Laços do destino
Uma mistura de Sexta-Feira Muito Louca (1976), com Em Algum Lugar no
Passado (1980) e o recente in Your Eyes (2014), Your Name (2016) foge do lugar comum
ao dar uma roupagem indiscutivelmente original a uma premissa batida. Numa
temporada particularmente prolixa para o mercado da animação, o blockbuster
japonês dirigido e roteirizado por Makoto Shinkai contorna os problemas
narrativos ao nos brindar com um romance sincero, emotivo e surpreendente.
Curiosamente, entretanto, o longa não é um caso de amor a primeira vista. Embora visualmente magnífico, vide a texturizada fotografia e a exuberante palheta de cores em tons frios, o longa custa a engrenar, principalmente em função da previsibilidade do primeiro ato. Por mais que os dois protagonistas (e os conflitos entre eles) sejam bem introduzidos\desenvolvidos, a película não mostra muita inspiração ao brincar com o recurso da troca de corpos. Entre piadinhas inocentes e lampejos de boas ideias, Your Name narra a jornada de Mitsuha, uma jovem inquieta que, cansada da sua rotina numa cidadezinha do interior, deseja se tornar um "garoto bonito de Tóquio". Num acaso do destino, na manhã seguinte, enquanto ela acorda no corpo do descolado Taki, ele se vê "preso" no corpo da independente adolescente. Uma situação viria a se repetir sistematicamente nos meses seguintes. Após um início turbulento, os dois começam a se entender quando Mitsuha decide usar a sua feminilidade para que Taki pudesse conquistar a sua simpática colega de trabalho. Nesse meio tempo, porém, os dois passam a conviver com uma atração mútua, um sentimento crescente capaz de realmente modificar o destino das suas respectivas vidas.
Recheado de diálogos expositivos, Your Name peca inicialmente ao
subestimar a inteligência do espectador, subaproveitando o potencial desta
inusitada relação ao investir em situações genéricas, em gags repetitivas e num
arco central aparentemente requentado. Em um ou dois momentos, Makoto Shinkai
parece não confiar na universalidade do seu próprio texto, mostrando um
perceptível preciosismo ao traduzir a dinâmica do "casal" e o 'modus
operandi' da relação. Ao longo do oscilante primeiro ato, porém, algo já
chamava a atenção. No embalo da ágil montagem e da encantadora trilha sonora, o
realizador é habilidoso ao estabelecer não só o delicado subtexto religioso que
permeia a trama, como também o início deste cativante romance, estreitando os
laços entre os protagonistas ao apostar num denso triângulo amoroso. Sem querer
revelar muito, é interessante ver como o roteiro, a partir do surgimento deste
terceiro elemento, transita sutilmente da comédia para o romance, elevando o
patamar da película ao realçar os sentimentos mais íntimos dos personagens e a
gradativa conexão entre eles.
No momento em que Your Name parecia ter encontrado o seu consistente
dilema central, no entanto, Makoto Shinkai surpreende ao subverter o 'status
quo' do longa, investindo numa reviravolta empolgante e brilhantemente
construída. Embora não tenha a intenção de encontrar uma lógica por trás do
fenômeno que une Taki e Mitsuha, o realizador japonês é astuto ao estabelecer
os pormenores em torno da troca de corpos e ao os utilizar em prol da construção
do inteligente 'plot twist', elevando o escopo dramático do filme ao encontrar
uma maneira singular para incrementar o romance entre os personagens. Conveniências
narrativas à parte, o diretor amarra as pontas do roteiro com enorme
desenvoltura, nos brindando com um comovente último ato e um memorável clímax. E
que belo desfecho!
Contando ainda com adoráveis coadjuvantes e um ritmo envolvente, Your
Name revigora o clichê do "amor impossível" numa obra atual e com uma
criativa veia pop. Com personagens modernos, traços expressivos e um visual de
embasbacar, Makoto Shinkai reforça a autoralidade do mercado nipônico de
animação ao dar contornos originais a uma premissa ocidentalizada um tanto
quanto esgotada. O resultado é um verdadeiro fenômeno de público e crítica no
Japão. Um filme que, só no seu país de origem, faturou estrondosos US$ 235
milhões, a maior bilheteria de 2016. Para critério de comparação, no ano
anterior, Star Wars: O Despertar da Força liderou esta mesma lista com US$ 97
milhões.
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