É inegável que Tobey Maguire escreveu o seu nome no universo
super-heroico ao interpretar o popular Homem-Aranha no início dos anos 2000.
Sob a batuta do inventivo Sam Raimi, o ator, considerado velho demais para o
papel na época, superou as incertezas ao criar um Peter Parker sensível e
altruísta, se tornando um dos pilares na ascensão do gênero ao protagonizar o
magnífico Homem-Aranha 2 (2004), um dos melhores filmes de super-herói de todos
os tempos. Apesar da indiscutível dedicação de Maguire, entretanto, o fato é
que o "amigão da vizinhança" dos quadrinhos, o adolescente nerd e
deslocado, ainda não tinha pintado nas telas grandes. Até agora. De longe uma
das grandes surpresas do excepcional Capitão América: Guerra Civil, a aparição
do novo Homem-Aranha causou um enorme frisson nas redes sociais. Mesmo com
pouco tempo de cena, o herói aracnídeo chegou para aquecer as engrenagens do
Universo Cinematográfico da Marvel, uma presença potencializada pela magnética
presença de Tom Holland. Enérgico, jovial e genuinamente engraçado, o ator inglês abraçou esta grande oportunidade sem titubear, entregando o Peter
Parker que a maioria dos fãs de quadrinhos esperava ver. Um tiro certeiro da
trinca Marvel\Disney\Sony, como podemos perceber na principal estreia deste
final de semana, o aguardado Homem-Aranha: De Volta ao Lar (leia a nossa crítica aqui). Com a idade, a
entrega física e o carisma necessário para dar vida a este popular super-herói,
Holland vem colecionando elogios no seu primeiro filme solo na franquia,
justamente por resgatar o clima descompromisso adolescente perdido nos últimos
filmes baseados na criação de Stan Lee e Steve Ditko. Ele, porém, não foi o primeiro
a "vestir" perfeitamente o uniforme do seu superpoderoso personagem.
E para começar nada melhor do que voltar à origem deste importante
segmento. Lançado em 1978, Superman: O Filme fez história ao trazer o então
desconhecido Christopher Reeve na pele de um dos heróis mais populares das HQ.
Como se não bastasse a incrível semelhança física com o personagem, o dedicado
ator fez jus ao arquétipo do Homem de Aço ao traduzir não só a inocência e o
idealismo do membro da Liga da Justiça, como também a sua inquestionável força.
Equilibrando fisicalidade e talento, Reeve se tornou o Super-Homem da Cultura
Pop, um rótulo consolidado na década de 1990 quando o ator precisou lutar
contra um vilão da vida real: a tetraplegia. Após sofrer um acidente e ficar
paralisado do pescoço para baixo, ele encarou as suas limitações com enorme
resiliência até a sua morte, no ano de 2004, aos 52 anos. Enquanto Reeve se
revelou logo de imediato uma escolha certeira, Tim Burton testou a paciência
dos fãs ao escalar Michael Keaton na pele do lendário Homem-Morcego.
Considerado baixo e "engraçado" demais para o papel, o eterno
Bettlejuice precisou lidar com a desconfiança dos críticos e com a ira dos
leitores mais intransigentes. Reza a lenda, inclusive, que a Warner recebeu
mais de 50 mil cartas com manifestações raivosas envolvendo a escalação de
Keaton. As incertezas, no entanto, cessaram quase que instantaneamente com o
lançamento de Batman (1989). Apesar das enormes diferenças entre o ator e o seu
personagem, o milionário Bruce Wayne, Keaton criou um Batman intenso,
inteligente e com um refinado senso de humor. O herói perfeito para a exótica
releitura proposta por Burton. Mesmo limitado pelos efeitos visuais da época,
vide o seu rígido traje de borracha, Keaton criou um Homem Morcego cinematográfico
e moderno, um anti-herói com nuances bem próprias que só viriam a ser mais bem trabalhadas nas mãos de Christopher Nolan no fantástico Batman: O Cavaleiro das
Trevas (2008).
