta, a plateia foi envolvida pela força desta canção e da irretocável voz de Lady Gaga. Uma apresentação emocionante, cirúrgica e apoteótica que ajuda a explicar o frisson em torno desta imponente música. Definitivamente, o Oscar de Melhor Canção Original era apenas uma consequência.
- Spike Lee leva o seu primeiro Oscar por Infiltrado na Klan
A grande sensação da noite, o legendário diretor Spike Lee viveu o Oscar 2019 com a intensidade dos seus filmes. Com o magnífico Infiltrado na Klan correndo por fora em diversas categorias, o veterano não segurou a sua euforia ao ser anunciado como o vencedor do Oscar de Melhor Roteiro Adaptado. Ao ver o seu parceiro Samuel L. Jackson no palco, Lee corre, pulou em cima dele e nos minutos seguintes protagonizou um dos discursos mais emblemáticos da noite. Temos que "fazer a coisa certa". Infelizmente, a Academia "não fez".
- Rami Malek leva o Oscar de Melhor Ator
A partir daqui as coisas começaram a degringolar. Com três estatuetas do Oscar até então, já era claro que Bohemian Rhapsody tinha sido muito mais premiado do que merecia. Isso num ano com produções tecnicamente fenomenais, como os casos de Primeiro Homem e Um Lugar Silencioso. O triunfo de Rami Malek, entretanto, nos fez lembrar que o Oscar nada mais é do que um evento corporativo. Nada contra ele. Muito pelo contrário. Acho o seu Freddie Mercury uma das melhores coisas do filme. O problema é que, a rigor, não era uma performance de Oscar. Longe disso. O que Malek fez, e muito bem, foi o jogo de bastidores. Deu as caras em todos os eventos, entrevistas, seguiu a cartilha e foi recompensado. Menos mal que foi para um realizador jovem, muito promissor, que tem muito mais a oferecer ao mundo do cinema.
- A surpresa no rosto de Olivia Colman
O Oscar 2019 começou com algumas certezas. Que Mararshala Ali levaria o prêmio de Melhor Ator Coadjuvante. Check! Que Shallow levaria o Oscar de Melhor Canção Original. Check! Que Homem-Aranha no Aranhaverso levaria o Oscar de Melhor Animação. Check! Que Glenn Close, ops, espera. Tratada como uma das grandes barbadas da noite, a veterana atriz, na sua sétima indicação, foi mais uma vez "esnobada" pela Academia. E, por melhor e mais intensa que seja a sua performance em A Esposa, foi feito justiça. Na pele da monumental rainha carente de A Favorita, Olivia Colman surpreendeu a todos ao levar o Oscar de Melhor Atriz. E o público foi recompensado com um dos discursos mais espontâneos e cômicos já feitos. Ela realmente foi pega de surpresa. Não era tipo. O resultado pode ser assistido acima.
- A decepcionante vitória de Green Book
Na hora da verdade, porém, mais uma vez a Academia preferiu seguir o caminho mais conservador. A vitória de Green Book é o triunfo do "velho" Oscar, do prêmio que prefere contemporizar a eleger o melhor. Ou o mais crítico. Tínhamos o poderoso Roma, mas ele trazia consigo o 'buzz' da Netflix e o cheiro da modernidade. Tínhamos o feroz Infiltrado na Klan, mas ele trazia consigo um discurso racial mais combativo desconfortável para muitos dos votantes. Tínhamos o extravagante A Favorita, mas ele trazia consigo um cinismo que a Academia não costuma premiar. Tínhamos o imponente Pantera Negra, mas ele trazia consigo o frequentemente esnobado cheiro de cinema pipoca. Venceu Green Book, um filme sobre racismo numa América segregada dirigido por um homem branco, escrito por um homem branco e produzido por homens brancos. Uma tocante história de amizade, com inquestionáveis virtudes, mas com problemas que só vieram a ganhar os holofotes tardiamente.
