segunda-feira, 26 de julho de 2021

Crítica | Os Pequenos Vestígios

Vestígios de grandeza, indícios de fiasco

Um suspense à moda Supercine (essa referência só os fãs de cinema na faixa dos trinta vão pegar), Os Pequenos Vestígios é um thriller policial elegante que sucumbe a própria mediocridade narrativa. O problema não está na falta de originalidade. Cobrar algo novo de um gênero tão saturado seria uma injustiça. A natureza genérica do plot, no entanto, esconde as virtudes de uma produção que não confia no seu próprio potencial. É frustrante ver como o diretor John Lee Hancock (do competente Fome de Poder) renega a vocação realista da obra em prol da afetação. O envolvente primeiro ato sugeria isso. O roteiro não precisa explicitar para estabelecer a posição dos seus protagonistas. 

Uma série de assassinatos de jovens mulheres une dois policiais diferentes: o narcisista detetive Jim (Rami Malek) e o cascudo assistente do xerife Deke (Denzel Washington). Um precisava de ajuda para solucionar o caso. O outro precisava de uma chance para tirar das costas um fardo do passado. O realizador precisa de poucos minutos para estabelecer as motivações dos agentes. As vítimas de um crime não resolvido surgem como assombração para Deke. O sorriso de uma jovem dançante é o bastante para fazê-lo entrar de cabeça no caso. Os segredos, num primeiro momento, são irrelevantes. Hancock troca o mistério envolvendo a identidade do serial killer pelo estudo destes dois personagens. A frustração deles representa a realidade. É dela que nasce a angústia, a pressão e por tabela as falhas. 

Tem muito de Memórias de um Assassinato (2003) na maneira com o que o diretor estabelece a chata rotina dos protagonistas. Ao contrário do longa de Bong Joon-Ho, porém, John Lee Hancock se sente obrigado a estimular a narrativa através de convenções batidas. O que vemos, a partir daí, é mais do mesmo feito da forma mais genérica possível. O elegante filtro noturno proposto inicialmente é repentinamente tomado por uma direção incapaz de pensar a tensão. O naturalismo é quebrado pela afetação do possível suspeito. Jared Leto nunca esteve tão deslocado dentro de um filme. O seu personagem não parece pertencer aquele mundo. Seduzido pela presença histriônica dele, o diretor simplifica a análise sobre o efeito gerado pela onda de assassinatos na identidade do policial. 

O cansativo jogo de gato e rato proposto não chega perto de gerar a tensão que a busca por respostas causava. É fácil entender a raiz da obsessão de Deke. Denzel Washington traz consigo uma dose de cinismo de alguém que já falhou e se reergueu. A derrocada de Jim, por sua vez, é tão oca quanto a performance de Rami Malek. O que enfraquece o pertinente comentário sobre a tortura gerada por uma busca sem respostas. O foco, no fim, está na construção das pequenas reviravoltas e não na busca pelos tais pequenos vestígios que poderiam transformar um filme medíocre numa grande obra. 

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