Entre altos e baixos, a franquia Resident Evil chega ao seu sexto e derradeiro longa como a primeira adaptação relacionada ao universo dos games a realmente prosperar nos cinemas. E muito deste êxito, inegavelmente, se deve a persistência do casal Paul W.S. Anderson e Milla Jovovich. Tal qual a protagonista Alice, uma personagem inédita criada para se tornar o símbolo da releitura pop idealizada pelo realizador para esta versão cinematográfica, os dois "apanharam" muito durante o trajeto até este Capítulo Final. Como se não bastasse a recepção majoritariamente negativa por parte da mídia especializada, a dupla precisou conviver também com as recorrentes críticas dos fãs mais intransigentes, a maioria delas envolvendo a mudança do 'status quo' dos protagonistas e a roupagem mais voltada para o cinema de ação. Curiosamente, porém, mesmo diante de tamanha descrença, Resident Evil se sustentou enquanto franquia, justamente por conseguir atingir o alvo que Anderson sempre desejou: o espectador comum.
Lá no início dos anos 2000, Paul W.S. Anderson compreendeu que precisava dar um rumo mais moderno para a série de games da Capcom. Com um universo vasto e elementos substanciais em mãos, ele resolveu mirar nos interesses escusos das grandes corporações, transformando a Umbrella Corporation no antagonista que a versão cinematográfica precisava para dialogar com as novas plateias. Embora tenha derrapado por diversas vezes durante o desenvolvimento da jornada de Alice, vide a falta de zumbis em O Hóspede Maldito (2002) ou os exageros superpoderosos em A Extinção (2007), o fato é que Anderson conseguiu se reinventar ao longo deste processo, construindo um universo cinematográfico coeso que se manteve rentável durante quase quinze anos. O resultado de tamanho esforço pode ser visto em Resident Evil 6: O Capítulo Final, um longa que reflete a dedicação do casal à esta eficiente franquia. Por mais que tecnicamente o filme fique alguns degraus abaixo dos dois antecessores, Paul W.S. Anderson surpreende ao entregar o roteiro mais sólido da série, indo além das expectativas ao arquitetar não só algumas interessantes reviravoltas, como também ao finalmente desvendar as nebulosas intenções por trás da Umbrella.
Ainda que se escore em algumas soluções frágeis, a repentina mudança de lado do ardiloso Wesker (Shawn Roberts), por exemplo, é explicada com enorme previsibilidade, o roteiro novamente assinado por Paul W.S. Anderson é perspicaz ao preparar o terreno para o tão esperado confronto final. Assim como no subestimado Resident Evil 5: Retribuição (2012), o realizador faz um inventivo uso do artifício da clonagem, aqui explicado com maior propriedade, adicionando um tempero especial ao longa ao resgatar o melhor antagonista da saga, o obstinado Dr. Isaacs. Uma figura cerebral e nebulosa que casa perfeitamente com a atmosfera reveladora deste sexto filme. Méritos que, necessariamente, precisam ser divididos com o talentoso Ian Glein, seguro ao encarnar o misto de obsessão e frieza do seu vilanesco personagem. Além disso, Anderson é igualmente habilidoso ao introduzir a origem de peças chaves da franquia, entre elas a própria Alice, o T-Vírus e a perigosa Rainha Vermelha (Ever Anderson, filha de Paul e Milla), os costurando a trama com agilidade e poder de síntese. A Inteligência Artificial da Umbrella, inclusive, se revela um dos trunfos da película, principalmente pela perspicácia com que Anderson utiliza a sua programação original dentro de um novo e justificável contexto.
O grande diferencial deste sexto longa, porém, está no caminho encontrado pelo argumento para desvendar os interesses da nefasta corporação, adotando um viés questionador que remete levemente a um clássico do gênero, o 'cult' Robocop (1987). Embora faça uso de recursos didáticos, o diretor renova o teor da franquia ao flertar com respostas de cunho ambiental dentro de um contexto apocalíptico. Por mais que num primeiro momento esta opção possa soar absurda, à medida que a trama avança é possível digerir os planos dos executivos da Umbrella, atitudes que culminam numa eficiente reviravolta e num último ato mais intimista. Quer dizer, pelo menos para os (limitados) padrões da série. Num todo, aliás, Resident Evil: O Capítulo Final é o que melhor equilibra a ação com o desenvolvimento narrativo, conseguindo pontuar a jornada de Alice com vigor e boas ideias. Em contrapartida, como de costume na série, o argumento peca ao trabalhar os personagens secundários. Após o envolvente e silencioso primeiro ato, Paul W.S. Anderson falha ao tentar introduzir uma nova e dispensável equipe de sobreviventes. Por mais que a participação de Claire Redfield (Ali Larter) seja significativa, um alento para os fãs dos jogos, os demais integrantes são inexpressivos e se tornam meros peões ao longo da trama. Na verdade, o realizador até se arrisca ao tentar dar um pouco mais de peso a um destes personagens, mas o seu desenvolvimento é raso e preguiçoso. O mesmo, por sinal, acontece com o canastrão Wesker, um ingrediente pouco explorado reduzido a pontuais frases de efeito. O destino dos demais protagonistas da série, aliás, poderia ser menos sugestivo, mas as respostas são claras e suficientes para a conclusão da trama.
