O seu nome pode até não ser tão reconhecido pelo grande público, mas Robert Zemeckis é um daqueles raros realizadores que ao longo de uma celebrada carreira se tornou sinônimo de entretenimento de qualidade. Pupilo do renomado Steven Spielberg, o versátil diretor cresceu em Hollywood aliando tecnologia à suas humanas produções, o que fica evidente no seu mais novo lançamento: o biográfico A Travessia (confira a nossa opinião aqui). Acompanhando a história real do francês Philippe Petit, um acrobata que na década de 1970 atravessou as torres gêmeas do World Trade Center caminhando sobre um cabo de aço, o longa estrelado pelo talentoso Joseph Gordon-Levitt chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira (8) prometendo um vertiginoso relato sobre este feito. Desde a fantástica primeira prévia, quando percebemos o potencial escondido por trás desta sufocante premissa, o longa rodado com o que de melhor a tecnologia tem a oferecer - 3-D e IMAX - vem arrancando elogios da crítica internacional ao traduzir visualmente a angustiante experiência do equilibrista europeu. Aproveitando então o retorno de Robert Zemeckis aos cinemas, confira nesta matéria especial um pouco mais sobre a popular trajetória do "pai" da trilogia De Volta para o Futuro.
Nadando contra a produção em escala industrial de Hollywood, seu último lançamento aconteceu no ano de 2012, Robert Zemeckis é acima de tudo um grande captador de trabalhos. Especialista em efeitos especiais, o realizador parece não contentar em entregar "mais do mesmo", passeando pelos gêneros através de tramas universais, cômicas e extremamente atraentes. Formado na Escola de Televisão e Cinema da Universidade do Sul da Califórnia, onde conheceu o roteirista e seu recorrente colaborador Bob Gale, Zemeckis chamou a atenção de Spielberg ainda na faculdade com o curta metragem Field of Honor (1973). Com o apoio deste mentor de luxo, o diretor estreou em Holywood com os divertidos Febre da Juventude (1978) e Carros Usados (1980). Mesmo sem impressionar o público da época, Zemeckis deixou um promissor cartão de visitas, dominando um estilo descompromissado de comédia que viria a se tornar corriqueira na década de 1980. Embalado pelo estrondoso êxito de Os Caçadores da Arca Perdida (1981), Robert Zemeckis alcançaria o seu primeiro sucesso de público ao dirigir e roteirizar o aventureiro Tudo por uma Esmeralda (1984). Com Michael Douglas e Kathleen Turner (foto acima) como protagonistas, esta vibrante caça ao tesouro arrecadou quase US$ 150 milhões ao redor do mundo, preparando o terreno para o maior e mais icônico lançamento de sua carreira.
Um ano depois, Zemeckis veria a sua carreira alcançar um outro patamar com o fantástico De Volta Para o Futuro (1985). Num daqueles projetos ainda hoje celebrados, em 2015, aliás, o longa comemora trinta anos de lançamento, o cineasta trouxe a ficção científica para as comédias adolescentes ao narrar a hilária viagem temporal protagonizada pelo jovem Marty McFly. Recheado sacadas absolutamente geniais, o longa estrelado por Michael J. Fox e produzido por Spielberg virou referência dentro da cultura pop, comprovando o faro do diretor na produção de blockbusters. Com orçamento de US$ 19 milhões, o longa faturou impressionantes US$ 381 milhões ao redor do mundo, nos brindando com uma adorável e bem humorada aventura com toques Sci-Fi. Surfando a maior onda de sua carreira, Robert Zemeckis resolveu não ter pressa e preparou cuidadosamente o seu próximo trabalho. Na vanguarda da mistura entre animação e 'live action', o realizador surpreendeu a todos com o ousado, vibrante e tecnicamente perfeito Uma Cilada para Roger Rabbit (1988). Numa inspirada referência aos clássicos 'noir', a comédia estrelada por Bob Hoskins e pelo coelhão Roger elevou consideravelmente o nível do gênero, se revelando um dos trabalhos mais ambiciosos da carreira de Zemeckis. Numa trabalhosa produção, que se tornou mais cara e demorada do que o previsto, Uma Cilada para Roger Rabbit arrecadou US$ 379 milhões mundialmente, tornando completamente válido o esforço e o pioneirismo tecnológico do diretor.
A volta para o "Futuro" e o sucesso de um contador de histórias
Finalmente dando voz às questões mais mercadológicas, Robert Zemeckis resolveu transformar De Volta para o Futuro em uma trilogia, se antecipando a nomes como os de Peter Jackson (Senhor dos Anéis) ao rodar de uma só vez as Parte 2 e 3 (1989-1990) da franquia estrelada por Michael J. Fox. Exibindo um enorme zelo com a sua "criação", Zemeckis e o roteirista Bob Gale integraram os dois longas à franquia de maneira inspirada, levando Marty McFly a um futurístico ano de 2015 no segundo filme e ao velho oeste no capítulo final. Recebidos novamente com entusiasmo por público e crítica, De Volta para o Futuro 2 e 3 faturaram, respectivamente, US$ 331 milhões e US$ 244 milhões ao redor do mundo, mantendo a carreira de Zemeckis associada às grandes bilheterias. Após dirigir uma aventura com toques de Sci-Fi e uma animação com cara de cinema Noir, o realizador mais uma vez aprontou das suas na engraçadíssima comédia de horror A Morte Lhe Cai Bem (1992). Dialogando com um público mais adulto, Zemeckis resolveu questionar a indústria da beleza, arrancando inúmeras gargalhadas ao acompanhar a tragicômica rivalidade entre as protagonistas interpretadas por Meryl Streep e Goldie Hawn (foto acima). Em meio a fantásticos efeitos especiais, a arrepiante "desconstrução" das duas personagens é impressionante, esta comédia de humor negro somou interessantes US$ 155 milhões em todo o mundo, triplicando o orçamento de US$ 55 milhões.