Quem também precisou conviver com os questionamentos, aliás, foi o então
desconhecido Hugh Jackman. Indicado por Russel Crowe, a primeira escolha para o
papel do selvagem Wolverine, o astro australiano dividiu os fãs ao ser escalado
para dar vida ao desmemoriado Logan. Considerado alto e charmoso demais para o
personagem, Jackman foi uma aposta de risco que deu muito certo. Embora alguns
dos leitores mais exigentes, ainda hoje, lamentem as mudanças físicas e
comportamentais do herói, Jackman conseguiu fazer de Wolverine o símbolo da
franquia X-Men nos cinemas. Dono de um carisma inesgotável, o ator conseguiu
criar uma figura mais real, com conflitos mais humanos, um herói explosivo
introduzido com maestria por Bryan Singer no excelente X-Men: O Filme (2000).
Responsável por alavancar a carreira de Jackman, os mutantes da Marvel se
tornaram peça importante na filmografia do ator, que, mesmo no auge, nunca se
distanciou da franquia. Antes tratado com desconfiança, o Wolverine de Hugh
Jackman manteve a sua popularidade intacta nos 17 anos seguintes, ganhando uma
despedida marcante no primoroso Logan (2017). Um dos pilares na retomada do
gênero, o primeiro X-Men também acertou em cheio ao introduzir os excelentes
Ian MacKellen e Patrick Stewart como os mentores Magneto e Professor Xavier.
Impecável ao resgatar o teor humanista das HQ, Singer encontrou nos veteranos a
experiência necessária para construir duas figuras realmente complexas, dois
amigos separados pela sua ideologia. Enquanto McKellen brilhou ao criar um
antagonista cerebral e imponente, Stewart "deu a cara a tapa" ao
criar um líder sereno e compreensivo, um protagonista conciliador sempre
preocupado com a consequência dos seus atos. Assim como o Wolverine, aliás,
Magneto e Xavier permaneceram nos holofotes ao longo da saga, se mantendo em
evidência mesmo na fase rejuvenescida da franquia.
Diferentemente de Keaton e Jackman, Robert Downey Jr. já contava com a
aprovação do público e da crítica antes mesmo do lançamento de Homem de Ferro
(2008). Com a intenção de recuperar o status da sua carreira após uma série de
polêmicas pessoais, a estrela de Chaplin (1992) foi a escolha perfeita para dar
vida ao bilionário Tony Stark, um fabricante de armas genial e egocêntrico que,
após uma experiência nebulosa, decide usar o seu talento em prol de causas mais
justas. Numa sacada genial, os produtores Kevin Feige e Avi Arad perceberam não
só a nítida conexão comportamental entre Stark e Downey Jr., como também a
inegável semelhança entre herói e protagonista, o transformando na pedra
fundamental do hoje aclamado Universo Cinematográfico da Marvel. No auge da sua
forma, o ator nos brindou com uma performance elétrica, esbanjando magnetismo
ao realçar o melhor deste "esquecido" super-herói. Referência quando
o assunto é a montagem dos seus elencos, a Marvel Studios voltou a acertar em
cheio ao escalar a trinca Chris Hemsworth, Tom Hiddleston e Chris Evans. O mais
conhecido dos três, Evans brilhou ao absorver o misto de ingenuidade e
idealismo do seu Steve Rogers, entregando um Capitão América aparentemente
retrô, mas com a bagagem emocional necessária para crescer nos filmes seguintes
da série. Hemsworth, por outro lado, criou um herói arrogante e bem humorado,
um tipo cativante capaz de abraçar a imponência do seu Thor (2011) sem deixar
de carregar traços bem reconhecíveis dentro da fórmula Marvel. E isso mesmo
dividindo a cena com o excelente Tom Hiddleston. Assim como Downey Jr., o ator
inglês soube aproveitar a chance e transformou o seu Loki num verdadeiro trampolim
para a sua carreira. Num trabalho singular, ele se revelou o melhor antagonista
do UCM, um vilão inteligente, amargurado e multidimensional que conquistou um
genuíno espaço nesta poderosa franquia.