- A reação de desaprovação de Spike Lee
Por fim, ele. Como disse lá em cima, Spike Lee foi um dos principais protagonistas do Oscar 2019. E a sua reação ao triunfo de Green Book diz muito sobre o quão desastrada foi a resolução do prêmio de Melhor Filme. Ao ver o longa dirigido por Peter Farrely levar o Oscar, Lee, como flagrou um crítico posicionado na parte de cima da plateia, simplesmente deu as costas para o palco e partiu rumo a saída. Hoje mais cedo publiquei um artigo completo sobre os motivos para tal atitude. Leia aqui se for do interesse. E eles são justos, principalmente quando vemos o Oscar "sacrificar" a questão da representatividade em prol de uma escolha "segura" e um tanto quanto frustrante numa safra com pelo menos três grandes filmes. Spike Lee já sentiu isso na pele outras vezes. Ele, porém, saiu com a certeza que o seu Infiltrado na Klan irá sobreviver ao teste do tempo, e, segundo o próprio, "resistirá no lado certo da história". Não tenha dúvidas, não tenha dúvidas...
O Oscar 2019 começou com algumas certezas. Que Mararshala Ali levaria o prêmio de Melhor Ator Coadjuvante. Check! Que Shallow levaria o Oscar de Melhor Canção Original. Check! Que Homem-Aranha no Aranhaverso levaria o Oscar de Melhor Animação. Check! Que Glenn Close, ops, espera. Tratada como uma das grandes barbadas da noite, a veterana atriz, na sua sétima indicação, foi mais uma vez "esnobada" pela Academia. E, por melhor e mais intensa que seja a sua performance em A Esposa, foi feito justiça. Na pele da monumental rainha carente de A Favorita, Olivia Colman surpreendeu a todos ao levar o Oscar de Melhor Atriz. E o público foi recompensado com um dos discursos mais espontâneos e cômicos já feitos. Ela realmente foi pega de surpresa. Não era tipo. O resultado pode ser assistido acima.
- A decepcionante vitória de Green Book
Na hora da verdade, porém, mais uma vez a Academia preferiu seguir o caminho mais conservador. A vitória de Green Book é o triunfo do "velho" Oscar, do prêmio que prefere contemporizar a eleger o melhor. Ou o mais crítico. Tínhamos o poderoso Roma, mas ele trazia consigo o 'buzz' da Netflix e o cheiro da modernidade. Tínhamos o feroz Infiltrado na Klan, mas ele trazia consigo um discurso racial mais combativo desconfortável para muitos dos votantes. Tínhamos o extravagante A Favorita, mas ele trazia consigo um cinismo que a Academia não costuma premiar. Tínhamos o imponente Pantera Negra, mas ele trazia consigo o frequentemente esnobado cheiro de cinema pipoca. Venceu Green Book, um filme sobre racismo numa América segregada dirigido por um homem branco, escrito por um homem branco e produzido por homens brancos. Uma tocante história de amizade, com inquestionáveis virtudes, mas com problemas que só vieram a ganhar os holofotes tardiamente.
- A reação de desaprovação de Spike Lee
Por fim, ele. Como disse lá em cima, Spike Lee foi um dos principais protagonistas do Oscar 2019. E a sua reação ao triunfo de Green Book diz muito sobre o quão desastrada foi a resolução do prêmio de Melhor Filme. Ao ver o longa dirigido por Peter Farrely levar o Oscar, Lee, como flagrou um crítico posicionado na parte de cima da plateia, simplesmente deu as costas para o palco e partiu rumo a saída. Hoje mais cedo publiquei um artigo completo sobre os motivos para tal atitude. Leia aqui se for do interesse. E eles são justos, principalmente quando vemos o Oscar "sacrificar" a questão da representatividade em prol de uma escolha "segura" e um tanto quanto frustrante numa safra com pelo menos três grandes filmes. Spike Lee já sentiu isso na pele outras vezes. Ele, porém, saiu com a certeza que o seu Infiltrado na Klan irá sobreviver ao teste do tempo, e, segundo o próprio, "resistirá no lado certo da história". Não tenha dúvidas, não tenha dúvidas...
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