Colecionando expressivas bilheterias, Zemeckis finalmente teve o seu talento reconhecido pela Academia no magnífico Forrest Gump - O Contador de Histórias (1994). Primeiro capítulo de uma proveitosa parceria com Tom Hanks, a incrível e fabulística jornada do inocente Forrest ganhou contornos sensíveis nas mãos do diretor, emocionando o público e a crítica internacional ao abordar de maneira leve temas sérios e espinhosos. Promovendo um passeio pela história recente dos EUA, Forrest Gump se tornou a maior bilheteria de 1994 em solo norte-americano ao faturar US$ 330 milhões, somando avassaladores US$ 677 milhões mundialmente. Além disso, o longa não só deu ao realizador o seu único Oscar de Melhor Direção, mas também se sagrou vencedor nas categorias Melhor Filme, Ator, Roteiro, Edição e Efeitos Visuais. Consagrado pela indústria de Hollywood, Robert Zemeckis resolveu embarcar em projetos mais sóbrios com a reflexiva ficção científica Contato (1997) e o subestimado suspense Revelação (2000). Seu maior trunfo no ano 2000, no entanto, foi o maduro drama de sobrevivência Náufrago. Novamente ao lado de Tom Hanks, que perdeu quase 20 quilos para dar vida a versão mais desnutrida do seu personagem, Zemeckis explorou como poucos o talento deste expressivo ator, dando a ele o protagonismo absoluto do longa. Comovendo ao narrar a inusitada amizade entre um náufrago e uma bola de vôlei chamada Wilson, a popular película conseguiu US$ 429 milhões ao redor do mundo, mostrando que nas mãos de Zemeckis até um objeto inanimado poderia roubar a cena.
De volta à animação após o revolucionário Uma Cilada para Roger Rabbit, Robert Zemeckis resolveu explorar o recurso da captura de movimentos no audacioso O Expresso Polar (2004). Disposto a aplicar as incríveis possibilidades dos efeitos digitais nos seus comandados, numa técnica já experimentada por Peter Jackson no excelente Gollum em O Senhor dos Anéis, o realizador tirou um enorme proveito deste cada vez mais verossímil advento ao construir um longa animado estrelado por atores. Com Tom Hanks emprestando "magicamente" a sua expressão e movimentos à cinco personagens diferentes, o cativante conto de natal pode não ter conseguido alcançar o realismo esperado, mas representou um novo avanço dentro do gênero. Apesar do alto investimento, cerca de US$ 165 milhões, O Expresso Polar se pagou sem mais problemas ao faturar US$ 301 milhões em todo o mundo. Disposto a incrementar esta experiência, o realizador seguiu se dedicando ao segmento nos igualmente arriscados A Lenda de Bewoulf (2007) e Os Fantasmas de Scrooge (2009). Por mais que as três animações não tenham sido tão rentáveis quanto as principais produções deste realizador, principalmente por seus elevados custos, Zemeckis novamente prestou um enorme serviço ao desenvolvimento desta técnica, mostrando ser capaz - mesmo sem o realismo ideal - de "brincar" com os traços físicos dos seus protagonistas. Como não lembrar do absurdo rejuvenescimento do ator Ray Winstone, que ganhou em Beowulf uma versão mais esguia e forte, ou do envelhecimento do astro Jim Carrey, brilhante ao emprestar a sua personalidade ao "pão duro" Ebenezer Scrooge.
Após esbanjar a sua versatilidade nestas cativantes animações, que, assim como a maioria de suas obras, equilibraram habilmente tecnologia e sentimentos, Zemeckis regressou às produções 'live action' no extraordinário O Voo (2012). Novamente abrindo um generoso espaço para os efeitos especiais, a magistral sequência aérea é de tirar o fôlego, o diretor prefere aqui valorizar a complexa personalidade do seu protagonista, um piloto de aviões viciado que se torna um herói da noite para o dia ao impedir uma gigantesca catástrofe aérea. Embalado pela estupenda atuação de Denzel Washington, magnífico ao capturar as nuances do seus espirituoso personagem, Robert Zemeckis injeta energia neste amadurecido drama, comprovando o seu talento como um grande contador de histórias. E esse talvez seja o principal diferencial deste realizador. Apesar de valorizar com maestria o aspecto visual dos seus projetos, vide o consenso por parte da crítica em torno dos vertiginosos feitos acrobáticos reproduzidos em A Travessia, Zemeckis mostra realmente pleno domínio sobre as emoções dos seus personagens. Nas mãos dele tipos comuns são capazes de viver as mais extraordinárias jornadas, numa ode à pura e simples magia do cinema. Inquieto, versátil e absolutamente criativo, o realizador norte-americano cria uma natural conexão com o seu novo protagonista, um "artista" em busca de novos desafios, fazendo desta procura por novas experiências fílmicas um ingrediente altamente fascinante para nós espectadores. Sou fã dos trabalhos deste cara.
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