Entre os vilões, aliás, outros dois nomes se tornaram referências dentro
do gênero ao criarem uma estreita conexão com os seus personagens. Com uma
carreira sólida em Hollywood, Alfred Molina se tornou um dos inúmeros trunfos de
Homem-Aranha 2 (2004). Numa opção ousada, já que o ator tinha pouca experiência
no universo blockbuster, o talentoso ator inglês causou inegável estranheza ao
ser escolhido para dar vida ao instável Dr. Octopus. Um sentimento que caiu por
terra logo nos primeiros minutos de projeção. Dono de uma forte veia dramática,
Molina conseguiu criar um antagonista humano e obsessivo, um homem engolido
pelo seu próprio experimento. O vilão que todo grande filme de super-herói
merece ter. Quem realmente sacudiu a estrutura do gênero, entretanto, foi o
saudoso Heath Ledger. No ápice da sua carreira, o ator foi escalado, para a
surpresa de muitos, como o icônico Coringa em Batman: O Cavaleiro das Trevas
(2008). Oriundo das comédias românticas, Ledger precisou conviver com a desconfiança
dos fãs mais intransigentes que, assim como na década de 1980, se manifestaram
veementemente contra a escalação de um "galã" no papel do maior vilão
das histórias em quadrinhos. O diretor Christopher Nolan, porém, sabia muito
bem o que estava fazendo. Com a missão de superar o trabalho de Jack Nicholson
em Batman (1989), Ledger criou um método próprio para encarar uma figura tão
insana. Em comum acordo com o realizador, ele resolveu realçar a faceta mais
anárquica e psicopática do antagonista, se aprofundando na psique do personagem
num processo árduo imortalizado numa performance transcendental. Apesar do
esforço do talentoso Christian Bale, um Homem-Morcego, diga-se de passagem, bem
digno, O Cavaleiro das Trevas foi engolido por um Coringa cerebral e
indecifrável, uma das mais aclamadas figuras vilanescas da história da sétima
arte. Infelizmente, Heath Ledger não conseguiu celebrar o tamanho do seu feito.
Numa tragédia da vida real, o ator faleceu durante a fase de pós-produção, aos
28 anos, vítima de uma intoxicação acidental. A sua performance, no entanto, foi
consagrada por público, crítica e pela Academia, que o premiou com o Oscar
Póstumo de Melhor Ator Coadjuvante pelo seu incrível desempenho.
Michelle Pfeiffer e a ascensão feminina no universo
super- heroico
Hoje uma realidade, vide o incrível sucesso de Mulher-Maravilha, o
protagonismo feminino nos filmes de super-herói custou a ser reconhecido. Uma
das pioneiras no gênero, a talentosa Michelle Pfeiffer exibiu a sua beleza e
carisma ao se tornar a mais perfeita versão da ferina Mulher-Gato, um dos
grandes trunfos do excelente Batman: O Retorno (1992). Embora não fosse a
primeira escolha de Tim Burton, Annette Benning deixou o projeto em função da
sua gravidez, a atriz se dedicou de corpo e alma a sua Selina Kyle, se
"libertando" em cena ao criar uma 'femme fatale' sexy, indomável e um
tanto quanto anárquica. Uma genuína Mulher-Gato. Assim como Pfeiffer, aliás,
quem roubou a cena numa franquia até então majoritariamente masculina foi a
magnética Scarlett Johansson. Com uma carreira construída longe do universoblockbuster, a estrela de Encontros e Desencontros resolveu convencer o diretor
Jon Favreau que estava pronta para brilhar no cinema de ação. Antes mesmo de
ser escalada para o papel, Johansson pintou o seu cabelo de vermelho para
mostrar que seria a Viúva Negra perfeita, uma espiã de passado nebuloso que se
tornou uma peça chave dentro da S.H.I.E.L.D. Diante da dedicação e do nítido
apreço da atriz pela personagem, Favreau deu um voto de confiança. E
provavelmente não se arrependeu disto. De longe o ponto alto do genérico
Homem de Ferro 2 (2010), a letal Natasha Romanoff se tornou um dos pilares do
então ascendente Universo Marvel, uma personagem humana com relevância potencializada pelo charme e pela impressionante entrega física de Scarlett Johansson.
