domingo, 23 de agosto de 2020

Top 10 | Os Melhores Filmes do Primeiro Semestre



Hoje é dia de Top 10. Hoje é dia de relembrar o melhor do cinema em 2020 até aqui. Sim meus amigos, estamos tendo cinema neste ano trágico. Mesmo diante de todas as limitações causadas pelo isolamento social, ora e vez somos pegos de surpresa com alguns belos lançamentos. O que fica bem claro nesta lista. Tomando como base o lançamento oficial no Brasil, neste post preparei um Top 10 com os melhores filmes do primeiro semestre. Sentiu falta de algum filme? Concorda? Discorda? Participe nos comentários. 


10º The Vast of Night (2019)



Uma história, quando bem contada, não precisa ser gráfica para impactar. Basta saber explorar\estimular a curiosidade\medo do público. Dotado deste espírito, A Vastidão da Noite surpreende ao alimentar o sentimento de angústia no espectador sem apelar para a banalização das imagens. Distribuído pela Amazon Studios, o imaginativo longa de estreia do diretor Andrew Patterson faz um brilhante uso da atmosfera na construção de uma ficção científica raiz. O tipo de obra imersiva que convida o público a experimentar o crescente mistério, a criar imagens a partir dos diálogos, a se deixar levar pelas impactantes descobertas de dois jovens dos anos 1950 unidos por uma misteriosa transmissão.

9º Destacamento Blood (2020)

Poucos realizadores têm tanta propriedade para falar sobre o racismo enraizado nos EUA quanto Spike Lee. Suas obras escancaram a verdade nua e crua. Ele se acostumou a dar voz ao que sempre foram silenciados. A expor a realidade das ruas. As feridas de um ambiente desigual. A guerra urbana do nosso dia a dia que segue ceifando vidas negras. Em Destacamento Blood, Spike Lee discute a formação da identidade do afro-americano nos EUA num microcosmo complexo e raivoso. Ao contrário do empoderador Infiltrado na Klan (2018), o cultuado cineasta “corta na própria carne” ao traduzir o efeito insano da natureza bélica neste dilacerante processo. Os pecados de “guerra”, aqui, são chagas humanas que podem até manchar as virtudes dos seus personagens, mas nunca as apagam. Os pecados são parte de um círculo vicioso que Lee ataca com inigualável veemência numa obra talvez menos sofisticada que o seu último grande projeto, mas não menos contundente. 

8º Jojo Rabbit (2019)


Em pleno 2020, Jojo Rabbit é (pasmem) ainda um filme necessário. Títulos com a autenticidade da obra de Taika Waititi são importantes por mostrarem que ninguém está imune ao fantasma da opressão. E que ninguém deve esquecê-lo. Um dos filmes mais corajosos lançados nos últimos anos, o longa compensa as suas pequenas falhas e excessos com inteligência e um feroz viés crítico. Por mais que as feridas causadas pela Segunda Guerra Mundial ainda sejam dolorosas para muitos, o que valida a rejeição daqueles que sentiram na pele as chagas deste conflito, a opção de rir dos fanáticos (e por consequência do fanatismo) surge como uma arma poderosa nas mãos do criativo cineasta neozelandês. Waititi não quer apenas traduzir a dor das vítimas, algo que o faz com surpreendente contundência. Ele quer humilhar os nazistas, ele quer escancarar o absurdo do discurso ariano, ele aponta o dedo para todos os que compartilharam (e ainda compartilham) desta abominável mentalidade e os trata como o pior dos idiotas. 

7º Corpus Christi (2019)

Indicado polonês ao Oscar deste ano, Corpus Christi provoca ao discutir o perdão dentro de um impactante contexto urbano. O contundente diretor Jan Komasa foge do lugar comum ao tratar o reformatório como uma espécie de seminário na vida de um jovem delinquente à procura de redenção. Numa potente parábola religiosa, o cineasta europeu escancara a hipocrisia de um sistema punitivo. O jovem Daniel (Bartosz Bielenia) tinha um dom. Um talento subaproveitado. Esmagado pela realidade. Komasa não precisa expor o que parece claro. Ali estava alguém que sofreu desde cedo. Que se formou na rotina da violência. Embora se sustente em algumas óbvias conveniências narrativas, Corpus Christi promove uma reflexão ao questionar àqueles que não põem em prática aquilo que acreditam e o estrago causado por eles. O perdão é transformador. A desigualdade também. 

6º A Despedida (2019)



Baseado numa mentira real, A Despedida é um filme maravilhoso. Um drama familiar espirituoso que encanta ao ressignificar a sua potente reflexão sobre o fim da vida. Lulu Wang encontra numa agridoce volta para casa a chance de discutir o choque entre o moderno e o tradicional. O que a diretora faz é não se apegar ao lugar comum. Inspirado nas suas próprias experiências, o drama sobre uma jovem obrigada a esconder da sua querida avó que ela estava gravemente doente ganha um novo sentido à medida que a morte vira o ponto de partida para uma discussão sobre o futuro.

