Vou ser bem sincero. Eu não sou o
público alvo de Para Todos os Garotos que Já Amei: P.S. Ainda Amo Você. Acho
que quem ler este texto precisa ter noção disso. Entendo totalmente o potencial
frisson em torno desta nova franquia da Netflix. Em especial junto aos mais
jovens. Estamos diante de uma comédia romântica ‘teen’ bem dirigida, com um “envelopamento”
descolado, personagens carismáticos e um elenco jovem recheado de talentos
promissores. O primeiro longa, confesso, me cativou pela autenticidade, pela
forma com que brincava com os clichês deste adocicado segmento. Uma obra que,
embora sob um viés demasiadamente “inocente”, conseguiu mergulhar com
propriedade nas inseguranças de uma jovem romântica às avessas com os seus
próprios sentimentos. O que vemos em P.S Ainda Amo Você, no entanto, é algo bem
mais formulaico e previsível. Agora sob a estilosa batuta de Michael Fimognari
(diretor de fotografia de Doutor Sono e A Maldição da Residência Hill), a continuação
decepciona ao se alimentar dos mesmos clichês que antes parecia renegar. Uma
dieta doce e requentada que poderia até ser levemente apimentada se o roteiro aproveitasse
todo o potencial dos seus personagens.
Tal qual no antecessor, Para
Todos os Garotos: P.S. Ainda Amo Você acerta ao mais uma vez mergulhar no
turbilhão de emoções experimentados pela jovem Lara Jean (Lana Condor). Ter um
namorado, o bonitão popular Peter (Noah Centíneo), não a tornou menos confusa.
Muito pelo contrário. Agora no time dos compromissados, ela precisa começar a
conviver com sentimentos ainda mais complexos, entre eles a atração física, o ciúme,
a frustração, as incertezas quanto ao futuro da relação. A princípio, um
material bem mais rico para ser trabalhado. Ao invés de desmistificar este
processo de descobertas, no entanto, a continuação frustra ao tornar tudo o
mais clichê possível. Entenda, a imaturidade afetiva de Lara não é o problema.
Pelo contrário, enquanto o foco está nela o argumento assinado por Sofia
Alvarez e J. Mills Goodloe consegue pintar um retrato extremamente reconhecível
desta fase da vida. Pueril, mas identificável. O problema é que, ao contrário de
Para Todos os Garotos que eu Já Amei (2018), a sequência olha pouco para a
intimidade de Lara Jean. O filme externaliza mais do que internaliza. Passagens
como a cena em que, durante uma troca de beijos no carro, ela “ouve” a
ex-namorada de Peter provocando a sua autoestima, se tornam bem mais raras
aqui. São nestes momentos que os dois longas melhor entendem\traduzem a
protagonista. Os seus medos, anseios, inseguranças. E eles fazem falta.
Até porque as opções encontradas
para instigar a desordem de Lara Jean são absurdamente clichês. Em alguns
momentos parece que o roteiro de P.S Ainda Amo Você meio que infantiliza a
personagem. Não respeita a natureza daquela jovem mulher. Se por um lado o
longa é assertivo ao trata-la como uma pessoa com desejos, uma
adolescente capaz de olhar para um outro garoto da sua vida e se sentir atraída,
por outro ele vacila ao torná-la quase que refém dos seus sentimentos nesta continuação.
Eu senti a falta do olhar feminino do longa original. Por mais que,
esteticamente, Michael Fimognari entregue um trabalhado até superior na
comparação ao antecessor, a cena da separação no aquário, em especial, é
memorável, a protagonista me pareceu mais inerte sob o seu comando. O triângulo
amoroso proposto surge de forma aleatória. O clima de romance flerta com a
breguice em vários momentos. Além da nula química com Lara, John Ambrose
(Jordan Fisher) não consegue apimentar a trama. A paixonite infantil não se
justifica como um agente catalisador, principalmente pelo pouquíssimo tempo
separando entre os dois títulos.
O que mais me incomodou em P.S.
Ainda Amo Você, na verdade, é o descuido com os personagens de apoio. A jornada
de amadurecimento de Lara é enfraquecida pela maneira com que o argumento
explora (ou melhor, não explora) peças importantes. O humor, por exemplo, se
esvai à medida que a pequena Kitty (Anna Cathcart) sai de cena. Em mãos mais
atentas, a relação entre Lara e a veterana vivida por Holland Taylor poderia ter
rendido muito mais. Claramente a protagonista
tinha muito a aprender com ela enquanto mulher. Fimognari, por sua vez, prefere
tratá-la quase que como uma “fada madrinha”. O angustiado insight de Lucas (Trezzo Mahoro), o amigo gay da protagonista, poderia ter ganho desdobramentos bem mais interessantes também. É na relação entre Lara e a
magoada\ardilosa Gene (Emilija Baranac),
no entanto, que reside o maior problema de P.S Eu Ainda Amo Você. A “rival” do
primeiro filme, me arrisco a dizer, possuía um arco até mais complexo do que o
de Lara. Sob a perspectiva dela, as coisas poderiam ganhar um novo sentido.
Pena que o longa se contenta em apenas sugerir isso.
Claudicante enquanto ‘coming of age movie’, clichê enquanto comédia
romântica, Para Todos os Garotos: P.S. Eu ainda amo você se sustenta
verdadeiramente no carisma do elenco. A energia da continuação segue na
expansiva Lana Condor, na irônica Anna Cathcart, no magnetismo de Noah Centíneo,
na maturidade de Holland Taylor. Um time entrosado e talentoso que, combinado
com a excelente trilha sonora e a vistosa fotografia em tons azulados, impede que
o longa não tenha sabor. O que é bem pior do que a doçura excessiva. E “parta o
meu coração” é uma bela frase de conquista.
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