quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

Bem Casados

Camila Morgado e Alexandre Borges elevam o nível desta oscilante comédia romântica

Desperdiçando uma série de boas ideias, Bem Casados se revela uma oscilante comédia romântica que basicamente se garante no talento dos seus protagonistas. Conduzido com esmero técnico pelo diretor Aluízio Abranches (As Três Marias), reconhecido por trabalhos menores e mais dramáticos, o longa segue um caminho previsível ao acompanhar as desventuras de um instável casal de meia idade unido por uma festa de casamento, perdendo a oportunidade de rir não só dos bastidores da indústria do matrimônio, mas também das mudanças no perfil dos relacionamentos atuais. Na verdade, apesar do potencial satírico por trás dos dois personagens principais, ele um mulherengo cinegrafista de casamentos no auge de uma crise de autoestima, ela uma ex-amante indomável disposta a tudo para impedir que o seu amado case, o problemático argumento prefere dialogar com a superficialidade dos romances "água com açúcar". O resultado é um blockbuster que vive de lampejos, a maioria deles relacionados ao carisma dos experientes Alexandre Borges e Camila Morgado. 


Bem Casados narra a história de Heitor (Borges), um solteirão convicto que após uma juventude de mulheres e festas chega a meia idade sem ter o que celebrar. Dono de uma empresa especializada em registrar cerimônias de casamento, o cinegrafista vivia uma crise de identidade, potencializada pela sua baixa autoestima e pela dificuldade em encontrar um relacionamento sério. Tudo muda, no entanto, quando ele e a sua assistente Alice (Bianca Comparato) são contratados para filmar o casamento da filha (Luíza Mariani) de um poderoso senador. Disposto a fazer tudo dar certo, já que a sua situação financeira também não era das melhores, Heitor é surpreendido pela presença da bela Penélope (Morgado), a instável ex-namorada do noivo. Expulsa da festa de despedida de solteira pela ex-sogra (Rosy Campos), ela decide se "infiltrar" a qualquer custo no casamento, encontrando em Heitor a brecha necessária para conseguir rever o seu amado. Reticente quanto a ajuda-la, ele acaba se rendendo ao charme e ao espírito selvagem de Penélope, sem saber que ela iria se revelar uma pessoa bem mais complicada do que parecia ser. 


Ainda que a premissa chame a atenção, o jovem roteirista Fernando São Thiago não mostra perspicácia ao explorar as possibilidades em torno desta relação. Recheado de boas intenções, o argumento por diversas vezes sugere algumas situações que acabam não se concretizando, frustrando àqueles que - assim como eu - enxergaram um algo a mais nas prévias promocionais. Num primeiro momento, por exemplo, Heitor, durante uma confissão na Igreja, condena o "descompromisso" da mulher moderna nos relacionamentos, sendo alertado pelo espirituoso Padre Luiz (Augusto Madeira) que as suas lamentações eram completamente ultrapassadas. Uma abordagem interessante e digna de aprofundamento, mas que ganha um desdobramento preguiçoso numa subtrama envolvendo um velho amor (Christine Fernandes) da vida do solteirão. O mesmo problema, aliás, se repete no mise-en-scene em torno da tão aguardada festa de casamento. Apesar da magnética presença de Camila Morgado, a "invasão" de Penélope não consegue cumprir as expectativas cômicas, rendendo algumas soluções forçadas, risadas esporádicas (muitas delas antecipadas pelos trailers) e poucos momentos realmente satisfatórios. A própria relação de confidência entre o mulherengo cinegrafista e o Padre é explorada com inesperada brevidade dentro da película, o que - com o perdão do trocadilho - se mostra um grande pecado, já que o personagem rouba a cena com a sua natural veia cômica. 


Pra piorar, em meio aos oscilantes diálogos e as excessivas propagandas, por diversas vezes as atitudes dos protagonistas não parece fazer qualquer tipo de sentido. Ainda que a crise emocional do casal possa explicar parte das suas mudanças de comportamento ao longo da trama, o 'affair' entre os dois nasce e cresce de maneira acelerada, rendendo brigas e reaproximações artificiais. Equívocos que se repetem na relação entre os fotógrafos Fernando (Fernando São Thiago) e Alice (Bianca Comparato), um par por si só descartável que ganha um desenrolar previsível e incoerente com a postura feminista da assistenteAo menos os carismáticos Alexandre Borges e Camila Morgado contornam os inúmeros problemas do roteiro, tornando a instabilidade dos seus respectivos personagens simpática aos olhos do público. Dando vida a um homem à moda antiga, Borges explora com energia as contradições do ex-conquistador Heitor, arrancando honestas risadas ao reproduzir a sua conturbada interação com as jovens mulheres. É nesta crítica ao macho alfa, aliás, que o argumento entrega os seus melhores momentos, explorando com um pouco mais de inspiração a crise de meia idade do protagonista. Um degrau acima do seu companheiro, Camila Morgado nos brinda com uma performance radiante como a indomável Penélope. Com os seus cachos esvoaçantes e o seu humor afiado, a atriz mais parece uma leoa em cena, atraindo os holofotes ao dar vida a uma mulher de aura quase selvagem que assume as rédeas desta divertida relação. Exibindo uma excelente química com Borges, Morgado torna crível as repentinas mudanças de rumo da sua personagem, principalmente na inesperada amizade com o tipo naturalmente tolo interpretado com categoria por Luíza Mariani. 


Subaproveitando nomes como os das atrizes Letícia Lima, Rosy Campos e Christine Fernandez, que brotam em cena em subtramas mal desenvolvidas, Bem Casados perde ritmo à medida que se rende aos clichês das mais populares comédias românticas. Tendo em mãos um roteiro carente de soluções mais corajosas, o diretor Aluízio Abranches até entrega um trabalho esteticamente bem resolvido, principalmente ao conduzir as ágeis sequências festivas e a intimista relação entre Heitor e Penélope, mas o seu maior mérito fica pela liberdade concedida a dupla de protagonistas. Afinal de contas, completamente à vontade em cena, Alexandre Borges e Camila Morgado se tornam os grandes responsáveis por impedir que o clima de "fim de festa" tome conta da película. 


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