5º Waves (2019)



Uma crônica urbana impactante, Waves esbanja potência dramática ao refletir sobre os desafios de se criar uma família na estrutura disfuncional em que habitamos. O talentoso diretor Trey Edward Shults toca em temas tão identificáveis e com tanta intimidade que fica impossível não se reconhecer nos personagens. Não experimentar a dor deles. Não notar os perigos escondidos no comportamento deles. Com um olhar muito cuidadoso, o cineasta propõe um estudo sobre a formação individual. Sobre as imposições que aprisionam, que angustiam, que machucam. E o estrago causado por elas. 

4º O Farol (2019)

Como ficar impassível a um filme como O Farol? Gostar ou desgostar é irrelevante. O diretor Robert Eggers quer a sua atenção. Tudo para propor uma venal alegoria sobre o poder e o efeito sedutor dele sobre dois faroleiros isolados numa ilha. O que falar das poderosas atuações de Robert Pattinson e Willem Dafoe. Independente da leitura que o público faça sobre a obra, os dois mergulham na psique dos seus personagens, na relação passivo\agressiva e na degradação emocional deles diante da cegueira. Um processo desconstrução que assombra pela realidade impressa nele.

3º Joias Brutas (2019)


Com Bom Comportamento (2017), os irmãos Benny e Josh Safdie entraram no radar de Hollywood com total merecimento. Estiloso, enervante e vigoroso, o thriller estrelado por Robert Pattinson ganhou quase que instantaneamente um status cult. Eles passaram a ser vistos, comentados, elogiados. O que, naturalmente, gerou certa expectativa quanto aos próximos projetos da dupla. Muitos outros realizadores já estiveram nesta posição e não conseguiram entregar um segundo ‘hit’. E o patamar estabelecido pelo primeiro era por si só alto. Em Joias Brutas, porém, o que vemos não é uma produção à altura do seu trabalho anterior. É melhor, mais intensa e ainda mais impactante. Embora, no papel, o longa estrelado por Adam Sandler traga consigo um pouco da dinâmica de Bom Comportamento, os Irmãos Safdie elevam o nível da brincadeira numa obra elétrica, implacável e bem mais perigosa. Um estudo sobre a natureza daqueles que fazem da sua vida uma grande aposta ao ponto de não conseguirem distinguir mais a ambição da ganância. 

2º O Homem Invisível (2020)


Mais do que atualizar um clássico com genialidade, O Homem Invisível alia a construção temática à visual como há muito não se via no segmento. Um triunfo do cinema de horror moderno marcado não só pelo potente comentário social, mas pela magnífica execução. O que o diretor Leigh Whannel faz aqui é impressionante. Estamos diante de uma obra capaz de explorar todo o potencial de um gênero. Ao trazer o elemento fantástico para o mundo real, o cineasta catalisa a tensão a partir da identificação. Sem dizer uma só palavra, O Homem Invisível causa uma angústia inimaginável logo na cena abertura. E segue assim até o fim. Com um roteiro sólido, uma protagonista brilhantemente escrita e uma visão própria sobre horror moderno, o longa elimina o fantástico à medida que torna tudo o mais real possível. Tal qual uma relação abusiva, um filme que sufoca do primeiro ao último minuto de projeção.

1º Retrato de Uma Jovem em Chamas (2019)



Retrato de Uma Jovem em Chamas é um dos mais belos, poéticos e profundos exercícios de metalinguagem que o cinema já viu. Tal qual a sua empoderada protagonista, uma talentosa artista contratada para pintar o retrato de uma jovem reclusa prometida em casamento a um estranho, a expressiva diretora Céline Sciamma (Garotas) começa com uma tela em branco. A realizadora se dispõe a ir além da moldura. Ela captura a alma de duas mulheres distintas unidas pelo amor, pela dor, pela solidão, pela indignação. Retrato de uma Jovem em Chamas, em sua essência, é um filme (quer dizer, uma pintura) sobre o SER FEMININO em tempos de desigualdade, de repressão afetiva, de pressões e imposições. O foco de Sciamma não está naquilo que mudou, mas naquilo que permanece, que delimita, asfixia e afasta. No fim, porém, ficam as experiências vividas, as memórias criadas. Fica a chama que nunca irá se apagar. Nos seus últimos segundos, cabe a Céline Sciamma capturar a verdade da retratada, a emoção viva que nasce da catarse. O mais poderoso, simbólico e visualmente estonteante retrato pintado em tempos.

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