sábado, 7 de março de 2015

Cinemaniac Indica (A Gaiola Dourada)

Uma ode aos portugueses e as tradições lusitanas, A Gaiola Dourada é um daqueles raros trabalhos que conseguem capturar a essência cultural de um povo. Através de uma premissa simples, recheada de hilárias idas e vindas tipicamente latinas, o inspirado longa dirigido por Ruben Alves é refinado ao questionar a situação dos imigrantes portugueses em terras francesas. Demonstrando habilidade para fugir dos clichês e do tom caricatural, Alves constrói um saboroso "feel good movie" que é preciso ao arrancar sinceras risadas a partir de temas populares e de dilemas dignos de uma "casa portuguesa". 

Inspirado na história dos próprios pais, o que talvez explique a sensibilidade dos personagens, Ruben Alves constrói com sutileza uma trama que se preocupa não só em exaltar a cultura lusitana, como também em criticar a desvalorização dos imigrantes em solo europeu. Neste cenário, somos apresentados ao casal Maria (Rita Blanco) e José (Joaquim de Almeida), dois portugueses tradicionalistas que construíram a sua vida em solo francês. Ela, uma esforçada zeladora, fazia de tudo para que os moradores do seu condomínio fossem plenamente atendidos. Ele, um respeitado mestre de obras, se dedicava ao máximo para conseguir a confiança do seu chefe e dono da construtora (Roland Giraud).


Se entregando de corpo e alma ao trabalho, eles dedicavam ainda o pouco tempo que sobrava para o cuidado dos filhos Paula (Barbara Cabrita) e Pedro (Alex Alves Pereira), dois jovens plenamente integrados ao modo de vida francês. A atarefada rotina de José e Maria vira de cabeça pra baixo, no entanto, quando eles descobrem que um parente deixou uma herança em solo português, e que para recebe-la os dois teriam que voltar a sua terra natal de uma vez por todas. Dispostos a viverem o tão esperado sonho da riqueza, o casal terá que resistir à inesperada pressão dos amigos, chefes e vizinhos, que parecem não querer abrir mão dos zelosos serviços deste casal.


Recheado de carismáticos personagens, o argumento assinado pelo próprio diretor, ao lado de Jean-André Yerles e Hugo Gélin, é habilidoso ao mostrar a dinâmica rotina desta família lusitana em solo francês. Apesar da premissa ser realmente simples, Alves é extremamente original ao narrar as idas e vindas da família Ribeiro. Em meio a exaltação de alguns dos principais símbolos da cultura portuguesa, como as reuniões familiares, a musicalidade, a paixão pelo futebol e o humor, o realizador promove uma série de interessantes discussões envolvendo temas como a integração social, a desvalorização do trabalho braçal e a posição do imigrante dentro da sociedade francesa.


Mostrando um ótimo tempo para a comédia, com destaque para a personagem vivida pela hilária Maria Vieira, que aqui no Brasil participou da novela Negócio da China, Alves demonstra leveza ao levantar estas necessárias questões. Mesmo sem uma abordagem mais profunda, o que aqui não parece necessário, o longa é feliz ao mostrar como os filhos, completamente integrados ao padrão de vida francês, parecem renegar o modo de vida dos pais, como os chefes, do alto do seu status, parecem querer se mostrar mais humildes para convencerem o casal de sua importância, e como José e Maria, apesar de não negarem as suas tradições portuguesas, parecem inebriados pela possibilidade de finalmente crescer na pirâmide social. Com destaque para a impagável sequência do jantar, onde os papéis se invertem com o casal de portugueses oferecendo um "menu" no melhor estilo francês.


Embalado por uma bem escolhida trilha sonora e pelas impecáveis atuações de Joaquim de Almeida, Rita Blanco e Chantal Lauby, Ruben Alves faz de A Gaiola Dourada uma declaração de amor ao seu país natal. Ainda que o filme se prenda à algumas soluções mais preguiçosas, como a forçada vingança de José e Maria, o realizador mostra sensibilidade ao equilibrar drama e comédia, construindo um adorável blockbuster.

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