Antes de mais nada, quero deixar claro que fico realmente incomodado com esta opção caça-níquel dos estúdios hollywoodianos em estender ao máximo suas franquias. Apostando em finais semi-abertos, na divisão de longas e na necessidade de deixar ganchos para futuras sequências, os produtores estão cada vez mais se escorando nesta recorrente "estratégia" para encher os cofres ao redor do mundo. Dito isso, fica nítido ao final de A Batalha dos Cinco Exércitos que boa parte dos pequenos problemas desta sequência não se resumem a opção do diretor neozelandês Peter Jackson em adaptar O Hobbit em três longas. Apesar do enxuto livro de J.R.R Tolkien se mostrar insuficiente para uma trilogia, o maior pecado desta franquia fica pela forma como os roteiristas dividiram a jornada de Bilbo Bolseiro, evidenciando que nesta nova trilogia a rentabilidade levou a melhor sobre as preocupações narrativas. Ainda assim, mesmo com alguns altos e baixos, Jackson fecha esta nova franquia de forma extremamente digna, mostrando a sua reconhecida habilidade ao nos conduzir por uma divertida e empolgante última viagem pela Terra Média.
Na verdade, os principais problemas de A Batalha dos Cinco Exércitos se iniciam com o frustrante desfecho de A Desolação de Smaug, sem dúvidas, o longa que mais conseguiu se aproximar da imponência de O Senhor dos Anéis. Optando por deixar o máximo de questões em aberto para a última parte, o que talvez seja um indício da falta de enredo para o encerramento desta trilogia, os roteiristas Fran Walsh, Philippa Boyens, Peter Jackson e Guillermo del Toro reduziram o impacto do desfecho em torno do temido dragão (Benedict Cumberbatch) ao deixa-lo para este capítulo final. Pra ser bem sincero, após a impecável batalha entre os anões e Smaug, o grandioso ataque à cidade dos homens merecia ter sido concluindo no segundo longa. Aqui, apesar da sequência ter representado um início em grande estilo, a impressão é que o espetacular dragão se torna um mero coadjuvante em meio a um embate ainda maior.
Utilizando este ataque para preparar o terreno para a tão aguardada batalha por Erebor, o argumento não perde muito tempo ao mostrar a retomada da montanha por Thorin (Richard Armitage) e a sua trupe de anões. Cada vez mais obcecado pelo tesouro, o rei resolve se virar contra os humanos e o elfos, temendo que eles pudessem roubar o seu ouro. Apesar das tentativas de negócio apresentadas por Bilbo (Martin Freeman), Thorin se mostra irredutível às ofertas de Bard (Luke Evans) e Thranduil (Lee Pace) por um pacto de paz e divisão das riquezas. Consumido pelo poder, Thorin resolve então declarar guerra a estes dois povos, sem saber que a verdadeira ameaça estava mais próxima do que ele poderia esperar. Enquanto Gandalf (Ian McKellen) e Galadriel (Cate Blanchett) tentam colocar um ponto final em um mal ainda maior, Bard, Thranduil e Thorin terão que colocar as suas diferenças de lado para enfrentar o destruidor exército de Orcs liderados por Azog, o Profano (Manu Bennett).
Tentando dar o mesmo peso narrativo de O Senhor dos Anéis ao inocente O Hobbit, Peter Jackson se esforça para trazer um senso de urgência a este terceiro longa. O problema é que na ânsia de dar mais densidade ao roteiro, o realizador neozelandês opta por adicionar novas situações à trama, errando feio ao insistir no pedante e irritante Alfrid (Ryan Gage). Em meio as sempre impecáveis batalhas, a tentativa de tornar o assistente do prefeito uma espécie de alívio cômico se torna o principal equívoco desta película, evidenciando os problemas envolvendo o tom do capítulo final. Por outro lado, Jackson mostra extrema perícia ao abrir espaço para várias figuras importantes dentro da trama, se apoiando na estupenda edição para dar um interessante senso de simultaneidade ao longa. Procurando fazer uma série de ganchos com a trilogia O Senhor dos Anéis, o que é uma das inteligentes sacadas desta nova franquia, o argumento permite que os principais personagens tenham o seu momento de brilho. Com destaque para a impecável presença de Cate Blanchett, responsável por uma das sequências mais surpreendentes, e para o comovente desfecho envolvendo a bad-ass Tauriel (Evangeline Lilly) e o complexo Thranduil.
Por falar no elenco, as atuações seguem sendo um dos diferenciais desta franquia. Liderado por mais um carismático desempenho de Martin Freeman, muito bem tanto nos momentos mais densos, como também nos funcionais alívios cômicos, o longa conta com a impecável presença de Richard Armitage. Colocando de vez o seu nome em Hollywood, o ator britânico explora como poucos as nuances de seu personagem, indo do insano ao afável com grande sensibilidade. Corrigindo, até mesmo, a falta de naturalidade do roteiro ao desenvolver essa transição do personagem. Assim como Armitage, quem também se destaca é o competente Lee Pace. Apesar da aura superior de seu personagem, extremamente convincente nas mãos do ator, Pace dá a Thranduil uma surpreendente humanidade, culminando com um dos momentos mais singelos dentro do extenso clímax. Uma sequência que, diga-se de passagem, até justifica o descartável relacionamento entre Tauriel e Kili (Aidan Turner), que funciona graças ao maior espaço dado a competente Evangeline Lilly. Por fim, o verdadeiro ladrão de cenas - mais uma vez - acaba sendo Luke Evans. Novamente impecável como o destemido e zeloso pai de família Bard, Evans se torna uma presença mais frequente neste último capítulo, tendo as suas motivações mais aprofundadas pelo roteiro.
Como se não bastasse as inspiradas atuações, a jornada pela Terra Média chega ao fim encontrando novamente o seu grande destaque na perícia técnica de Peter Jackson. Dando contornos épicos a esta batalha, o realizador constrói sequências de ação realmente bem coreografadas, filmando com nitidez o fluído embate entre anões, elfos, orcs e humanos. Tentando se distanciar das imponentes guerras de O Senhor dos Anéis, o neozelandês opta por se concentrar em confrontos mais específicos, os desenvolvendo de forma original e bem detalhada, mas sem o mesmo impacto dos antecessores. Sem querer cair no erro de comparar as duas trilogias, o que considero injusto pela complexidade em torno de O Senhor dos Anéis, A Batalha dos Cinco Exércitos é um desfecho digno para uma competente trilogia. Lógico que o resultado final poderia ser ainda melhor, mas Jackson e os produtores parecem ter padecido da mesma "febre do ouro" que assolou Thorin, pecando pelo excesso ao adaptar este prelúdio evolvendo as inocentes aventuras de Bilbo Bolseiro. Nada que uma simples batida na porta, e um reencontro inesperado já não seja o suficiente para nos instigar a revisitar o espetacular mundo da Terra Média.
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