Quando a obsessão e a busca pela perfeição se confundem
Grande
vencedor do Festival de Sundance deste ano, Whiplash: Em Busca da perfeição é muito
mais do que uma simples ode ao Jazz. Dirigido pelo prodígio Damien Chazelle (Toque de Mestre), que, com apenas 29 anos, filmou e editou o longa em dez dias, esse intenso drama musical é primoroso ao ressaltar o esforço
técnico por trás do sonho de se tornar uma estrela da música. Se
concentrando na relação de um opressor maestro, numa atuação soberba de
J.K Simmons (Juno), com um pragmático aluno, vivido com energia por Miles
Teller (Finalmente 18), essa obra empolga ao mostrar o quão tênue é a linha entre a obsessão
e a perfeição.
Deixando de lado os clichês envolvendo o dom musical, o longa demonstra
com suor, sangue e intensas cenas o processo de construção e aprendizado envolvendo um musicista. Em meio aos magnéticos solos de bateria, e os muitos
clássicos do Jazz, Chazelle constrói um envolvente argumento, marcado pelas expressivas atuações. Privilegiando o impacto da música, capturada
com propriedade técnica em sua essência mais básica, o roteiro também assinado pelo jovem realizador narra a história de Andrew (Teller), um músico esforçado que se dedica aos estudos numa elogiada universidade de música. Em meio aos treinos numa banda secundária e as praticas solitárias, o baterista vê a sua oportunidade
aparecer ao ser convidado pelo respeitado maestro Fletcher (Simmons) para integrar a banda principal da instituição. O sonho, no entanto,
vira pesadelo quando Andrew percebe toda a tirania e o modo pouco ortodoxo
com que ele comanda os seus músicos. Disposto a se tornar o baterista nº 1, o jovem inicia um duro processo de treinamento ultrapassando os seus limites em
busca da perfeição.
Por mais que a atmosfera musical tenha grande função na trama, o intenso argumento de Damien Chazelle se concentra no duelo entre o impiedoso Fletcher e o obcecado Andrew. Sem perder muito tempo com subtramas e personagens secundários, já que a personalidade dos dois é apresentada com brilhantismo através da relação com a música, o roteiro é objetivo ao conduzir a parceria explosiva entre mentor e aluno. De um lado temos um politicamente incorreto maestro, que não poupa esforços, nem ofensas, para revelar um novo grande nome do Jazz. Do outro um aluno subestimado pela própria família, que parece obstinado a conquistar o seu espaço dentro da música. Desenvolvendo com perícia essas duas figuras aparentemente opostas, que se aproximam durante esta surtada jornada em busca de um diferencial, o ágil argumento explora com destreza a tensão por trás dos humilhantes ensaios, tornando o aprendizado de Andrew uma experiência quase torturante. A cena em que o baterista é forçado a ultrapassar os seus limites de velocidade, por si só, já resumiria bem essa pressão imposta pelo professor.
O tom opressor em torno de Fletcher, porém, ganha contornos ainda mais particulares graças ao reconhecido senso de humor de J.K Simmons. Indo do afetuoso ao insano na velocidade de um baterista, o ator transmite uma sensação única de instabilidade, tornando suas "aulas" uma experiência repleta de energia e surpresas. Se esquivando completamente do tom caricato, Simmons consegue manter uma aura misteriosa, que se mostra igualmente capaz de comover com traços de humanidade, ou de revoltar com os seus métodos nada ortodoxos. Na verdade, por mais que as suas atitudes criem um misto de risos e raiva, as motivações do maestro ganham certo fundamento através desta desesperada busca por uma nova esperança para o Jazz.
Perante essa figura quase ditatorial, Miles Teller entrega um daqueles desempenhos capazes de mudar o rumo de uma carreira. Se aproveitando da maturidade demonstrada por Chazelle, que consegue capturar de forma bem particular a visceral evolução\transformação de Andrew, essa desconstrução emocional do personagem chama a atenção, rendendo cenas igualmente impactantes. Além disso, o jovem ator convence como um baterista prodígio, entregando performances arrebatadoras. Momentos que não só apagam alguns pequenos deslizes da trama, como a falta de profundidade na relação dele com a namorada (Melissa Benoist), como também conduzem o espectador até um desfecho apoteótico.
Num ano marcado pela integração precisa entre a música e o cinema, vide o sucesso da "ópera pop" Guardiões da Galáxia, do drama country Alabama Monroe e do romance "indie" Mesmo se Nada der Certo, Whiplash - Em Busca da Perfeição mostra maturidade ao destacar que o talento é apenas o ponto de partida. Se apoiando no magnetismo desta relação entre mestre e discípulo, magnificamente concebida pelo jovem Damien Chazelle, este denso drama musical coloca novamente o Jazz no centro das atenções. Uma obra repleta de ritmo e estilo que, além de promover uma pertinente crítica sobre os limites do aprendizado, é digna ao universalizar este tão esquecido gênero musical.
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