No que diz respeito ao aspecto visual, O Capítulo Final fica atrás dois dos últimos longas da franquia. Inicialmente, porém, Paul W.S. Anderson mostra categoria ao revelar a destruição global em um avermelhado cenário desértico. Disposto a realçar o caos em torno de Alice, o realizador coloca o espectador no centro da ação ao investir em takes nervosos, sequências frenéticas marcadas pelos cortes rápidos, elaboradas coreografias e pela fisicalidade. Num trabalho bem pessoal, nas cenas diurnas e\ou luminosas esta opção surge como uma boa novidade, já que Anderson é habilidoso ao imprimir a ferocidade sem nunca perder o foco. Infelizmente, o anoitecer logo chega. Indo de encontro ao estiloso quinto longa, o diretor se rende a um escurecido ambiente pós-apocalíptico, talvez com a intenção de mascarar a artificialidade quando o assunto é o CGI. Além disso, na ânsia de ampliar o escopo da trama, ele confunde grandiosidade com megalomania durante o arrastado segundo ato, tornando tudo muito impessoal e genérico. A divulgada cena da explosão, por exemplo, se sustenta numa solução ilógica, uma "imprudente" queima de combustível contra uma horda de zumbis. Por falar neles, os mortos-vivos são pouco explorados neste último filme, funcionando muito mais como parte do cenário, do que propriamente como uma representativa ameaça.
Quando a película invade a sede da Umbrella, no entanto, o diretor retoma as rédeas da ação ao transitar por lugares familiares aos olhos dos fãs da franquia. Embora subaproveite a sensação de angústia em torno de uma cena em específico, uma situação bem orquestrada prejudicada pelo dispensável uso do 3-D, Anderson é virtuoso ao traduzir a vastidão da colmeia, investindo numa ambientação suja e sombria. Mesmo nos momentos mais soturnos, como a sequência da perseguição envolvendo os cães transmorfos, o realizador é virtuoso ao utilizar o contra-luz para ressaltar a ação dos personagens, construindo alguns planos expressivos e divertidos 'jump scares'. Sem querer revelar muito, a cena em que Alice luta pendurada por um cabo é magnífica, assim como o acelerado embate aéreo logo no início da película. Somado a isso, Anderson finalmente acerta ao valorizar a vulnerabilidade e da indomável protagonista, que aqui ganha um desenvolvimento mais humano, ampliando a atmosfera de tensão em torno deste sexto longa. Outro ponto que agrada, e muito, é a sagacidade do diretor ao adotar novamente a estrutura dos games, investindo não só numa linha narrativa crescente, com direito a cenários variados e aos populares chefes de fase, como também numa criativa e interativa interface gráfica.
Com um clímax engenhoso e tecnicamente bem executado, potencializado pela elegante fotografia interna de Glen MacPherson (Rambo IV), Resident Evil: O Capítulo Final oferece um desfecho digno para a jornada de Alice. Por mais que o argumento se apoie em pequenas conveniências, Paul W.S. Anderson é criativo ao descortinar os interesses da Umbrella Corporation, mostrando um pleno domínio sobre a sua "criação" ao amarrar as pontas soltas da saga de maneira esperta e sucinta. Impulsionado pelo carisma e a presença física da sua "musa" Milla Jovovich, novamente impecável como a retilínea força motora desta releitura cinematográfica, o diretor norte-americano conclui uma franquia que traz consigo o rótulo de sobrevivente, afinal de contas é possível contar nos dedos as adaptações de games que conseguiram passar do seu segundo filme.
Quando a película invade a sede da Umbrella, no entanto, o diretor retoma as rédeas da ação ao transitar por lugares familiares aos olhos dos fãs da franquia. Embora subaproveite a sensação de angústia em torno de uma cena em específico, uma situação bem orquestrada prejudicada pelo dispensável uso do 3-D, Anderson é virtuoso ao traduzir a vastidão da colmeia, investindo numa ambientação suja e sombria. Mesmo nos momentos mais soturnos, como a sequência da perseguição envolvendo os cães transmorfos, o realizador é virtuoso ao utilizar o contra-luz para ressaltar a ação dos personagens, construindo alguns planos expressivos e divertidos 'jump scares'. Sem querer revelar muito, a cena em que Alice luta pendurada por um cabo é magnífica, assim como o acelerado embate aéreo logo no início da película. Somado a isso, Anderson finalmente acerta ao valorizar a vulnerabilidade e da indomável protagonista, que aqui ganha um desenvolvimento mais humano, ampliando a atmosfera de tensão em torno deste sexto longa. Outro ponto que agrada, e muito, é a sagacidade do diretor ao adotar novamente a estrutura dos games, investindo não só numa linha narrativa crescente, com direito a cenários variados e aos populares chefes de fase, como também numa criativa e interativa interface gráfica.
Com um clímax engenhoso e tecnicamente bem executado, potencializado pela elegante fotografia interna de Glen MacPherson (Rambo IV), Resident Evil: O Capítulo Final oferece um desfecho digno para a jornada de Alice. Por mais que o argumento se apoie em pequenas conveniências, Paul W.S. Anderson é criativo ao descortinar os interesses da Umbrella Corporation, mostrando um pleno domínio sobre a sua "criação" ao amarrar as pontas soltas da saga de maneira esperta e sucinta. Impulsionado pelo carisma e a presença física da sua "musa" Milla Jovovich, novamente impecável como a retilínea força motora desta releitura cinematográfica, o diretor norte-americano conclui uma franquia que traz consigo o rótulo de sobrevivente, afinal de contas é possível contar nos dedos as adaptações de games que conseguiram passar do seu segundo filme.
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