Uma das experiências cinematográficas mais impressionantes que eu já tive
Confesso que deixei o melhor por último. Escrever sobre um filme do tamanho de Gravidade, o novo longa do diretor Alfonso Cuarón, é algo extremamente complicado. Desde o dia 11 de agosto de 2010, quando publiquei aqui no Cinemaniac a primeira notícia sobre o longa, admito ter ficado impressionado com a premissa e a ousadia dos produtores em torno deste projeto. E a expectativa não poderia ser melhor saciada. Aliando a complexidade dos efeitos visuais à simplicidade de uma ótima trama, Gravidade chega para ser o filme do ano. Uma obra fantástica, irretocável, que explora com primor o que de melhor o cinema tem a oferecer.
E quando afirmo isso não me refiro somente aos impressionantes efeitos visuais, mas também aos elementos mais básicos do cinema. Isso porque Cuarón não se prende apenas ao aspecto estético, nos apresentando um trabalho completo, com ótima trama, grandes atuações e extraordinária qualidade técnica. Com roteiro assinado pelo próprio diretor, ao lado de seu filho Jonás Cuarón, o longa narra a história de Ryan Stone (Sandra Bullock), uma doutora - sem experiencia como astronauta - que integra uma missão espacial para corrigir um problema no telescópio Hubble. Ao seu lado está Matt Kowalski (George Clooney), um astronauta veterano que em seu último trabalho oferece suporte a Drª Ryan. O que parecia uma missão corriqueira, no entanto, ganha ares de tragédia quando uma chuva de destroços acaba os atingindo. Sem qualquer suporte, os dois terão que lutar pelas suas próprias vidas contra todas as hostilidades em pleno espaço.
Explorando essa excelente trama, Cuarón nos brinda com um filme tecnicamente perfeito. É incrível como visualmente o longa se mostra impactante, realçando o clima hostil ao manter a atmosfera de tensão do primeiro ao último minuto de projeção. Utilizando o 3-D com maestria, o diretor espanhol aproveita o pano de fundo gravitacional para explorar o senso de profundidade conseguido com este dispositivo em sua máxima potência. Com isso, a interação entre público e ação alcança um patamar poucas vezes experimentado, um nível de imersão que só realça os incríveis fatos que estão na tela. A cena da lágrima vagando pelo espaço, por exemplo é de uma sensibilidade ímpar, impossível de se traduzir em palavras. Como se não bastasse isso, os originais movimentos de câmera exploram de forma única as noções do espaço, colocando o espectador com a mesma perspectiva do personagem. Opção que só aumenta a tensão ao longo da projeção. Seguindo o bailar de Matt e da Drª Ryan, a câmera flutua, dança na atmosfera, brincando com as luzes, com as cores, com a escuridão e com a assustadora vastidão do cenário espacial. Os takes em primeira pessoa são sufocantes. Visualmente brilhante, o grande diferencial do filme, porém, fica pelo seu impactante desenho sonoro. Seguindo a lógica que no espaço o som não se propaga, o silêncio se torna uma arma poderosa nas mãos de Cuarón. Sem querer revelar muito, a ausência de som em algumas cenas só amplia a sensação de claustrofobia que permeia Gravidade. Por mais paradoxal que seja, vale destacar também a excelente trilha sonora assinada por Steven Price, que cresce ao longo da projeção, sendo fundamental para o magnífico resultado final.
Como se não bastasse o impacto visual, Gravidade não é uma obra vazia de conteúdo. Pelo contrário, já que a trama é tão contundente quanto o seu próprio apuro técnico. Conhecido por seu trabalho em títulos interessantes, como os extraordinários Os Filhos da Esperança e Biutiful, Cuarón nos brinda com um roteiro que vai bem além do que a sua própria premissa prometia. Sem se prender apenas a questão da sobrevivência, o diretor espanhol nos conduz por uma história de renovação, de renascimento, principalmente quando aborda o passado trágico da Dr. Ryan. Essa metáfora, aliás, é sutilmente explorada por Cuarón em vários momentos, incluindo na magnífica e autoafirmativa cena final. Alimentando uma natural densidade narrativa, o roteiro abre espaço também para alguns diálogos bem humorados, que servem como um necessário alívio cômico em meio a sufocante trama.
E pra preencher esse belo trabalho visual, a escalação da dupla George Clooney e Sandra Bullock se mostrou mais uma escolha certeira de Cuarón. Os dois experientes atores são os únicos em cena, mas nós nem percebemos isso. Muito bem como o experiente astronauta, Clooney é carisma puro na pele de uma espécie de "cowboy" do espaço. Já Bullock é responsável pela parte mais dramática do longa, impressionando tanto nos comoventes momentos mais densos, como também nas dinâmicas sequências de ação. O que chama a atenção, porém, é o árduo processo de filmagem pelo qual os dois tiveram que passar. Em boa parte das cenas com Bullock o CGI é usado, então para simular a sensação da gravidade, a atriz teve que realizar as suas cenas em um compartimento fechado - presa da cintura para baixo - ouvindo apenas a voz de Clooney. E todo esse esforço é recompensado em sequências de tirar o fôlego.
Um passo adiante para o cinema, Gravidade é uma obra completa, um grande trabalho cinematográfico que reúne tudo aquilo que o espectador busca em um filme. É uma mistura simples e ao mesmo tempo complexa, que sufoca o espectador ao longo dos seus 90 minutos. Uma experiência única, que de tão verossímil poderia até ser adotada pela NASA como um novo simulador para os seus astronautas. Me arrisco a dizer que será, daqui pra frente, mais um daqueles eventos sempre lembrados na história do cinema.
Nenhum comentário:
Postar um comentário