Explorando toda a sensualidade e o talento da musa Scarlett Johansson, Sob a Pele é mais um daqueles trabalhos de difícil digestão para o grande público. Com potencial para se tornar um futuro filme Cult, o longa dirigido por Jonathan Glazer (A Reencarnação) nos surpreende ao adicionar um improvável ar contemplativo à sua história. Primoroso ao realçar a estética sensorial da trama, com direito a poucas falas e uma impressionante trilha sonora, Glazer consegue criar uma curiosa fábula sobre a humanidade. Uma experiência cinematográfica particular que, no entanto, flutua entre a expressividade e a monotonia.
Com base na obra do escritor holandês Michel Faber, o argumento assinado por Glazer e Walter Campbell apresenta um conteúdo bizarramente magnético aos olhos do espectador. Apesar do ritmo extremamente lento e da trama supostamente complexa, o longa compensa muitas de suas falhas com um visual realmente impactante, que passa a ser um capítulo a parte dentro do inusitado roteiro. A começar pelo instigante e subjetivo jogo de imagens na abertura do filme, na minha modesta interpretação, o mais próximo que a trama chega de explicar a origem dos seus alienígenas. Sem se aprofundar nas questões mais Sci-Fi envolvendo os personagens, somos então apresentados a voraz alienígena vivida por Scarlett Johansson. Uma criatura bela e inexpressiva que vaga pelas ruas da Escócia à procura de homens solitários. Usando do seu charme e apelo sexual, a alien seduz as suas vítimas e as atraindo para a morte dentro de sua grande van. Se mostrando fria em relação aos sentimentos humanos, a criatura acaba se confundindo ao conhecer uma deformada vítima (Adam Pearson). Um homem solitário e tímido que atrai o seu interesse pessoal. Disposta a entender um pouco mais da complexidade humana, ela passa a tentar experimentar as nossas emoções, sem saber quais seriam as consequências das suas atitudes.
Se apoiando em uma série de inexpressivas metáforas, quase sempre contemplativas, o diretor Jonathan Glazer opta por dar uma roupagem complexa a uma trama essencialmente simples. Por mais que as excêntricas escolhas do diretor criem uma aura enigmática para o longa, o desenrolar da história mostra justamente o contrário e surpreende pela sua clareza. Trabalhando com atores amadores e raros diálogos, a maioria deles frágeis e descartáveis, resta à gélida e impecável Scarlett Johansson (Capitão América 2) a missão de nos fazer resistir a incomoda primeira metade da trama. Ainda que todo o cuidado com o aspecto sensorial chame a atenção, culminando na impactante cena da praia, Glazer parece se perder em meio a sua própria pretensão. Após apresentar o interessante "modus operandi" da alienígena, com direito ao inquietante, experimental e obscuro ritual de abdução, o longa parece se prender demais as "investidas" da criatura, tornando-se assim repetitivo e frio.
Essa frieza narrativa, no entanto, fica de lado com a aparição do ator Adam Pearson. Sofrendo de neurofibromatose, uma anomalia que desfigura o rosto de seu portador, o ator se torna a ponte ideal para a humanização não só da alienígena, mas também da própria história. Apesar da pequena participação, Adam é explorado sem qualquer tipo de preconceito, contrastando de forma ímpar com a beleza de Scarlett Johansson. Ao longo deste processo de humanização, aliás, Glazer consegue encontrar soluções bem mais certeiras, principalmente na condução da transição de sua protagonista. Contando com a entrega total de Scarlett, que impressiona como uma evolutiva alienígena, o realizador deixa de lado a pose e passa a ser mais direto em sua abordagem. Todo esse - improvável - processo de (re)conhecimento dos sentimentos humanos é explorado de forma original por Glazer, rendendo ótimos momentos. A cena do tão comentado nu frontal de Scarlett Johansson, por exemplo, é de uma inocência tocante, assim como boa parte das suas experiências dentro desta nova realidade. Dentro deste contexto, inclusive, toda a crítica ao comportamento humano ganha realmente significância, com destaque para a forma como o roteiro inverte os papéis e explora o impacto dos novos sentimentos na existência da extraterrestre.
Embalado pela sufocante trilha-sonora composta pelo estreante Mica Levi, ao lado de Scarlett Johansson o único ponto inquestionável da projeção, Sob a Pele é um daqueles trabalhos difíceis de serem resumidos em palavras. Completamente excêntrico e anticomercial, o Sci-Fi dirigido por Jonathan Glazer é a típica obra instigante, que exige uma participação maior do espectador. Apesar da impressionante experiência sensorial possibilitada pelo longa, o ritmo lento e a nítida pretensão dos realizadores acaba diluindo boa parte dos acertos do promissor argumento. Futuramente, Sob a Pele pode até ganhar o rótulo de Cult, mas no momento não deve comover a nossa geração.
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