Aposta segura
Em time que está ganhando não se mexe. Seguindo este velho dito popular,
Minha Mãe é uma Peça 2 é uma aposta segura que não decepciona. Fiel à fórmula
familiar do bem sucedido primeiro longa, a comédia dirigida por César Rodrigues
(Vai que Cola: O Filme) não se faz de rogada ao reciclar a maioria dos temas do
seu antecessor, que aqui ganham uma roupagem mais vistosa e cinematográfica.
Por mais que a irreverente relação entre esta estressada mãe e os seus dois
erráticos filhos siga valendo o ingresso, a impressão que fica é que a
continuação se prende demais ao talento do ator Paulo Gustavo, novamente
impagável na pele da cativante Dona Hermínia. Na verdade, embora o verborrágico protagonista siga arrancando generosas risadas, o filme traz em sua premissa elementos novos que mereciam um espaço maior dentro da trama, mas que são "asfixiados" pela onipresença insana desta carismática figura materna.
Com argumento assinado pelo próprio Paulo Gustavo, em parceria com a
dupla Fil Braz e Rafael Dragaud, Minha Mãe é uma Peça 2 não oferece nada de
muito novo quando o assunto é a sua estrutura narrativa. Assim como no
divertido primeiro longa, o despretensioso roteiro se sustenta basicamente na
disfuncionalidade desta hilária família e nos dilemas maternos em torno do
processo de amadurecimento dos filhos. Além disso, ainda que inseridos numa
nova perspectiva, os arcos dos protagonistas também são nitidamente
requentados. Desta forma, temos novamente uma mãe à beira de um ataque de
nervos precisando lidar com o distanciamento dos filhos, um rapaz carismático
em dúvidas quanto a sua sexualidade e uma jovem acima do peso em busca da
afirmação como uma adulta. Na trama, após o sucesso do seu 'talk-show' matinal,
Dona Hermínia se mudou para um luxuoso apartamento. Os seus problemas
familiares, porém, continuavam os mesmos: os dois filhos. Enquanto a agitada
Marcelina (Mariana Xavier) vinha tendo dificuldades para concretizar o seu
sonho de ser atriz, o afetado Juliano (Rodrigo Pandolfo) repentinamente se
sentiu em dúvidas sobre a sua homossexualidade. Irritada com a falta de rumo na
vida dos jovens, esta asfixiante mãe é pega de surpresa no momento em que
Marcelina recebe uma oportunidade de emprego em São Paulo. Já sentindo os
efeitos do iminente distanciamento, Hermínia precisará com outros problemas,
entre eles a fragilidade da sua queria tia Zélia (Suely Franco) e o inesperado
retorno da sua espevitada irmã Lucia Helena (Patricya Travassos).
Enquanto comédia, Minha Mãe é uma Peça 2 mantém o bom nível do original. Por mais que o argumento recicle algumas das gags já apresentadas no primeiro longa, uma solução que, inegavelmente, reduz o senso de ineditismo em torno desta sequência, o diretor César Rodrigues é habilidoso ao dar a
liberdade necessária para que Paulo Gustavo pudesse brilhar. Com um texto
consistente em mãos e um forte poder de improviso, o ator arranca sucessivas
risadas com os surtos estressados da Dona Hermínia, principalmente na relação
com os seus carismáticos filhos. Completamente à vontade em cena, o trio Paulo
Gustavo, Mariana Xavier e Rodrigo Pandolfo esbanja química ao traduzir os
conflitos desta disfuncional família brasileira, transitando com leveza e
energia por temas extremamente universais. Sem querer revelar muito, a sequência
em que Dona Hermínia decide se submeter a uma bateria de exames é impagável,
assim como o inusitado confronto envolvendo um assaltante maltrapilho. A grande
novidade desta continuação, porém, reside na presença da divertida Patriciya
Travassos. De volta aos holofotes, a atriz adiciona uma dose a mais de
irreverência ao interpretar a moderna Lucia Helena, uma tia descolada que
retorna ao Brasil após um longo período nos EUA. Dona de um ferino senso de
humor, a indomável personagem já diz ao que veio logo na sua primeira cena, um
momento "libertador" envolvendo a saudade dos xingamentos
brasileiros. Até em cima disso, aliás, mesmo limitado pela baixa classificação
etária, Rodrigues é mais honesto ao traduzir as trocas de ofensa entre os
protagonistas, abrindo um bem vindo espaço para as expressões mais
"mundanas".
Na tentativa de enfatizar os requentados conflitos da Dona Hermínia, no
entanto, Minha Mãe é uma Peça 2 falha ao trabalhar estes elementos
mais inéditos. Apesar de trazer um inegável frescor ao filme, a engraçadíssima
Lucia Helena funciona apenas como um subaproveitado alívio cômico. O mesmo,
aliás, acontece com a certinha Iesa (Alexandra Richter), uma personagem
divertida que, após protagonizar uma sólida subtrama no original, surge em cena
de maneira quase protocolar. Além disso, apesar de promissor, o pano de fundo
dramático presente nesta continuação flerta perigosamente com o melodrama.
Assim como no primeiro longa, o argumento resolve abrir uma brecha para
assuntos mais densos, mas o desenvolvimento deles não se revela tão natural.
Embora a veterana Suely Franco mostre sensibilidade ao traduzir os problemas de
saúde da cativante Tia Suelly, o roteiro é preguiçoso ao arquitetar este sincero
arco, esvaziando algumas das intimistas questões familiares em prol de
situações que já haviam sido utilizadas na película anterior. Um deslize
potencializado pela pesada direção de Cesar Rodrigues que, embalado por uma
genérica e sentimentalista trilha sonora, não parece capaz de explorar o tema
em sua plenitude. Em contrapartida, o realizador é bem melhor resolvido no que
diz respeito à construção do filme como um todo, principalmente dos segmentos
cômicos, fazendo um uso mais apurado de elementos como os variados cenários e a
cuidadosa direção de arte.
Sem meias palavras, Minha Mãe é uma Peça 2 tem visual de cinema, coisa
que o primeiro filme não tinha. Num todo, porém, apesar do bom nível das piadas
e das afiadas performances do talentoso elenco, a continuação perde vigor em
relação ao original ao se sustentar basicamente na mesma estrutura narrativa do
seu antecessor. O que, verdade seja dita, não chega a ser um grande problema,
principalmente junto àqueles que curtiram o divertido primeiro filme.
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