Coube a dobradinha DC\Warner, entretanto, o passo que viria a modificar
o status das heroínas dentro deste concorrido segmento. Na ânsia de construir
uma franquia nos moldes da "concorrência", os executivos do estúdio
resolveram tirar do papel o gigantesco Batman Vs Superman (2016), um épico de
quase três horas que prometia ser um divisor de águas dentro do gênero. Eu
disse prometia. Inchado, apressado e inegavelmente oscilante, o longa dirigido
por Zack Snyder atirou para todos os lados, mas acertou bem menos que o
esperado. Uma destas apostas certeiras, porém, foi a escalação de Gal Gadot
para o papel da icônica Mulher-Maravilha. De longe uma das escolhas mais
questionadas pelos fãs durante a pré-produção do longa, a atriz israelense
precisou conviver com as incertezas durante o processo de filmagens. Considerada alta, bonita e magra demais para interpretar a amazona Diana
Prince, Gadot surpreendeu a todos, me incluo nessa, ao se tornar o ponto
inquestionável do tão comentado A Origem da Justiça. Com uma invejável entrega
física, fruto do seu passado no exército israelense, a atriz escreveu o seu
nome na história do gênero ao protagonizar o aclamado Mulher-Maravilha (2017),
o primeiro filme solo estrelado por uma mulher realmente bem sucedido nas
bilheterias. Imponente, carismática e genuinamente feminina, Gal Gadot fez jus
ao arquétipo altruísta da sua personagem, criando uma heroína poderosa e
representativa. Assim como Gadot, aliás, quem se destacou num filme
"detonado" pela crítica foi a bela Margot Robbie. Um dos poucos
pontos positivos do bagunçado Esquadrão Suicida, a atriz australiana encheu a
tela de energia ao dar vida a transloucada Arlequina, uma figura insana e
passional capaz de tudo para reencontrar o seu "pudinzinho", o
afetado Coringa. Indo de encontro ao seu dedicado parceiro de elenco, o
metódico Jared Leto, Robbie acertou no tom da sua Drª Harley Quinn, dando
popularidade a uma figura que nasceu dos desenhos, mais precisamente do
cartunesco Batman: A Série Animada.
Por falar em fiasco que "deu frutos", o terrível X-Men:
Origens - Wolverine se tornou peça importantíssima no desenvolvimento de um dos
mais ousados filmes de super-herói da história. Um dos projetos mais
questionados quando o assunto é a adaptação das histórias em quadrinhos, o
longa dirigido por Gavin Hood simplesmente distorceu a maioria dos seus
personagens, entre eles o verborrágico Deadpool. Apesar do esforço de Ryan
Reynolds, o roteiro decidiu seguir um caminho totalmente absurdo, tornando a
ira dos fãs mais raivosos justificada. O ator canadense, porém, não aceitou o
triste fim do anti-herói nos cinemas. Ciente das lambanças em torno do
personagem, Reynolds resolveu assumir as rédeas da produção. Após fracassar em
O Lanterna Verde, o ator enxergou no longa a sua última chance de brilhar
dentro do gênero. Para isso, no entanto, ele decidiu arriscar. Exigiu liberdade
criativa, classificação etária elevada e a manutenção de alguns dos mais
clássicos elementos das HQ's, entre eles a quebra da quarta parede e o humor
debochado do mercenário falastrão. O resultado, finalmente, correspondeu as
expectativas. Após uma inventiva campanha de marketing, Deadpool (2014) se tornou um
sucesso de público e crítica. Completamente à vontade no papel, Ryan Reynolds
interiorizou a irreverência do personagem com enorme categoria, mostrando
sagacidade ao não só rir de si mesmo, como também do gênero super-heroico. Em
suma, Deadpool em sua mais pura essência.
Menções (Muito) Honrosas: Danny DeVitto (Pinguim), J.K Simmons (J. Jonah Jameson), Chloe Moretz (Hit-Girl), Jackie Earle Haley (Rorschach) e Chris Pratt (Senhor das Estrelas)
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