Uma das grandes surpresas desse ano, o longa Fruitvale Station ganhou repercussão em todo o mundo após a ótima recepção no Festival de Sundance. Na estreia do diretor Ryan Coogler, o filme acabou faturando o Grande Prêmio do Júri e também o Prêmio do Público em Sundance, chamando a atenção ao narrar um dos mais chocantes casos de violência policial da história recente dos Estados Unidos. Na verdade, o último dia do ano de 2008 na vida de Oscar Grant. Um rapaz de 22 anos que acabou sendo vítima de uma catastrófica ação policial, se tornando hoje uma espécie de símbolo local na luta contra esse excesso de violência. Uma responsabilidade gigantesca nas mãos do jovem diretor, que não poupa o espectador do choque, e logo de cara, já mostra o peso da realidade dos fatos. Um longa intenso que tenta mostrar toda essa triste trama, sob uma nova perspectiva, narrando justamente esse último dia do ano do jovem Oscar.
E como disse no inicio, o jovem diretor Ryan Coogler já começa o filme com um momento de grande impacto. Sem privar o espectador da realidade, a opção de trazer à tona a cena real filmada através de uma câmera de um celular é certeira, e já prepara o espectador para o que está por vir. A cena termina com um tiro, o impacto do barulho, e ai voltamos ao início do dia 31 de dezembro de 2008. Somos apresentados a Oscar Grant III (Michael B. Jordan), um jovem com passado ligado ao tráfico de drogas que busca um caminho para sua vida. Pai da pequena Tatiana (Ariana Neal) e namorado de Sophina (Melonie Diaz), Oscar está desempregado, mas parece não querer mais sobreviver da venda de drogas, que no momento surge como a sua única opção rentável. Seu passado na prisão e o carinho por sua família, no entanto, fazem com que ele reflita sobre o seu futuro no último dia do ano. Em meio a tudo isso, ele se prepara para festejar a passagem de ano e, principalmente, o aniversário de sua mãe (Octavia Spencer), sem saber que uma grande tragédia irá atingir a sua vida.
Essa é a opção do diretor\roteirista Ryan Coogler, dramatizar a vida de Oscar antes do fatídico tiro. Uma alternativa extremamente perigosa, diga-se de passagem, já que além de contar os bastidores envolvendo a tragédia, o longa adiciona altas doses de ficção ao roteiro. Na verdade, Coogler acerta ao tentar fugir dos melodramas e ao retratar Oscar como uma figura extremamente humana, um jovem comum, cheio de erros e sonhos. Sem questionar as motivações dele, o diretor leva à tela um Oscar afetuoso, carinhoso com a família, respeitado pelos amigos, mas não omite os momentos de raiva e tensão envolvendo a sua personalidade. No entanto, essa dramatização do último dia do jovem acaba sendo o grande equivoco de Coogler, que tenta - a todo custo - promover a simpatia do público por Oscar. Para isso, são adicionados fatos fictícios que não convencem, como a cena em que Oscar brinca com um cachorro e acaba se comovendo ao vê-lo atropelado. A cena soa desnecessária, até porque antes disso o diretor conduz muito bem o relacionamento dele com sua família, criando uma natural empatia com o público. Aliás, em meio a tragédia retratada no longa, julgo completamente desnecessária qualquer tipo tentativa de criar essa simpatia ao personagem. Acredito que apenas o fato, por si só, já seria suficiente para tocar o espectador, independente da conduta do personagem.
E esse fato só não atrapalha o filme graças ao talento de Michael B. Jordan, que tem uma atuação espetacular como Oscar Grant. O ator, que já desponta como uma das revelações do cinema mundial, tem um desempenho tocante e assume a responsabilidade de dar vida a um personagem de certa importância para sociedade norte-americana. Apesar de ser inspirado em fatos reais, Jordan constrói um bom Oscar, tornando crível, mesmo com alguns excessos do roteiro, todas as atitudes do jovem. Além disso, o ator também acerta nos momentos de maior tensão, principalmente na incrível recriação da cena da estação de trem. Como se não bastasse Michael B. Jordan, o longa traz ainda as ótimas atuações de Melonie Diaz, sempre expressiva, e de Octavia Spencer, numa intensa interpretação como a mãe de Oscar. Vale destacar ainda a rápida participação de Kevin Durand, num forte desempenho como um dos policiais responsáveis pelo fatídico episódio. Todos eles muito bem conduzidos por Coogler, que apesar de ter apenas 26 anos, mostra uma grande maturidade no comando de seu impactante clímax. Ao ver a cena, a sensação de impotência é gigantesca e choca pela realidade apresentada.
Apesar dos excessos na parte ficcional do longa, um absurdo silêncio pairou no cinema após a sessão de apresentação do filme no Festival do Rio. Um silêncio fúnebre, de respeito, que "fala" mais do que qualquer crítica. É a prova maior de que o novato diretor Ryan Coogler acertou não só ao conduzir um entretenimento de alta qualidade, mas também, ao promover uma forte mensagem contra os excessos das forças policiais. Uma abordagem necessária sobre um tema que vem atingindo vários países. Vide os acontecimentos aqui no Brasil, durante a onda de protestos em 2013.
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